Da limitação de idade para utilização de mesas de bilhar/sinuca no ambiente condominial
Afinal, crianças e adolescentes podem ou não praticar essa atividade no condomínio?
terça-feira, 18 de janeiro de 2022
Atualizado às 17:17
A convivência em condomínio tem se tornado cada vez mais complexa no mundo moderno, afinal, nem sempre a rotina de um ambiente compartilhado é fácil.
Para que haja harmonia, é necessário que cada morador respeite as regras de convivência, que por muitas as vezes são objeto de aversão por alguns e acabam causando problemas no ambiente condominial.
Isto porque, como popularmente sabido, os condomínios possuem internamente regras próprias de convivência, materializadas através do que se chama "Convenção do Condomínio" e "Regimento Interno", cabendo à primeira definir a estrutura geral do condomínio e os direitos básicos do condômino, enquanto o segundo tem como objetivo disciplinar a conduta interna de todos os que habitam, se utilizam ou trabalham para o condomínio.
Tais regras são de suma importância para o convívio harmonioso, eis que delimitam os direitos e deveres de cada um dos moradores.
Dessa forma, é necessário que toda regra de convivência esteja expressamente disposta em um dos regramentos citados, sendo importante mencionar que, qualquer alteração de convenção ou regimento, deve ser precedida de um procedimento formal (publicação de edital de convocação, discussão, votação, quórum específico, etc.).
Nesse aspecto, a figura do síndico ganha especial relevância, pois, conforme dispõe a lei, ele é o responsável por fazer cumprir as determinações em assembleia de condomínio, os regimentos internos e as convenções.
É o que dispõe o art. 1348, inciso IV, do CC/02:
"Art. 1.348 - Compete ao Síndico:
(...)
IV - cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da assembleia."
Porém, importante consignar que cabe ao síndico apenas a fiscalização, não podendo agir como legislador de normas de convivência. Assim, deve o síndico fazer cumprir o que determina a lei brasileira e as regras internas do seu condomínio.
Exposto esse cenário, um tema antigo que, até os dias atuais, é objeto de muita discussão no âmbito condominial se refere a limitação de idade para jogar bilhar/sinuca nas áreas comuns do condomínio.
Afinal, a lei brasileira define algum limite de idade para que crianças e/ou adolescentes possam jogar bilhar/sinuca desacompanhados dos pais ou responsáveis nos espaços comuns do condomínio?
Em caso de omissão da lei brasileira, poderia o condomínio, através de seu regramento interno, impor a limitação de idade?
Ao contrário do que muitos pensam, não há lei específica sobre o assunto que defina a proibição de crianças e/ou adolescentes praticarem bilhar ou sinuca desacompanhados.
Em verdade, existe uma interpretação incorreta da lei.
Os dispositivos mais próximos que regulamentam essa polêmica estão expressos no ECA, especificamente nos arts. 75, § único, e 80, vejamos:
"Art. 75. Toda criança ou adolescente terá acesso às diversões e espetáculos públicos classificados como adequados à sua faixa etária.
Parágrafo único. As crianças menores de dez anos somente poderão ingressar e permanecer nos locais de apresentação ou exibição quando acompanhadas dos pais ou responsável.
(...)
Art. 80. Os responsáveis por estabelecimentos que explorem comercialmente bilhar, sinuca ou congênere ou por casas de jogos, assim entendidas as que realizem apostas, ainda que eventualmente, cuidarão para que não seja permitida a entrada e a permanência de crianças e adolescentes no local, afixando aviso para orientação do público."
Conforme observa-se da leitura dos dispositivos acima transcritos, a lei não faz qualquer referência a proibição da prática de bilhar/sinuca por crianças e/ou adolescente. Na verdade, a lei proíbe que os menores de dez anos, desacompanhados dos pais, frequentem locais públicos de diversão onde existe a exploração comercial de jogos.
Além do mais, apesar do desconhecimento de muitas pessoas, sinuca e bilhar são considerados - há muito tempo - esporte, tendo estes, inclusive, federações e campeonatos.
Dessa forma, o "jogo", ou seja, o "esporte" não é prejudicial ao menor, e sim o ambiente onde as mesas estão instaladas. Bem por isso o ECA especificou que, nestes locais, onde as estatísticas demonstram drogas, álcool, violência, etc, não são estabelecimentos adequados para crianças e adolescentes.
Por decorrência lógica, não há qualquer prejudicial à criança e/ou adolescente de praticar bilhar ou sinuca dentro do ambiente condominial desacompanhados, eis que se trata de ambiente familiar e não apresenta qualquer risco a integridade física destes.
Dessa forma, é necessária muita atenção do síndico quando estabelece, por sua própria iniciativa, a proibição de acesso/utilização de menores a mesas de bilhar ou sinuca dentro do condomínio "desacompanhados", sem que tal norma esteja prevista em convenção ou regimento ou ofereça risco real. Isto porque a lei brasileira não proíbe essa questão.
Assim, para que haja a limitação de idade de acesso/utilização é necessário que seja observado o procedimento formal do condomínio, ou seja, regular tal regra através do regimento interno ou por decisão assemblear. E para isso, é essencial que haja a alteração do regimento, possibilitando a participação, deliberação e direito de voto dos condôminos sobre o assunto.
Assim, frisamos que é possível que se estabeleça a limitação da idade no ambiente condominial, porém, desde que a massa condominial, como um todo, assim decida, acrescentando ao seu regimento a normatização (regra) através do procedimento adequado (art. 1.351 do CC/02) ou decidindo em assembleia específica sobre o assunto, observadas as regras da convenção condominial.