Sócios na advocacia
Trata-se o presente artigo sobre advogados, os únicos profissionais que podem integrar as duas espécies de sociedades de advogados, sejam como sócios patrimoniais ou de serviço, alertando que o sócio de capital não poderá possuir quotas de serviços concomitantemente.
terça-feira, 17 de agosto de 2021
Atualizado em 23 de agosto de 2021 07:59
Este artigo foi elaborado por iniciativa da Comissão Nacional de Sociedades de Advogados e da Comissão Especial de Gestão, Empreendedorismo e Inovação, ambas do Conselho Federal da OAB, por seus Presidentes, respectivamente, Marcelo Mota Gurgel do Amaral e Lara Cristina de Alencar Selem, que idealizaram a publicação de uma obra coletiva com o tema "Os impactos da gestão nas sociedades de advogados", que seria lançado na Conferência Nacional de Advocacia 2020. A Conferência não ocorreu e a obra foi abortada.
A convite dos aludidos Presidentes, coube a mim escrever um artigo abordando o tema: SÓCIOS NA ADVOCACIA.
Introdução
Trata-se o presente artigo sobre SÓCIOS NA ADVOCACIA, focalizando-se, inclusive, os reflexos da Lei 8.906, Regulamento Geral e Provimentos do Conselho Federal.
O registro das espécies de sociedades de advogados é da competência exclusiva da Ordem dos Advogados do Brasil, na forma da Lei 8.906/1994, seu Regulamento Geral, Provimentos 112/2006, 169/2015 e 170/2016, devendo ser respeitado o Código de Ética e Disciplina.
O tema do presente artigo, SÓCIOS NA ADVOCACIA, tem a finalidade de trazer aos Colegas Advogados, estudantes de Direito e gestores jurídicos algumas reflexões sobre o assunto.
Conceitos
É o artigo 15 da lei 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia e da OAB) que, de modo especial, prescreve as exclusivas formas pelas quais os advogados podem constituir as espécies de sociedades de advogados, duas, a saber:
Art. 15. Os advogados podem reunir-se em sociedade simples de prestação de serviços de advocacia ou constituir sociedade unipessoal de advocacia, na forma disciplinada nesta lei e no regulamento geral.
É vedada a constituição de quaisquer das duas espécies de sociedades de advogados fora das normas e preceitos estabelecidos na lei 8.906, constituindo violação, uma infração ética (art. 34, II).
O art. 16 do EAOAB dispõe que "não são admitidas a registro nem podem funcionar todas as espécies de sociedades de advogados que apresentem forma ou características de sociedade empresária, que adotem denominação de fantasia, que realizem atividades estranhas à advocacia, que incluam como sócio ou titular de sociedade unipessoal de advocacia pessoa não inscrita como advogado ou totalmente proibida de advogar."
O registro das espécies de sociedade de advogados, que é efetivado exclusivamente nas Seccionais da OAB, observa os requisitos e procedimentos previstos em Provimento do Conselho Federal (Art. 43. do Regulamento Geral), atualmente, os Provimentos 112/2006 e Provimento 170/16.
As espécies de Sociedades de Advogados podem firmar Ajustes de Associação ou de Cooperação, e respectivos Distratos, que devem ser averbados à margem do registro de cada Sociedade envolvida (art. 8º, IV, Provimento 112/06 e art. 7º, II, Provimento 170/2016). Os Ajustes de Associação ou de Cooperação podem ser firmados entre: (i) uma ou mais sociedade de advogados, (ii) entre uma ou mais sociedades de advogados e uma ou mais sociedade individual de advocacia. Pode também ser entre uma ou mais sociedades individuais de advocacia.
Os Ajustes de Associação ou de Cooperação abrem oportunidades para as Sociedades, que podem aglutinar outras especialidades com a conjugação de saberes dos sócios de cada uma das sociedades. A seguir, um link com sugestões de cláusulas: clique aqui.
Vale registar que tramita perante o Conselho Pleno do Conselho Federal da OAB a versão de um novo Provimento, que dispõe sobre a unificação nacional dos Registros de Atos das Sociedades de Advogados e Sociedades Unipessoais de Advocacia, visando racionalizar os tramites internos perante as Secionais da OAB dos processos de registro, alteração, distrato e dissolução das Sociedades de Advogados e Sociedades Unipessoais de Advocacia, com observância inclusive aos artigos 24-A e 24-B do Regulamento Geral.
A sociedade de advogados e a sociedade unipessoal de advocacia, na forma do art. 15, parágrafo 1º, do EAOAB, somente "adquirem personalidade jurídica com o registro aprovado dos seus atos constitutivos no Conselho Seccional da OAB em cuja base territorial tiver sede". Não havendo registro da sociedade na OAB, espécie de sociedade de advogados não é.
É a dupla natureza do registro: Declaratória, certifica a criação da sociedade; e, Constitutiva, atribui a personalidade jurídica.
A natureza jurídica é de sociedade simples. Independentemente de sua organização ou complexidade, a Sociedade de Advogados jamais poderá ser sociedade empresária. A vedação à apresentação de caráter mercantil decorre da própria lei especial que a regula. A atividade do advogado é indiscutivelmente de caráter intelectual.
O Provimento 169/15 do Conselho Federal, dispõe sobre as relações societárias entre sócios patrimoniais e de serviços, e o advogado associado previsto no art. 39 do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil.
Transcrevo os quatros primeiros artigos do mencionado Provimento 169/2015 visando facilitar a consulta, até porque evitam dúvidas sobre a questão:
Art. 1° Os advogados regularmente inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil poderão reunir-se para colaboração profissional recíproca, a fim de somar conhecimentos técnicos, em sociedade de prestação de serviços de advocacia, sendo esta uma espécie societária sui generis no contexto da sociedade civil.
