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Dr T. - As Origens II

Hoje, numa busca sem fim, busco compreender com gosto a organização e o funcionamento do Estado, com suas estruturas e engrenagens. Com suas singularidades, peculiaridades, sutilezas e circunstâncias.

sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Atualizado em 10 de novembro de 2021 10:15

(Imagem: Arte Migalhas)

Idos de 1991 a 2002. Voltemos novamente no tempo, agora mais. Na época, Dr. T também ainda, simplesmente, T. No túnel do tempo, morava em um prédio distante do Colégio onde estudava.

O pimpolho, eu, ia de cabelos tijelinha, botinhas ortopédicas, calças curtas, uniforme do colégio e lancheira do Rambo. Na ocasião, morava longe do Colégio. Todas as manhãs, eu partia com meu pai e com meu irmão rumo à escola de carro. Ouvíamos no trajeto os clássicos da rádio Cultura, dentre eles, Mozart e Beethoven, a celebração do dia com Cyro del Nero e pequenas histórias de Borges, dentre outros programas. Sem contar do gosto pelo Jazz que nosso pai nos incutiu.

Nosso pai nos deixava no Colégio e ia trabalhar duro, horas por dia, às vezes, varando noites e tendo de viajar para plataformas de petróleo distantes, para manter o sustento da casa. Quando nossa mãe nos buscava ao término das aulas, voltávamos ouvindo as rádios CBN ou Eldorado, notícias do dia, da política e da economia, e do tempo com Josélia Pegorim, ou ainda, notícias sobre o trânsito caótico de Sampa City, tendo uma vez ligado para a rádio para informar sobre o trânsito da av. Nove de Julho, a pedido do meu irmão e meu.

Na piscina do prédio, todos os amigos nos chamavam para brincar. Mas, preferia ler a revista National Geographic, em inglês, pois não havia ainda em português. Lia com meu pai, que havia feito a assinatura. Meu pai ainda fez pipas fantásticas e, com ele, empinávamos em fins de semana. Recordo também do nosso primeiro guaraná que tomamos juntos em um bar. Hoje, por sua vez, em nossas caminhadas juntos pelo bairro, para recolher, em estabelecimentos, notas fiscais que doa para um hospital de crianças com câncer, religiosamente, comemos em um boteco torresmos e tomamos coca-cola, conversando.

Nossa mãe, engenheira tendo trabalhado em empresas, dava aulas particulares de matemática, para vários alunos, para complementar a renda. Com ela, aprendi a gostar de futebol, a torcer pelo Corinthians, a pegar ondas nas praias, jogar totó, ping pong, e o gosto pelos estudos, assim como pelo samba e mpb.

Visitávamos nossa família no Rio de Janeiro, principalmente, aos finais dos anos, no Natal e Ano Novo. Meu avô paterno tinha uma grande biblioteca (que ainda está lá), o que, certamente, despertava o nosso gosto pelo saber e, com isso, para a escrita.

Minha avó paterna também incentivava e incentiva até hoje o gosto pela leitura e pelos estudos e pela busca do conhecimento, quando conversamos, todos os domingos por telefone.  E ainda... quando completei 14 anos, me presenteou com uma assinatura da revista Playboy (o primeiro exemplar que ganhei, edição comemorativa de agosto (aniversário da revista), de Maitê Proença, em pelo, em uma vila na Itália). Meus hormônios agradecem até hoje. Inclusive, tenho as lembranças de horas no banheiro, com minha mãe batendo à porta, quando ainda não havia Porn Tube, Red Tube e equivalentes...

Tenho guardado até hoje alguns exemplares da épica revista. Na verdade, gostava muito dos romances policiais e eróticos que eram publicados na Playboy. Gostava também das entrevistas e de outras reportagens. Com o tempo, digo que passei a comprar a revista pelo conteúdo das matérias e não apenas pelas fotos, que podiam ser facilmente acessadas pela internet.

Com meus pais, aprendi a tomar gosto pelas leituras e pelos estudos. Nossos pais foram verdadeiros heróis. Preocupados, acima de tudo, com o bem-estar de meu irmão e o meu. Fizeram tudo o que estava ao alcance deles para nos dar educação de qualidade, saúde e, sobretudo, amor.

