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É preciso combater o gigantismo da máquina pública

Levar adiante a proposta de criação de mais um estado, o de Tapajós, significa darmos outro passo na direção errada.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

Atualizado às 13:52

(Imagem: Arte Migalhas)

Voltou à pauta, no Congresso Nacional, a proposta de criação do estado do Tapajós, a partir da divisão do estado do Pará, objeto de projeto de lei em discussão na Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) do Senado. A ideia não é nova - já foi rejeitada pela população paraense em plebiscito realizado em 2011 - e remete a uma discussão maior: a questão do gigantismo da máquina pública brasileira.

Segundo a proposta do senador Siqueira Campos (DEM-TO), o novo estado do Tapajós ocuparia 43% do atual território do Pará, cerca de 538 mil km², e teria 23 municípios, onde vivem hoje cerca de 1,05 milhão de habitantes. O Produto Interno Bruto da região é de R$ 18 bilhões, segundo dados de 2018.

Os defensores do projeto defendem que a população da região do novo estado não é beneficiada pela pujança econômica do Pará e precisa ser melhor atendida. É uma pretensão legítima, mas pouco se fala do custo dessa medida. O estado do Tapajós teria 3 senadores, 8 deputados federais e 24 deputados estaduais. Isso significa a criação de uma Assembleia Legislativa, com todas as despesas inerentes ao órgão. No Executivo, haveria um governador, um vice-governador, cerca de 20 Secretarias de Estado - com seus titulares, adjuntos, chefes de Gabinete e assessores. Demandaria, ainda, a criação de Departamentos, Polícia Militar, Polícia Civil, estatais, autarquias e tantos outros órgãos estaduais, além de Tribunal de Contas do Estado, Ministério Público Estadual, Justiça Estadual e postos da Justiça Federal.

É imensa a estrutura necessária para a criação de um novo estado. Prédios, funcionalismo, veículos oficiais, mobiliário, maquinário, equipamentos, redes lógicas, insumos, combustível, consumo de água, energia elétrica, telefone e internet, eis uma nova máquina pública para consumir os recursos advindos dos impostos pagos pela população.  Matematicamente falando, em uma fração em que o numerador (as receitas tributárias) permanece igual e o denominador é aumentado (mais estados e maiores custos da máquina pública), temos como consequência inexorável menor quociente (serviços à população).

Resultado que não interessa ao brasileiro. Levar adiante a proposta de criação de mais um estado significa darmos outro passo na direção errada. Basta tomarmos como exemplo a farra da criação de municípios ocorrida após a promulgação da Constituição de 1988. Quando a Constituição Cidadã entrou em vigor, o Brasil tinha 4.128 municípios. No ano 2000, portanto apenas 12 anos depois, esse número passou para 5.507 municípios. E hoje temos 5.570. Assistimos, inertes, à germinação de máquinas públicas caras, quase sempre ineficientes, e sem capacidade de se auto-sustentar. É simples: 66,7% dos municípios brasileiros têm população inferior a 8.400 habitantes e, desses, a maioria é dependente de repasses do governo federal (FPM: IR e IPI) e dos governos estaduais (ICMS e IPVA). Apenas 71 cidades são responsáveis por 50% do PIB o que significa, em leitura inversa,que 5.499 cidades ficam com os 50% restantes.

A realidade é que o dinheiro do cidadão acaba sendo utilizado para custear essa anomalia. O Atlas dos Estados Brasileiros 2018, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que o Brasil gasta 13,4% do PIB nacional com os servidores públicos. Desse total, os estados respondem por 5,31% do PIB (outros 4,74% são dos municípios e 3,35%, da União). É um volume enorme de recursos. Tomando-se por base o PIB 2020, de R$ 7,4 trilhões, temos R$ 991,60 bilhões comprometidos somente com as despesas relativas ao funcionalismo público.

Outro dado alarmante: no período entre 2003 a 2015, o custo da máquina pública cresceu 125% em valores reais - já deflacionados pelo IPCA -, enquanto a variação do PIB foi de apenas 44,65%. Boa parte disso é resultado de aumentos salariais muito acima da inflação, sem nenhuma correlação sobre produtividade e crescimento do PIB, penduricalhos para burlar o teto salarial de R$ 39,2 mil/mês, pagamentos de diárias, indenizações, gratificações e auxílios diversos.

Em outra ponta, professores, médicos e outros profissionais da saúde e agentes da segurança pública continuam tendo remuneração não condizente com a relevância dos serviços que prestam.

A distorção é inaceitável. Em 2019, segundo os números oficiais, os gastos com a máquina pública, proporcionalmente ao PIB nacional, superaram os investimentos em educação (6%), saúde (3,9%) e saneamento (0,21%). Tais despesas somaram 10,1% do PIB, bem menos que os 13,4% consumidos com a máquina administrativa.

Trata-se de um modelo equivocado e nefasto à nação. Os tributos precisam ser destinados para as atividades-fim (Educação, Saúde, Segurança, Habitação e Infraestrutura) e não para atividades-meio (custeio das máquinas administrativas).

É necessário olharmos o País sob outra ótica. A recorrente justificativa dos governos de que sofremos com a escassez de recursos financeiros não pode mais ser aceita, porque é irreal. O problema do Brasil não é a falta de recursos, mas o gigantismo do Estado, que não cabe mais no PIB nacional. O Estado arrecada muito, porém gasta mal e esta é uma das razões para o cenário nacional de serviços públicos escassos, de má qualidade, acessíveis apenas a uma parte da população.

Reduzir o tamanho do Estado, combater a corrupção, acabar com os privilégios, reduzir as desigualdades sociais e regionais, promover as reformas política e tributária, estabelecer um plano de metas e refundar o princípio federativo são as verdadeiras necessidades do Brasil.

Qualquer iniciativa contrária a essas premissas não contribuirá para o País reencontrar o rumo do desenvolvimento e melhorar a vida dos cidadãos. Toda a população merece ser bem atendida pelo Estado, independentemente da região onde viva. Entretanto, aumentar despesas não é o melhor caminho para se atingir esse objetivo. Colocar mais uma estrela na bandeira nacional está muito longe das prioridades nacionais.

Samuel Hanan

VIP Samuel Hanan

Engenheiro, com especialização nas áreas de macroeconomia, administração de empresas e finanças, empresário e foi vice-governador do Amazonas (1999-2002).

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