Exclusão da responsabilidade penal frente às dificuldades financeiras
O empresário que comete um ato de sonegação fiscal pode não estar tentando enriquecer ilicitamente através da supressão indevida de débitos fiscais, mas, ao invés disto, está tentando sobreviver dentro de um cenário caótico.
segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022
Atualizado às 13:49
Diversas dificuldades financeiras foram acentuadas pela pandemia de SarsCov-2 (Covid-19) desde meados do ano de 2020, gerando inúmeras complicações para a manutenção de empreendimentos de todos os portes. Desde o pequeno até o grande empreendedor viram-se enfrentando contratempos financeiros para atravessar a crise global que, apesar de primariamente sanitária, ocasionou inquestionáveis efeitos deletérios nos sistemas financeiros de todos os países.
Todavia, sem excetuar as já admitidas consequências maléficas da pandemia, é necessário que se pontue que as empresas já passavam por obstáculos à sua estabilidade orçamentária, tendo em vista que estabelecem suas atividades empresariais em um país com alta carga tributária, fator que em nada contribuiu para a longevidade dos empreendimentos situados em terras tupiniquins.
Neste contexto, a incidência de pesadas alíquotas tributárias no Brasil aliada à fatores internos atinentes à um mercado instável, com uma moeda de curso legal relativamente fraca em comparação à conjuntura internacional e um sistema extremamente burocrático são, acertadamente, alguns dos elementos que podem motivar o empreendedor a buscar alternativas para que se mantenha no mercado.
Dentre as alternativas comumente buscadas pelo empreendedor brasileiro está, exatamente, a tentativa de esquivar-se do adimplemento de elevados montantes a título de tributos, sonegando-os, de forma a aplicar em sua atividade empresarial os valores que antes seriam entregues ao fisco.
Nesta linha, é importante que se faça menção aos posicionamentos existentes em nosso ordenamento jurídico brasileiro acerca da exclusão da responsabilidade penal do administrador de uma empresa frente as dificuldades financeiras pelas quais determinado empreendimento passa.
Deste modo, sabe-se que a conduta de empregar fraude para se eximir do pagamento de tributos é crime de sonegação fiscal, previsto no Art. 1º da lei 4.729/65, com penas de detenção de até 2 anos e multas pesadíssimas ao apenado, que podem chegar até cinco vezes o valor do tributo sonegado.
Entretanto, em nosso ordenamento jurídico há algumas considerações na doutrina e na jurisprudência acerca da possibilidade de se excluir a responsabilidade do administrador de uma empresa que sonega impostos motivado por uma grave situação financeira que coloca em risco, inclusive, a existência de seu negócio.
Por conseguinte, há entendimentos de determinadas Cortes Federais no sentido de absolver o acusado de sonegação fiscal caso preenchidas determinadas condições, a fim de se afastar a ilicitude da conduta, desde que haja a comprovação de que a gravidade financeira do acusado é concreta, havendo, inclusive, títulos protestados contra a empresa, empréstimos não adimplidos, dívidas trabalhistas e não distribuição de lucros entre os sócios (se houver).
Logo, entende-se que, apesar de haver alguns ecos não unânimes em torno da excludente de ilicitude em comento, é possível pontuar que sua aplicação se dá em casos de "vida ou morte" da pessoa jurídica, algo como uma clemência a favor da manutenção da atividade empresarial.
Portanto, é necessário que se comprove que o empreendimento não poderia, de qualquer forma, adimplir com os débitos tributários sem que atingisse à completa ruína.
Em conclusão, sabe-se que o empresário brasileiro enfrenta incontáveis entraves cotidianos, muitos deles não por sua culpa, mas que acabam surgindo em seu caminho em razão das próprias circunstâncias impostas pelo sistema jurídico, administrativo, burocrático e tributário em que é colocado.
Por este motivo, é de se considerar que o empresário que comete um ato de sonegação fiscal pode não estar tentando enriquecer ilicitamente através da supressão indevida de débitos fiscais, mas, ao invés disto, está tentando sobreviver dentro de um cenário caótico.
Leonardo Tajaribe Jr.
Advogado Criminalista. Especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM). Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM). E-mail: [email protected]