Alterações promovidas na Lei de Improbidade Administrativa pela lei 14.230/21 - Parte 3
Breves considerações a respeito de alguns aspectos processuais da Reforma da Lei de Improbidade Administrativa.
quarta-feira, 8 de dezembro de 2021
Atualizado em 9 de dezembro de 2021 08:41
Como requisito da petição inicial da ação de improbidade administrativa, o inciso I, do parágrafo 6º, do art. 17, da Lei de Improbidade Administrativa (LIA) deixou claro que é dever do Ministério Público a correta individualização da conduta do réu, correlacionando a cada conduta apontada os elementos mínimos da ocorrência de um dos atos de improbidade previstos em lei (art. 9º, 10 e 11).
Ainda que já se pudesse extrair tal obrigatoriedade das regras gerais de processo civil, trata-se de importante mecanismo de defesa dos réus em ação de improbidade administrativa, na medida em que resguarda de maneira expressa a obrigação do autor da ação em detalhadamente identificar qual ou quais foram as condutas praticadas e em qual dos tipos de atos de improbidade administrativa há subsunção.
De fato, a deficiência na correta identificação de condutas praticadas com incidência em uma das figuras no art. 9º, 10 e 11 impossibilita, inclusive, a defesa dos réus, de modo que a desobediência no atendimento ao comando previsto no inciso I, do parágrafo 6º do art. 17 implica em inépcia da petição inicial, salvo justificada impossibilidade, que deverá ser avaliada pelo juiz no caso concreto.
Outro aspecto importante, que também indica a clara intenção legislativa em aplicar as regras penais aos casos de improbidade administrativa, e que permite a afirmação de que o Direito Administrativo Sancionador também é instrumento do poder punitivo do estado, é a previsão do inciso II, do parágrafo 6º do art. 17 da LIA.
Pelo dispositivo, é obrigatório que a petição inicial da ação de improbidade seja instruída com documentos ou justificação sobre os indícios suficientes da veracidade dos fatos (materialidade) e do dolo imputado (autoria) ou razões da impossibilidade de apresentação de quaisquer provas.
Trata-se de exigência de demonstração da presença de justa causa para a ação por ato de improbidade administrativa, a demonstrar o quanto há, nesta ação, um cuidado legislativo de evitar despretensiosas demandas sem lastro probatório mínimo. Inclusive a parte final do dispositivo já alerta para a incidência do art. 77 (deveres das partes) e art. 80 do CPC (má-fé processual), ou seja, é obrigatória a apresentação de documentos que indiquem indícios suficientes de veracidade dos fatos e o dolo imputado, não bastando a mera justificada de impossibilidade de apresentá-las.
De forma semelhante ao que ocorre na seara penal, no caso de absolvição sumária do art. 397 do CPP, quando em consignação inicial o juiz verifica que é caso de absolvição do réu já no início do processo penal, a Lei de Improbidade administrativa, além das previsões de rejeição da inicial contidas no art. 330, do CPC (inépcia; parte manifestamente ilegítima; o autor carece de interesse processual; ausência de observância dos art. 106 e 321 do CPC) o parágrafo 6º-B determina que a rejeição deve ocorrer em caso de inobservância dos incisos I e II, como também no caso de manifesta inexistência o ato de improbidade administrativa imputado.
No caso da manifesta inexistência do ato, a lei não quis dizer que a rejeição ocorrerá somente se a conduta não se adequar a qualquer dos atos de improbidade do art. 9º, 10 ou 11, mas sim se não existir, de forma clara, o ato imputado pelo Ministério Público, pois não é autorizado ao juiz, em que pese o autor da ação tenha indicado o art. 9º, dar prosseguimento ao processo por entender que na verdade se trata do art. 10.
Não sendo caso de rejeição da ação por qualquer dos fundamentos acima descritos, o juiz deverá receber a inicial de citar o requerido para contestar no prazo de 30 (trina) dias, contados na forma do art. 231 do CPC, deixando de existir a manifestação preliminar antes prevista no antigo parágrafo 7º, do art. 17.
Novamente a reforma da Lei de Improbidade deixou claro a aplicação de regras de direito penal ao Direito Administrativo Sancionador, como se vê dos parágrafos 18 e 19 e incisos I e II.
O demandado na ação de improbidade administrativa passa não só a ter direito a um interrogatório, como também pode exercer o direito ao silencio, se recusar a falar, o que não pode ser interpretado como confissão, de onde se extrai a incidência do princípio da presunção de inocência.
Na forma do que estabelece o art. 19, incisos I e II, na ação de improbidade administrativa não se aplica a presunção de veracidade em caso de revelia e muito menos as regras de distribuição do ônus da prova previstas no Código de Processo Civil (art. 373), ou seja, cabe ao Ministério Público tanto a individualização de condutas, com indicação dos elementos mínimos de ocorrência do ato de improbidade, apresentação de documentos ou justificação de indícios suficientes de veracidade dos fatos e dolo imputado quando da inicial (art. 17, §6º, I e II), como no curso do processo é seu ônus a comprovação as alegações tecidas na petição inicial.
A Lei, de fato, inseriu importante proteção aos demandados na ação de improbidade administrativa, estabelecendo obrigações ao Ministério Público quando da petição inicial e também no curso do processo, sendo inclusive vedado ao juiz que modifique o fato principal e a capitulação legal apresenta pelo autor da demanda, conforme previsto no parágrafo 10-C, do art. 17.
Diego da Mota Borges
Mestrando em Desenvolvimento Regional pelo Centro Universitário Municipal de Franca Uni-Facef. Tem experiência na área do Direito Público, com ênfase em Direito Penal Econômico e Ações de Improbidade Administrativa. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade de São Paulo FDRP- USP (2015) e em Direito Penal Econômico Aplicado: Teoria e Prática pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC Minas (2021). Graduado em Direito pela Faculdade Dr. Francisco Maeda - Fafram (2012). Advogado no escritório Moisés, Volpe e Del Bianco Sociedade de Advogados.