Direito à memória: rede social deve restaurar perfil de usuária falecida
A decisão sensivelmente permitiu aos familiares a preservação da memória da falecida, o que, no contexto atual, sem dúvidas, abrange os perfis em redes sociais.
segunda-feira, 8 de novembro de 2021
Atualizado às 08:54
Recentemente, a 10ª Câmara de Direito Privado do Estado de São Paulo, ao julgar a Apelação Cível 1074848-34.2020.8.26.0100, determinou ao Facebook restaurar os perfis de uma usuária, os quais foram "invadidos" e alterados por terceiros, após seu falecimento.
O marido e a filha, únicos herdeiros da usuária, propuseram ação em face do Facebook objetivando recuperar as recordações constantes dos perfis junto ao Facebook e Instagram, os quais tiveram diversas fotografias excluídas e informações pessoais modificadas. Além disso, os invasores bloquearam os perfis de parentes, impossibilitando que tais pessoas praticassem qualquer ato motivados pela memória afetiva. Os autores buscavam, ainda, o fornecimento de dados para identificação dos responsáveis pelas violações e a concessão de administração das contas da falecida.
Em sede de sentença, os pedidos foram julgados parcialmente procedentes, sendo a rede social condenada a fornecer os dados de acesso das referidas contas. Contudo, foi negada aos autores a administração dos perfis, uma vez que não foram designados com o "contato herdeiro" pela titular, quando ainda viva.
Na decisão que julgou a Apelação, o desembargador Ronnie Herbert Barros Soares afirmou que a manutenção de perfis em redes sociais é um dos meios atuais de cultuar os mortos, e que "a história de vida da pessoa titular de uma conta em rede social, as recordações, as manifestações de pensamento, as fotografias e demais mídias, além de permitirem rever, por suas próprias características, fazem presente a pessoa cuja lembrança a saudade persegue."
O Relator ressaltou, ainda, ser irrelevante a discussão a respeito da falecida não ter feito uso da opção de "contato herdeiro", pois a família não pretende alterar as informações das redes, apenas preservá-las.
Concluiu, por fim, que "é o direito à memória, ao não esquecimento, à fidelidade de informações que existiam nos aplicativos e foram modificadas à revelia daqueles que detém o interesse e a legitimidade para buscar a preservação do conteúdo."
A decisão sensivelmente permitiu aos familiares a preservação da memória da falecida, o que, no contexto atual, sem dúvidas, abrange os perfis em redes sociais.
Camila Melo
Advogada no escritório Professor René Dotti.