Realmente, não eram perfeitos, como ninguém. Mas, mesmo com defeitos, tinham virtudes maiores. Minha mãe, quando pequeno, me incentivava a aprender matemática por um jogo de computador, quando nem se falava e nem se imaginava em gameficação. 

Me ensinou a importância da religião e de crer em Deus. Dava aulas de catequese e servia eucaristia a senhoras no hospital. Meu pai sempre ia às missas com minha mãe e com meu irmão e eu, e a levava a todos os hospitais para servir a hóstia, sem deixar de leva-la a outros eventos religiosos ou outros não religiosos.

Minha mãe tinha um coração enorme, era uma pessoa pura, com muito amor, o que, infelizmente, dava brechas para algumas pessoas mal-intencionadas. Mas isto não vem ao caso no momento. Para nossa profunda dor, faleceu em 2018.

Meu pai, hoje, segue em frente, em sua trajetória. Todos os domingos à noite fazemos uma oração em família (meu pai, meu irmão e eu) e oramos por nossa mãe, por nós e pela família e, ainda, por um país melhor, mais justo, menos desigual, apesar de todas as dificuldades.

Com meu irmão, brincávamos de Comandos em Ação e congelávamos os bonecos dos Cavaleiros do Zodíaco, para desespero da mamma. Também jogávamos futebol e vídeo-game juntos. Aliás, na época, éramos os únicos do prédio onde morávamos que tínhamos um mega-drive, como lembra um grande amigo da época que mantenho até hoje e sou padrinho de seu filho. E, assim, nossos amigos chegavam a fazer fila no térreo, para quando um perdia outro subia ao apartamento e jogávamos o jogo da Besta.

Também nessa época, no prédio, aprendi a jogar xadrez com um grande amigo, que, hoje mora na Alemanha com a esposa, mas ainda mantemos contato e jogamos partidas online à distância.

Finalmente, naquela época, meu irmão e eu dávamos já os primeiros passos no Empreendedorismo. Fabricávamos e vendíamos geladinhos, com a ajuda de nossa avó materna, para os amigos do prédio, inspirados em filmes, onde as crianças vendiam limonadas na frente de casa.

No Colégio Dante Alighieri, assim como todos os amigos e amigas, começávamos a nos tornar pioneiros. As sementes de todos começavam a brotar. Tenho boas lembranças e recordações dos tempos de Dante.

Com os amigos, nos intervalos, descíamos correndo as escadarias para pegar na biblioteca os últimos exemplares da Bruxa Onilda ou da Coleção Salve-se Quem Puder. Jogávamos Sin City 2000 no laboratório de informática.

Aliás, nas aulas de computação, aprendíamos as primeiras noções de programação com um jogo de uma tartaruga - programávamos seus movimentos e ações.

Por outro lado, também nossos amigos nos atiravam bolinhas de papel, gizes, nos colocavam no lixo ou pendurados nos cabides. Mas, nos jogos olímpicos, deixávamos de lado as diferenças e jogávamos juntos para vencer, apesar de levar frangos homéricos como goleiro.

Sim, sofríamos bullying quando nem se falava nessa expressão. Olhando para trás, posso dizer que faz parte do aprendizado e da vivência. Só não podem ser cometidos excessos. Caso isso ocorra, é preciso procurar o auxílio imediato dos professores, para intermediar as questões.

Tenho boas recordações deste tempo. Lembro que na pré-escola uma amiga me pediu em namoro por intermédio de outra amiga. Por vergonha, e com frio na barriga, não aceitei, apesar de querer. Na oitava série aos 14 anos, tive minha primeira grande paixão platônica, não correspondida. Lembro que na época passava a novela Suave Veneno, com um romance entre Rodrigo Santoro e Luana Piovani, que mexia com meu pequeno coração. Além disso, era época do Napster e, assim, baixava a música Sozinho de Caetano Veloso e ouvia sem cessar no repeat a noite toda, madrugada adentro. Enfim, superado isso, numa festa de 15 anos, por outro lado, tirei uma garota para dançar e, no baile, passei a bailar com a garota e trocar carícias. Na época do vestibular, por fim, no cursinho, matava algumas aulas, para jogar xadrez com uma grande amiga.

