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Lei específica e a aplicação do duplo teto às contribuições previdenciárias dos aposentados e pensionistas dos RPPSs

A tese firmada pelo STF é de relevância ímpar na interpretação correta da aplicação do duplo teto constitucional aos RPPSs, considerando que alguns Entes Federativos ainda não referendaram os dispositivos da EC 103/19.

terça-feira, 4 de janeiro de 2022

Atualizado às 10:51

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

O Supremo Tribunal Federal, em março de 2021, julgou definitivamente o Recurso Extraordinário 630137/RS, traçando os contornos interpretativos do chamado "duplo teto" ou "imunidade ampliada", sobretudo quanto ao formato legal adequado.

O referido instituto está vinculado ao disposto no artigo 40, § 21, da CF/1988, que prevê imunidade tributária parcial aos servidores aposentados ou pensionistas que sejam portadores de doença incapacitante prevista em lei. A benesse constitucional contempla apenas a parcela da pensão ou dos proventos de aposentadoria que superar o dobro do limite máximo estabelecido para os benefícios do RGPS.

Observe a inteligência do dispositivo:

Art. 40 (omissis)

[...]

§ 21. A contribuição prevista no § 18 deste artigo incidirá apenas sobre as parcelas de proventos de aposentadoria e de pensão que superem o dobro do limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201 desta Constituição, quando o beneficiário, na forma da lei, for portador de doença incapacitante.

O art. 40, § 21, da Constituição Federal consiste, conforme a teoria da eficácia das normas constitucionais, em norma de eficácia limitada, de modo que seus efeitos estavam condicionados à edição de lei específica para a efetiva execução da imunidade constitucional.

Alguns Entes Federativos, para fins de aplicação do duplo teto, estavam se utilizando do rol de doenças indicadas para a concessão de aposentadorias por incapacidade. Por outro lado, surgiram controvérsias judiciais a partir das negativas administrativas de determinados RPPS, a exemplo do Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul, em razão da ausência de lei estadual regulamentadora do art. 40, §21, da Constituição.

A principal celeuma, portanto, é saber se os RPPSs poderiam se utilizar - como instrumento à imunidade do duplo teto - da lei que trata das doenças para a concessão de benefício previdenciário por incapacidade.  

O ministro Eros Grau, quando do julgamento do RE 552487/MT em 2008, aduziu que "não cabe aqui a regulamentação de uma imunidade tributária por meio de lei previdenciária que dispõe sobre aposentadoria por invalidez", eis que "não é possível, em matéria de natureza tributária, fazer espécie de 'aproveitamento' da norma que prevê os requisitos para a aposentadoria, para aplicá-la na concessão da imunidade". (RE 552487/MT, Rel. Min. EROS GRAU, DJe. 07/10/2008).

O ministro Alexandre de Moraes, no discorrer do seu voto no RE 630137/RS-2021, compreendeu que o artigo 40, § 21, da CF/1988 "refere-se à imunidade de contribuição previdenciária (tributo), que requer regulamentação por lei complementar federal."

Assim, na falta de lei complementar federal, nos termos do art. 146, II da CF1, "compete ao respectivo ente federativo, no exercício de sua competência legislativa plena (art. 24, §§ 3º e 4º, da CF/19882), dispor sobre quais serão as doenças incapacitantes aptas a afastar a incidência do tributo". (RE 630137/RS)

Sob essa perspectiva o STF formulou a tese de que o art. 40, § 21, da Constituição Federal, enquanto esteve em vigor, era norma de eficácia limitada e seus efeitos estavam condicionados à edição de lei complementar federal ou lei regulamentar específica dos entes federados no âmbito dos respectivos regimes próprios de previdência social.

Cabe alertar que com a reforma da previdência o § 21, do art. 40 foi revogado, contudo, a revogação só será efetivamente válida quando da publicação de lei de iniciativa privativa do respectivo Poder Executivo que as referende integralmente, nos termos da EC 103/2019:

Art. 35. Revogam-se:

I - os seguintes dispositivos da Constituição Federal:

a) o § 21 do art. 40;           

Art. 36. Esta Emenda Constitucional entra em vigor:

[...]

II - para os regimes próprios de previdência social dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, quanto à alteração promovida pelo art. 1º desta Emenda Constitucional no art. 149 da Constituição Federal e às revogações previstas na alínea "a" do inciso I e nos incisos III e IV do art. 35, na data de publicação de lei de iniciativa privativa do respectivo Poder Executivo que as referende integralmente;

Portanto, a tese firmada pelo STF é de relevância ímpar na interpretação correta da aplicação do duplo teto constitucional aos RPPSs, considerando que alguns Entes Federativos ainda não referendaram os dispositivos da EC 103/2019 e, os que referendaram, passam a dispor de autonomia mais ampla para tratar da expansão da base de cálculo das contribuições dos inativos, no que pese diversas ADIs contra o art. 149 da EC 103/2019 que tramitam na Suprema Corte.

_________

1 Art. 146. Cabe à lei complementar:

I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;

2 Art. 24 (omissis)

[...]

§ 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.       

§ 4º A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.   

Herick Feijó

VIP Herick Feijó

Advogado, mestrando em Segurança Pública, Cidadania e Direitos Humanos, especialista em Direito Público e membro da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais (CFOAB).

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