E se a OAB representar o advogado por ostentação?
Conheça oito teses discutidas no meio jurídico atualmente
segunda-feira, 4 de outubro de 2021
Atualizado às 13:17
Ter uma opinião pessoal sobre a ostentação por parte de um advogado ou advogada - o assunto do momento - não nos impede de termos outra opinião jurídica diferente. Também não impede que o colega que foi representado por ostentar nas redes sociais tenha defesa.
Ocorre o mesmo quando um advogado defende em um júri um acusado de homicídio. O advogado trabalha pela absolvição do seu cliente, trabalha pela absolvição do júri, o que não quer dizer que concorde ou apoie um homicida.
Afinal, todos temos o direito de defesa e, para isso, precisamos de advogados.
É possível imaginar que algum Tribunal de Ética e Disciplina da OAB pelo país represente advogados por ostentação. Desde que nosso artigo anterior, OAB regulamenta ostentação de advogado nas redes sociais, colocou em evidência este assunto, o debate tem tomado conta do meio jurídico e várias teses de defesa têm sido discutidas.
Todo mundo tem direito a uma defesa técnica, de qualidade, tem direito a um julgamento justo e, se houver pena, que seja proporcional ao que realmente tenha cometido. Ainda mais o advogado, que tem como dever e ofício lutar pelos direitos de toda a sociedade, precisa ter colegas que o defendam.
Até o momento, as principais teses de defesa discutidas no meio jurídico são:
1ª tese. Tranquilizar o cliente dizendo que se houver um julgamento justo, sendo ele primário, no máximo sofrerá uma sanção de censura. Seria a 1º tese de defesa.
A lei 8.906/94 diz:
Art. 36. A censura é aplicável nos casos de:
I - infrações definidas nos incisos I a XVI e XXIX do art. 34;
II - violação a preceito do Código de Ética e Disciplina;
III - violação a preceito desta lei, quando para a infração não se tenha estabelecido sanção mais grave.
A ostentação foi regulamentada no provimento 205/2021, ou seja, não se enquadra em nenhum dos casos acima. Como prevê a Constituição Federal em seu art. 5º, XXXIX - "não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal". Por isso, a sanção máxima seria de censura.
Falando em Constituição Federal, vem a 2ª tese de defesa:
A Constituição determina em seu art. 5º, II - "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".
A norma é autoexplicativa. Provimento não é lei, portanto, ninguém será obrigado a deixar de ostentar em rede social, senão em virtude de lei. Enquanto não tiver uma lei nesse sentido, provimento não poderá obrigar. Para obrigar algum advogado, deverá haver alteração no Estatuto da Advocacia.
3ª tese de defesa, o provimento fere novamente a Constituição Federal em seu art. 5º, X, viola a vida privada dos advogados.
Como leciona Alexandre de Morais, a supremacia das normas constitucionais no ordenamento jurídico e a presunção de constitucionalidade das leis e atos normativos editados pelo poder público competente exigem que, na função hermenêutica de interpretação do ordenamento jurídico, seja sempre concedida preferência ao sentido da norma que seja adequado à Constituição Federal.
Cabe aqui por tudo já exposto, um controle de constitucionalidade do parágrafo único do art. 6º do provimento 205/2021 da OAB. Deverá ser arguido a inconstitucionalidade da norma.
4ª tese, também é garantido pela Constituição o livre exercício da profissão (art. 5º, XIII). Neste sentido, recordamos que no processo movido contra a OAB onde se discutia a violação do princípio da liberdade profissional na sanção disciplinar de suspensão em decorrência do inadimplemento das anuidades, o STF declarou a inconstitucionalidade dos arts. 34, XXIII, e 37, §2º, da lei 8.906/1994.
5ª tese, o provimento não veda qualquer ostentação. Veda a ostentação de bens.
Então cada caso deve ser analisado, verificando se a ostentação seria capaz de captar clientes indevidamente.
Entendemos que o rol é exemplificativo e não taxativo, por isso, quando um advogado mostra uma viagem de férias com sua família, não é ostentação.
Mesmo porque, pela realidade financeira da maioria da população brasileira, poucas pessoas conseguem ostentar. De acordo com pesquisa realizada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo, 70% das famílias brasileiras estão endividadas.
6ª tese, debater qual seria o limite legal de ostentação. É uma norma subjetiva que comporta interpretações diversas. Ocorreu ostentação no exercício da profissão ou na vida privada? Fundamentar-se-ia que a OAB não pode intervir na vida privada.
Como bem disse a conselheira federal da OAB Marina Gadelha em seu artigo A OAB e o direito à ostentação, "a proibição de ostentação não atinge a vida privada". Vale salientar que se a ostentação não for na vida privada, há o risco de a OAB interpretar como infração. Mas como bem disse a conselheira federal, não deve atingir a vida privada.
No mesmo artigo, a conselheira continua: "Dito de outro modo, é óbvio que o advogado e a advogada podem, nos seus canais (virtuais ou não) pessoais, se gabar de usar roupas e acessórios caros, de possuir veículos de luxo ou de realizar viagens exclusivas. Não devem, no entanto, vincular tal suntuosidade à advocacia, sob pena de restar configurada a publicidade e, consequentemente, a vedação aqui tratada".
7ª tese. O provimento 205/21 regulamenta e vai além do Código de Ética.
O regulamento deve sempre se ater à lei. Apenas ela pode inovar a ordem jurídica para criar direitos e obrigações. O regulamento inovou e, portanto, está ultrapassando os limites legais.
8ª tese. Utilizando os ensinamentos do jurista uruguaio Eduardo Couture, "teu dever é lutar pelo Direito, mas no dia em que encontrares em conflito o direito e a justiça, luta pela justiça". Trabalhar-se-ia na defesa um tópico exclusivo para essa lição de Eduardo Couture. O direito não é estático. É um sistema vivo que se renova, transforma constantemente.
Não é justo que o advogado seja punido pela OAB por publicar momentos de alegria e lazer em viagens, festas, restaurantes. Não é justo que advogado seja punido por compartilhar nas redes sociais suas conquistas, ainda mais depois dessa famigerada pandemia de Covid-19.
Deve ser garantido aos advogados o sagrado direito de defesa. Assim como o advogado combate a injustiça defendendo a sociedade, é justo que receba o mesmo tratamento se for representado, que possua defesa técnica e julgamento justo!