Recordo também com muito carinho das professoras e dos professores que tive. Certamente, todos marcaram minha pessoa e minha trajetória. Na sexta série, tive um grande professor de Geografia, que nos fez refletir as condições e a realidade de nosso país. Na oitava série, em 1999, tive uma professora de Literatura, que quando o Timão perdia para o Palmeiras na Libertadores, me mostrava na lousa o poema, dizendo: "Nicholas, veja só... Minha terra tem Palmeiras onde canta o sabiá...". No Ensino Médio, tive outras professoras de Literatura, que me fizeram tomar gosto de vez pela leitura e pelos poemas. Uma delas, em referência a Macunaíma, dizia: "Nicholas, o que Macunaíma quis dizer com brincar com as índias...". Outra maestra lia e recitava poemas com o coração, inspirando a todos nós. Quanto à matemática, lembro com muito carinho das listas quilométricas que a mestra nos passava... Por fim, tive uma grande professora com quem trocava várias ideias, refletia sobre a vida e sobre literatura e sobre o ensino e sobre as pessoas, enfim, sobre os movimentos de vanguarda e estádios de futebol lotados, porém vazios...

No terceiro ano do Ensino Médio cursei a área de Exatas. Pretendia prestar vestibular para engenharia de telecomunicações, cheguei a visitar faculdades de engenharia. Mas, em tempo, percebi que seria melhor prestar Direito. Apesar de gostar de números e me sair bem nas matérias de Exatas, tinha mais afinidades com as Humanas.

Assim, dava os primeiros passos a me tornar um engenheiro do Direito. Hoje, numa busca sem fim, busco compreender com gosto a organização e o funcionamento do Estado, com suas estruturas e engrenagens. Com suas singularidades, peculiaridades, sutilezas e circunstâncias. Sim, um engenheiro... só que do Direito!

Olhando para trás, vejo que também não era Santo. Enchia o saco e pentelhava vários amigos. Hoje, se pudesse, daria um forte abraço fraterno em cada um deles. Do Dante Alighieri formei minhas bases de relacionamentos, amizades e conhecimentos.

Daí ser possível ingressar numa boa faculdade de direito. Um professor da PUC/SP, de direito penal, delegado, dizia: "Nicholas, domine a base e pare de voar!". Michael Jordan também já dizia em sua obra: "Back to the base!" - Ou seja, "domine a base!".

Enfim, do Dante saí com uma boa base sólida de conhecimentos, que carrego até hoje! Na PUC/SP, mesmo na época não dando atenção tanto às matérias técnicas, me aprofundei em matérias filosóficas, o que, hoje, vejo ser de grande valia na advocacia e na academia.

No dia-a-dia pessoal, profissional e acadêmico, procuro fazer o bem sem ver a quem. Não custa nada tratar a bem as pessoas. Lembro de colegas autoritários, bravos que esbravejam com funcionários nos cartórios. Ora, em tempos de processos físicos, não custa nada o servidor derrubar sem querer o processo para trás do armário. Tratar bem as pessoas não tem preço e, pelo contrário, como já dizem: gentileza gera gentileza! Na vida e no direito, portanto, fazer o bem! Buscar e perseguir o bem!

E para fazer o bem não é preciso ter uma religião! É importante crer em Deus! No Dante fiz catequese, depois fui crismado na Igreja Nossa Senhora do Brasil, e na PUC/SP cursei a disciplina Introdução ao Pensamento Teológico. Meu irmão, na PUC/SP, em engenharia, também cursou a disciplina e, em uma universidade católica, estudou sobre o Budismo e outras religiões. As religiões, por caminhos diferentes, buscam levar ao mesmo destino. Fazer o bem e ter amparo espiritual. 

Nicholas Maciel Merlone

Nicholas Maciel Merlone

Advogado | Professor na Pós-graduação do Senac & Escritor. Mestre em Direito Político e Econômico pelo Mackenzie. Bacharel em Direito pela PUC/SP. Autor de artigos, ensaios e análises.

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