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A ilegitimidade do texto-base da MP de Ambiente de Negócios aprovado na Câmara dos Deputados

Padrões do comportamento legislativo, como os que vêm sendo observados nos últimos tempos, em nada contribuem para a segurança jurídica no País, sendo indispensável a participação efetiva da sociedade civil para a construção de uma alternativa mais adequada.

terça-feira, 14 de setembro de 2021

Atualizado às 09:15

(Imagem: Arte Migalhas)

O atual formato de atuação da classe política nacional se baseia na criação de leis com títulos marqueteiros, em que a preocupação com o rótulo acaba sendo muito mais importante do que seu conteúdo e trâmite constitucional. 

O processo legislativo vem agonizando com ativismos recorrentes que, em sua grande maioria, não contam com a participação efetiva de especialistas, muito menos da sociedade civil, para uma avaliação holística de seus impactos e repercussões.

Tomemos o instituto da Medida Provisória como exemplo: a previsão constitucional é de que ele deve ser utilizado pelo Presidente da República exclusivamente em casos urgentes e relevantes.

Nos últimos anos, contudo, Medidas Provisórias vêm sendo, cada vez mais, utilizadas por representantes do executivo nacional como artifício para burlar as disposições constitucionais sobre o processo legislativo. 

Entretanto, a Corte Constitucional firmou entendimento recente no sentido de que a introdução de temas estranhos ao texto original da Medida Provisória fere as regras de iniciativa legislativa e, portanto, são inconstitucionais. 

A inconstitucionalidade acima mencionada é facilmente observada no parecer do relator da Medida Provisória de Ambiente de Negócios (MPAN), na tentativa de justificar as alterações sugeridas. 

O texto substitutivo aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados inovou (e muito) nas matérias originalmente previstas.

Boa parte das mudanças sequer guarda pertinência temática com a redação original. 

Para muito além de um apego ao formalismo, o texto substitutivo da MPAN deixou uma série de perguntas sem respostas:  

  • O que levou o legislador a alterar a lei das S/A e, sem qualquer discussão preliminar, criar o instituto do Voto Plural? Aperfeiçoar as Golden Shares não poderia ser uma opção menos traumática?  
  • Qual será o real destino das sociedades simples que, pela redação do texto substitutivo, serão extintas? Serão necessariamente transformadas em sociedades limitadas? Haverá limitação da responsabilidade daqueles que são pessoalmente responsáveis, tais como os profissionais intelectuais?  
  • O texto substitutivo prevê que as sociedades necessariamente precisam efetuar o preenchimento de fichas cadastrais com informações de seus titulares e administradores. Mas quem são os titulares? Isso não desencadeará uma exposição dos acionistas das sociedades por ações? 

É bem verdade que algumas previsões trazidas pelo texto substitutivo foram positivas. São exemplos:  

  • A extinção do instituto da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI), em virtude do surgimento das Sociedades Limitadas Unipessoais;   
  • A emissão automática de licenças e alvarás de funcionamento para as empresas que exerçam atividades de risco médio; e
  • A autorização que os administradores de companhias possam residir oficialmente no exterior. 

Mais uma vez, contudo, a sensação que fica é a de que o cenário legislativo nacional vai sofrendo com a criação de "jabutis", que vão sendo encaixados de forma atabalhoada e que só agravam a instabilidade jurídica e econômica brasileiras. 

Padrões do comportamento legislativo, como os que vêm sendo observados nos últimos tempos, em nada contribuem para a segurança jurídica no País, sendo indispensável a participação efetiva da sociedade civil para a construção de uma alternativa mais adequada. 

O que nos resta é a esperança que o Senado Federal tolha os excessos cometidos pela Câmara dos Deputados e respeite o processo legislativo... ou será que nas casas legislativas o espeto continuará sendo de pau? 

Alexandre Venâncio

Alexandre Venâncio

Advogado e integrante da equipe de Direito Empresarial de Martorelli Advogados.

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