Cidade inteligente com um toque de criatividade - A cidade humana
Sabe-se hoje que para não ser uma cidade liquefeita, a cidade inteligente ligada cidade criativa precisa ser muito mais do que uma central de dados.
quarta-feira, 13 de outubro de 2021
Atualizado às 15:01
Primeiro, para contextualizar nosso trabalho, precisamos entender o que são as chamadas cidades inteligentes. Segundo a união Européia, essas cidades são sistemas de pessoas interagindo e usando energia, materiais, serviços e financiamento para catalisar o desenvolvimento econômico e a melhoria da qualidade de vida.
Porém, o uso da nomenclatura está totalmente associado ao fluxo de interação entre o uso estratégico de infraestrutura e serviços de informação e comunicação com planejamento e gestão urbana, visando garantir as necessidades sociais e econômicas da sociedade.
De acordo com os estudos proporcionados pelo IESE Business School, na Espanha, existem alguns critérios que são capazes de dimensionar o nível de inteligência de uma cidade, sendo eles:
1) Governança;
2) Administração pública;
3) Planejamento urbano;
4) Tecnologia;
5) Meio-ambiente;
6) Conexões internacionais;
7) Coesão social;
8) Capital humano;
9) Economia.
Para quem estuda o tema sabe que apesar de ser um conceito relativamente recente, o conceito de Smart City já se consolidou como assunto fundamental na discussão global sobre o desenvolvimento sustentável e movimenta um mercado global de soluções tecnológicas, que estimula uma aplicação de valores significativos para o mercado econômico.
Nesse contexto, visando fazer parte desse novo desenvolvimento, as cidades de países emergentes estão investindo em produtos e serviços inteligentes para sustentar o crescimento econômico e as demandas materiais da nova classe média.
É notório que tal definição e percepção global de que há uma necessidade de associação entre as evoluções econômicas e as questões sociais, tem propiciado que países desenvolvidos busquem aprimorar a infraestrutura urbana existente para permanecer competitivos (destaque para grandes investimentos).
Assim, na busca por soluções para esse desafio, mais da metade das cidades europeias já possuem ou estão implementando iniciativas para se tornarem de fato cidades inteligentes. Mas, estudiosos do tema, buscando evoluir cada vez mais as noções de desenvolvimento urbano, tem citado outro tipo de entendimento, as cidades criativas.
Maria das Mercês de Mendonça Covas, em seu artigo "Cidades inteligentes e criativas e smatificação dos territórios: apontamentos para reflexão", nos diz que: "só teremos verdadeiramente uma cidade inteligente se tivermos ao mesmo tempo, uma cidade criativa. São as duas faces da mesma moeda, isto é, são facetas próprias da cidade humana que ambicionamos, pois, a criatividade, tal como a arte, podem salvar-nos a cada momento."
Na lógica da cidade criativa percebe-se que há necessidade de se enfocar a criatividade e os desenvolvimentos culturais, incentivando que as cidades cresçam a partir de investimento em arte também.
Como exemplo, há a possibilidade de regeneração urbana pela cultura, ou seja, espaços desindustrializados podem dar espaço à centros culturais e artísticos. Ou seja, seria uma forma de regenerar o meio urbano através da economia criativa, que, como sabido, emerge antes de qualquer programa de reabilitação ou requalificação mais formal e padronizado.
O pensamento desses estudiosos proporciona um direcionamento de que ao democratizar a cultura caminhos são abertos para a formação de uma política urbana criativa, um grande exemplo disso são os coworking que intensificam as interrelações proporcionando agrupamentos criativos, onde empresas de diferentes setores interagem e criam soluções e desenvolvimento.
Assim, tais posicionamentos geram práticas e plataformas colaborativas, enraizando esses agrupamentos criativos, criando condições materiais e contextuais para a próxima fase de desenvolvimento chamada de ecossistema criativo.
Obviamente que não existem apenas pontos positivos nesse tipo de desenvolvimento social e, como pode-se perceber, também não é algo alcançado a curto tempo, seriam grandes investimentos com resultados condicionados a um largo lapso temporal.
Ao tratar das questões negativas trazidas em curto prazo para as cidades dispostas a se engajar nesse tipo de cidade, há como efeito colateral latente a turistificação, a pressão imobiliária, a gentrificação1 dos bairros dos centros históricos e o fetiche pela vida noturna que acaba por perturbar os moradores dessa cidade.
A grande questão dessas propostas de modificação das cidades para cidades aptas a gerir de forma equilibrada a globalização e o desenvolvimento social e econômico de suas cidades reside no que pode ser considerado como modernidade liquida, ou seja, ser uma alteração efémera, transitória, passageira.
Sabe-se hoje que para não ser uma cidade liquefeita, a cidade inteligente ligada cidade criativa precisa ser muito mais do que uma central de dados. Isso porque, como sabido, a cidade inteligente é uma cidade de instrumentos, com oferecimento de dispositivos tecnológicos e digitais, sendo uma cidade performática.
Já a junção proposta nesse trabalho seria a associação dessa cidade performática com a filosofia do sistema urbano e as propriedades emergentes, portanto, há a aplicação de uma cidade ecologicamente inteligente e criativa, com uma população socialmente incluída e solidária, uma cidade que finalmente experimentaria novas formas de regulação e governança, com um direcionamento a uma cidade humana.
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1 É um processo de transformação de centros urbanos através da mudança dos grupos sociais ali existentes.