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A votação nas sociedades por ações

O sistema do voto múltiplo tem como finalidade dar representatividade aos acionistas minoritários no conselho de administração.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Atualizado às 11:33

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Diferentemente do que ocorre nas sociedades limitadas, em que as deliberações são tomadas segundo o valor das quotas de cada um, a lei 6.404/76, é regida pelo princípio geral do one share, one vote, em que cada ação ordinária corresponde a 1 voto nas deliberações da assembleia geral.

No entanto, o legislador - de forma análoga ao que já ocorre em outras jurisdições - optou por estabelecer algumas exceções em relação a tal princípio, como no caso do voto múltiplo, do voto em separado e do voto plural. Mas, afinal, o que são esses institutos?

Voto Múltiplo

Pelo sistema do voto múltiplo, cada ação passa a ter direito não mais a um único voto, mas sim de quantos forem o número de vagas a serem preenchidas no conselho de administração, podendo o acionista cumular os votos em um único candidato ou distribuí-lo entre vários.

De acordo com a Lei de S.A., o procedimento do voto múltiplo é direito exclusivo dos acionistas detentores de, pelo menos, 10% das ações ordinárias da companhia. A Comissão de Valores Mobiliários, no entanto, reduziu referido percentual, podendo chegar a até 5% do capital votante, desde que o capital social seja de, no mínimo, R$ 100.000.001,00.

O sistema do voto múltiplo tem como finalidade dar representatividade aos acionistas minoritários no conselho de administração.

No entanto, o requerimento do procedimento do voto múltiplo não pode ser realizado no momento de realização da assembleia, devendo ser solicitado em até 48 horas antes da sua realização.

Importante destacar que, quando o conselho de administração é eleito por meio da sistemática do voto múltiplo, a destituição de qualquer um dos seus membros resultará na destituição de todos os seus demais integrantes, devendo a assembleia geral eleger, novamente, todos os conselheiros.

Voto em separado

A votação em separado, de forma diversa do que acontece no sistema de voto múltiplo, não é uma prerrogativa exclusiva dos acionistas detentores de ações com direito a voto. Neste caso, os acionistas de companhias abertas detentores de (i) ações preferenciais que representem, no mínimo, 10% do capital social total da companhia; e (ii) de ações ordinárias que representem, pelo menos, 15% do capital votante terão o direito de eleger, em separado, e destituir um membro e seu suplente do conselho de administração.

No referido procedimento, os minoritários podem se reunir, durante a assembleia, para eleger os conselheiros, e o acionista controlador não participa desta votação.

A Lei das S.A. estabelece ainda que, caso os acionistas ordinários e preferencialistas não perfizerem o quórum exigido, poderão se reunir para eleger, em separado, um conselheiro, desde que o total de suas ações somem, no mínimo, 10% do capital social da companhia.

Ainda, os acionistas que optarem pela faculdade do voto múltiplo não poderão participar do processo de votação em separado, conforme já deliberado pela CVM em reunião realizada em 2002.

Voto plural

Instituído pela recente lei 14.195/21, o voto plural confere a uma ou mais classes de ações ordinárias, o direito a múltiplos votos nas assembleias gerais. Em virtude desse sistema do voto, determinados acionistas poderiam manter o controle, ainda que não detenham a maioria do capital social.

De acordo com a legislação atual, a atribuição do voto plural a uma classe de ações não poderá ser superior a 10 votos por ação ordinária sendo que, no caso das SAs de capital aberto, a criação do voto plural deve ocorrer antes da abertura de seu capital. Importante ressaltar que, quando a lei indicar quóruns de deliberação baseados em percentual de ações ou capital social, sem menção ao número de votos conferidos pelas ações, o cálculo deverá desconsiderar a pluralidade de voto.

A menos que o estatuto social da companhia exija quórum superior, a instituição do voto plural depende da aprovação de (i) pelo menos, metade do total de votos conferidos pelas ações com direito a voto, e (ii) no mínimo, metade das ações preferenciais sem direito a voto ou com voto restrito. Os acionistas que não concordarem com a criação de referida classe de ações terão o direito de se retirarem da companhia.

O fim da vigência do voto plural poderá ser condicionado a um evento ou a termo, sendo que seu prazo de vigência inicial é de até 7 anos, prorrogável por qualquer prazo, desde que (i) sua prorrogação seja aprovada pelo quórum de sua criação; (ii) sejam excluídos das votações os titulares da classe cujo voto plural se pretende prorrogar; e (iii) seja assegurado o direito de retirada aos acionistas dissidentes.

Destaca-se, ainda, que, ressalvadas algumas exceções, caso as ações sejam transferidas a terceiros, as ações com voto plural, deverão ser automaticamente convertidas em ações sem voto plural.

Por fim, são vedadas operações de incorporação, incorporação de ações, fusão e cisão de companhias que não adotem o mecanismo caso a empresa incorporadora, sobrevivente ou resultante utilize o voto plural.

Acordo de Acionistas

Além dos mecanismos acima explanados, há, ainda, a possibilidade de estabelecer outros tipos de voto por meio da celebração de um acordo de acionistas, como por exemplo, o voto em bloco, a golden share e o voto qualificado.

O voto em bloco é um procedimento no qual é possível unificar o voto de acionistas de um determinado grupo. Assim, estabelece-se quóruns de aprovação dentro daquele bloco, sendo que a decisão tomada no âmbito daquele grupo, normalmente, por meio de uma reunião prévia, vincula todos os seus integrantes, mesmo os dissidentes e ausentes, na assembleia geral da companhia.

golden share, por sua vez, permite que o seu detentor detenha o poder especial de veto, mesmo que não seja titular da maioria do capital social da companhia. A golden share é utilizada, principalmente, pelo poder público, quando o Estado é detentor de participação acionária em determinada companhia.

Outro mecanismo possível de se estabelecer no acordo de acionistas, bem como no estatuto social da companhia, é o voto qualificado, em que fica determinado quóruns de aprovação superiores àqueles estabelecidos na legislação.

Voto negativo

Destaca-se, por fim, a polêmica criada recentemente quando a Vale propôs a reforma de seu estatuto social, de forma a incluir a possibilidade de adoção do voto negativo na eleição de seu conselho de administração.

Referido mecanismo estabelece que os acionistas votem nos membros que queiram eleger, atribuindo-lhes voto favorável, bem como nos candidatos que não desejam que sejam eleitos, conferindo-lhes o chamado voto negativo. Assim, os conselheiros de maior número de votos positivos seriam eleitos e, em caso de empate, o de menor número de votos negativos.

Tal proposta foi objeto de muitas críticas, principalmente sob a perspectiva da governança corporativa, considerando que os acionistas controladores poderiam votar não somente de forma favorável à eleição de seus candidatos, mas também vetar a eleição dos candidatos dos minoritários, mediante a manifestação de seu voto negativo.

Nesse sentido, tais mudanças na legislação brasileira - de forma análoga ao ocorrido em outras jurisdições - representa um importante avanço na possibilidade de financiamento das companhias com necessidade de capital, ou até mesmo relevante espectro na proteção de sócios-fundadores, em conformidade com o que já ocorre a nível mundial, representando um verdadeiro incentivo para que essas companhias considerem a manutenção de suas estruturas locais em detrimento a jurisdições offshore.

Guilherme Champs

Guilherme Champs

Sócio - fundador do escritório Champs Law.

Julia Bandeira de Melo Campos

Julia Bandeira de Melo Campos

Advogada do escritório Champs Law.

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