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Qual o papel do jurídico no processo de inovação da empresa?

Não há mais espaço para o advogado que trabalha no automático e não busca formas alternativas e efetivas para solucionar as dores do cliente.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

Atualizado às 14:31

(Imagem: Arte Migalhas)

Buscando aperfeiçoar minha formação e adquirir novas habilidades, fiz minha matrícula no curso de Design Thinking da ESPM e isso expandiu minha visão sobre o papel do departamento jurídico no processo de inovação.

Sempre fui uma pessoa inquieta, que buscava enxergar a situação como um todo para entender os motivos que levaram determinada demanda a chegar até mim.  

Afinal, melhor que uma solução momentânea é corrigir o problema na raiz para que não se repita.

O curso de Design Thinking se encaixou perfeitamente na minha forma de pensar e atuar enquanto advogado, me levando a perceber que a formação em direito contribuiu muito para esse aproveitamento.  

No curso de direito não há entendimento certo ou errado, desde que haja coerência com todas as fontes de direito, fazendo com que o advogado tenha que se preocupar não só em saber, mas entender cada ponto de vista.  

Ao longo da trajetória profissional, por vezes você defende "A" e depois defende "B" com a mesma excelência, pois o lado do seu cliente que importa.

Essa característica de ouvir, entender e defender diferentes pontos de vista, que é treinada ao longo de pelo menos 5 anos de faculdade, e permanece sendo exercitada dia após dia durante a trajetória profissional, é essencial para que processos de inovação sejam bem-sucedidos.

As organizações que não enxergam o departamento jurídico como engrenagem essencial e com potencial de maximizar o resultado dos seus processos de inovação não estão sabendo usá-lo.

Por sua vez, os integrantes do departamento jurídico também devem ter consciência de que estão em posição privilegiada dentro da empresa e que devem participar do processo de inovação, muitas vezes até propondo essa inovação.

Não há mais espaço para o advogado que trabalha no automático, não pensa no todo e, consequentemente, não propõe soluções para o problema na raiz. O pensamento inovador, criativo e disruptivo pode ajudar nisso.

Explico.

As empresas estão cada vez mais preocupadas com a inovação.

Especialistas em mercado e comportamento de consumidores apontam que estamos em um mundo BANI.

Mas o que é o mundo BANI?

BANI é a sigla pras palavras em inglês: Brittleness (Frágil), Anxiety (Ansioso), Nonlinearity (Não-linear) e Incomprehensibility (Incompreensível).

Em um mercado com essas características, com consumidores cada vez mais preocupados com a experiência que lhe é entregue e desenvolvimento tecnológico acelerado, a inovação é primordial e ela deve ser pautada no ser humano. 

Significa dizer que o profissional responsável por tocar um projeto de inovação deve enxergar a situação que pretende melhorar com os olhos de quem de fato está na outra ponta da corda.

Se é um projeto de inovação interno, os responsáveis devem se colocar no lugar do funcionário que será beneficiado para entender suas dores, assim como deverá se colocar no lugar no cliente se a ideia for inovar para melhorar a experiência desse usuário.

Dentro desse cenário o jurídico assume uma posição essencial, pois é o departamento que recebe diretamente boa parte das dores que se busca solucionar em seu sentido puro, o litígio.

Porém é necessário que os integrantes do departamento jurídico, se quiserem de fato atuar no processo de inovação, se afastem da visão do seu empregador.

Talvez aí seja a parte mais difícil, pois na maioria das vezes a inovação eficaz não vem da solução que vai resultar em uma economia imediata no bolso dos acionistas da empresa que lhe paga.

Por vezes vai ser preciso remar contra a maré e propor soluções que em um primeiro momento vão resultar em uma despesa maior, mas que vão gerar benefícios futuros.

É o caso, por exemplo, de verificar que a empresa está recebendo muitas demandas trabalhistas e propor uma medida que dê mais benefícios aos funcionários.

Isso vai ter um gasto inicial, mas a longo prazo provavelmente vai proporcionar a redução das demandas e funcionários mais felizes, que por sua vez vão dar uma experiência melhor aos clientes, o que vai resultar num aumento de receita.

Vale lembrar que o jurídico tem, ou deveria ter, movimentação livre entre os departamentos, então quem melhor para entender se as soluções internas propostas atendem a todos os departamentos ou saber os motivos de determinada ocorrência sob os olhos de cada envolvido? E, por que não, propor ajustes?

Além disso, o mercado exige que o advogado tenha e sempre busque outras competências, o que permite que soluções externas também partam do jurídico.

É o caso, por exemplo, de identificar que a empresa está sendo muito acionada por consumidores com uma reclamação específica e acionar os setores competentes, talvez até sugerindo uma ação específica.

Algumas empresas transformaram o jurídico em verdadeiros data center, exigindo a gestão e análise de inúmeros dados.

Então por que não aproveitar essa evolução para envolver o jurídico no processo de inovação e não só para dizer se está em conformidade com a lei?

Diante disso, tudo leva a crer que em um futuro próximo o jurídico será cada vez mais envolvido e exigido no processo de inovação das empresas.

É uma questão de percepção e aproveitamento do capital humano que está a sua disposição.

Douglas Stelet Ayres Domingues

Douglas Stelet Ayres Domingues

Advogado. Especialista em Direito Tributário e Contabilidade Tributária pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC/RJ). Especialista em Auditoria Tributária pela UFRJ.

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