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Uma interpretação coerente do §7-B do art. 6 da lei 11.101/05

Uma crítica à interpretação do Superior Tribunal de Justiça à ordem cronológica para execução de atos constritivos contra empresa em recuperação judicial em sede de execução fiscal.

segunda-feira, 6 de setembro de 2021

Atualizado às 16:11

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Conforme já sabem àqueles solícitos às alterações legislativas e dos recentes pronunciamentos jurisprudenciais acerca da Recuperação Judicial de Empresas, em 23 de junho deste ano houve a desafetação do Resp número 1.694.261-SP, e assim, o derradeiro cancelamento do tema 987 do STJ1. Daí, em semelhança a demais Migalhas2, que o pronunciamento do min. Mauro Campbell Marques de que "a novel legislação concilia o entendimento sufragado pela Segunda Turma" ao "entendimento consolidado da segunda seção"3 permitindo a prática de atos constritivos em face da empresa em recuperação judicial, cabendo ao juízo da recuperação judicial deliberar acerca de tais atos, de modo que não haja uma inviabilização do plano de recuperação judicial, não é suficiente para garantir segurança jurídica.

Ora, é de se esperar que a interpretação de qualquer dispositivo presente na LRJF (Lei de Falências e Recuperação Judicial) esteja de acordo com a primeira finalidade estabelecida pela lei, i.e; a manutenção da fonte produtora, há muito reconhecido pela jurisprudência4, portanto, caso a interpretação do novo §7-B do artigo 6 da LRJF seja permissiva a tal finalidade, se estará presente de grave incoerência, acarretando em dano à segurança jurídica. Além deste requisito, importante destacar, apesar de óbvio, o de observância a normas de hierarquia normativa superior.

Assim, de modo exigir que a norma faça sentido quando contraposta às demais pertencentes do conjunto, é possível assegurar a convertibilidade da segurança jurídica, evitando interpretação incoerentes ao todo5, como no caso da interpretação da alteração legislativa objeto desta Migalha.

Não obstante, em respeito à coragem de transformar acima da pretensão de agradar, é preciso "dar nome aos bois", direcionando a crítica, mostrando a que interpretação se refere:

"As alterações promovidas na lei 11.101/2005, por meio da lei 14.112/2020, alteraram o substrato normativo processual referente ao procedimento de atos constritivos em execução fiscal para pessoas jurídicas em recuperação judicial(...) Dessa forma, pela nova legislação, o procedimento de constrição deverá seguir as seguintes etapas: Primeira etapa: Ato de constrição do patrimônio pelo juízo da execução fiscal; Segunda etapa: Comunicação do ato de constrição ao juízo da recuperação judicial; Terceira etapa: Deliberação sobre o ato de constrição pelo juízo da recuperação judicial; Quarta etapa: possibilidade de substituição do ato constritivo pelo juízo da recuperação. Além disso, em qualquer situação, é possível a celebração de ato de cooperação judicial entre o Juízo da recuperação e o Juízo da execução fiscal. (REsp 1514891 relator(a) ministro OG FERNANDES, data da publicação 4/8/2021.)

O entendimento supra regurgita sobre o executado o onûs excessivo de arcar com possível penhora sobre bens que não se sujeitam à execução, uma vez que nos moldes do art. 789 do CPC, essa sujeição encontra limitação na lei. Tal Limitação é a expressa pela própria LRJF aos bens essenciais para a manutenção da atividade empresarial.

Apesar de haver na criticada interpretação a possibilidade de substituição do ato constritivo caso enseje em impossibilidade de manutenção da empresa, não é possível ignorar que tal substituição será somente posterior, o que, salvo desdém à capacidade da mora até a efetiva decisão jurisdicional de causar dano à parte, poderá ter o condão de impossibilitar ou agravar severamente a manutenção da atividade empresarial.

Portanto, em vista de buscar uma interpretação que seja "constitucionalmente adequada"6, e da prevenção da necessidade de movimentação do aparato jurisdicional, a análise anterior à concretização do ato constritivo aparenta maior coerência com mandamentos como justiça, de menor gravosidade ao executado, e do dever de prevenção, além da correção de vícios formais. Ademais, cumpre relembrar que o próprio CNJ já reconheceu a importância econômica e social de não manter atos constritivos sobre bens das recuperandas.7

Não obstante, também busca facilitar a realidade de baixa recuperações de empresas no Brasil, somente 12,7%8.

Desse modo, a prévia análise pelo juízo da recuperação judicial de forma a prevenir a ocorrência de atos constritivos sobre bens essenciais à manutenção da empresa, portanto reforçada pela finalidade da LRJF, a qual, por conseguinte visa a garantia do exercício da função social e do estímulo à atividade econômica, se mostra a interpretação mais coerente quando comparada àquela proferida pelo Superior Tribunal de Justiça.

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1 "A primeira seção, por unanimidade, determinou a remoção da submissão do recurso especial ao regime especial dos recursos repetitivos, cancelando-se o tema repetitivo 987, nos termos da proposta do sr. ministro relator." (REsp 1.694.261/SP, STJ primeira seção, rel. min,l Mauro Campbell Marques. DJe 28/6/2021).

3 REsp 1.694.261/SP. Primeira Seção.  Min. Rel Mauro Campbell Marques. DJe 28/6/2021.

4 "... não seria razoável, e nem se coaduna com a sistemática do próprio decreto, que valores insignificantes provoquem a quebra de uma empresa. Isso nada mais é do que preservar a unidade produtiva em vez de satisfazer uma dívida. AgRg no Ag 1.022.464/SP, STJ, rel. Min Aldir Passarinho Junior, 4a Turma, DJe 29/6/2021.

5 Para mais informações acerca da delimitação de Segurança Jurídica além da pretensão de "certeza", ou de um sentido meramente formal: Ramos. André Luiz Arnt. Segurança Jurídica e indeterminação normativa deliberada: elementos para uma teoria do direito (civil) contemporâneo. Curitiba. Juruá, 2021.

6 STRECK, L. L. Hermenêutica, Constituição e autonomia do Direito. Revista de Estudos Constitucionais, Hermenêutica e Teoria do Direito. jan/jun. 2009. p. 76

7 Recomendação 63 de 31/3/2020 - Art. 1º Recomendar a todos os Juízos com competência para o julgamento de ações de recuperação empresarial e falência que deem prioridade na análise e decisão sobre questões relativas ao levantamento de valores em favor de credores ou empresas recuperandas, com a correspondente expedição de Mandado de Levantamento Eletrônico, considerando a importância econômica e social que tais medidas possuem para ajudar a manter o regular funcionamento da economia brasileira e para a sobrevivência das famílias notadamente em momento de pandemia de Covid-19.

Felipe Quege

Felipe Quege

Acadêmico de Direito. Diretor Jurídico do Centro Acadêmico Ubaldino do Amaral. Competidor em MOUT COURT de Direito Tributário, inclusive internacional.

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