O artigo 1º. ratifica que somente advogados podem constituir espécies de sociedades de advogados. A multidisciplinariedade, com outras profissões, é vedada.
Art. 2° A sociedade de advogados será constituída por sócios patrimoniais ou por sócios patrimoniais e sócios de serviço, os quais não poderão pertencer a mais de uma sociedade na mesma base territorial de cada Conselho Seccional, independentemente da quantidade de quotas que possua cada sócio no contrato social.
§1° A integralização das quotas patrimoniais será realizada em moeda corrente e/ou bens.
§2° A sociedade de advogados poderá estabelecer quotas de serviço.
§3° O sócio de capital não poderá possuir quotas de serviços concomitantemente.
O aludido artigo deixa claro que a sociedade de advogados deverá ser constituída por, no mínimo, dois sócios patrimoniais, podendo ou não ser integrada por sócio de serviço: "sócios patrimoniais ou por sócios patrimoniais e sócios de serviço". (Grifei). Sociedade Individual é a que tem um único titular das cotas patrimoniais.
Art. 3° Os sócios patrimoniais e de serviço terão os mesmos direitos e obrigações, exceto no que toca à contribuição pecuniária para a constituição do capital social, que é exclusiva dos sócios patrimoniais, bem como sua contrapartida, que é o direito a receber os respectivos haveres no momento do desligamento da sociedade, e naquilo que de outra forma esteja expresso no contrato social e/ou instrumento próprio.
Parágrafo único. É assegurado a todos os sócios o direito de voto.
Este dispositivo legal complementa o anterior, no sentido de que a sociedade de advogados precisa ser integrada por, no mínimo, dois sócios patrimoniais, porque somente estes respondem pela constituição do capital social, bem como sua contrapartida, que é o direito a receber os respectivos haveres no momento do desligamento da sociedade. Extinto o capital social a sociedade terá o mesmo fim, sem direito de eventuais sócios de serviço darem continuidade à sociedade, que fazem jus aos direitos mencionados no artigo 4º. abaixo.
Art. 4° Os sócios patrimoniais e de serviço farão jus à participação nos lucros da sociedade, na forma prevista nos respectivos contratos sociais ou em instrumentos específicos que a disciplinem.
O Provimento 187/18 do Conselho Federal trouxe exceção à regra de que todos os sócios devem efetivar a inscrição suplementar na base territorial da Filial. Ficaram dispensados da inscrição suplementar, exclusivamente, os sócios de serviço que não venham a exercer a advocacia na respectiva Filial (§ 1º, art. 7º.).
Para tanto, a meu sentir, os mencionados sócios de serviço deverão firmar uma declaração para tal finalidade ou fazer a indicação em cláusula no contrato social, como forma de evitar pendências no registro da alteração contratual.
É interessante registrar que somente sócios respondem pela direção social, não podendo a responsabilidade profissional ser confiada a pessoas estranhas ao corpo social, mas o sócio administrador poderá ser substituído no exercício de suas funções e os poderes a ele atribuídos podem ser revogados a qualquer tempo, na forma do Contrato Social, desde que assim decidido pela maioria do capital social. É permitido a delegação de funções próprias da administração operacional a profissionais contratados para esse fim, pelo sócio, ou sócios administradores.
O Provimento 112/06 estabelece, ainda, que o Contrato Social (i) pode determinar a apresentação de balanços mensais, com a efetiva distribuição dos resultados aos sócios a cada mês; (ii) veda cláusulas que suprimam o direito de voto de qualquer dos sócios, permite estabelecer quotas de serviço ou quotas com direitos diferenciados, vedado o fracionamento de quotas; (iii) a possibilidade, ou não, de o sócio exercer a advocacia autonomamente e de auferir, ou não, os respectivos honorários como receita pessoal; (iv) prevê a responsabilidade subsidiária e ilimitada pelos danos causados aos clientes, por ação ou omissão, no exercício da advocacia, aos sócios e aos associados.
Quanto à eventual e qualquer controvérsia que surgir da execução ou da interpretação da do contrato social ou que se relacione à Sociedade, a sugestão é de que seja resolvida por meio de mediação e/ou arbitragem, recomendando-se o estabelecimento de uma cláusula compromissória.
Vale, ainda, destacar dois artigos do Código de Processo Civil, o artigo 85, § 15, que concede o direito de o advogado poder requerer que o pagamento dos honorários que lhe caibam seja efetuado em favor da sociedade de advogados que integra, na qualidade de sócio e o artigo 272, § 1º, que prescreve que os advogados poderão requerer que, na intimação a eles dirigida, figure apenas o nome da sociedade a que pertençam, desde que devidamente registrada na Ordem dos Advogados do Brasil.
Exemplos práticos:
Cotas de Serviços
A criação das cotas de serviços deve ser deliberada pelos sócios, levando-se em consideração o quórum estabelecido no Contrato Social da Sociedade, sugerindo-se o seguinte:
I - Os sócios patrimoniais deliberam criar 5.000 (cinco mil) cotas de serviço, não negociáveis, que serão distribuídas aos Sócios de Serviços.
II - Os sócios admitem como sócios de serviços os seguintes advogados: F e G.
III - O Capital Social é de R$ 10.000,00 (dez mil reais), correspondente a 10.000 (dez mil) cotas de participação patrimonial, no valor de R$ 1,00 (um real) cada uma.
§ 1º - A sociedade tem 15.000 (quinze mil) cotas, sendo 10.000 (dez mil) cotas de participação patrimonial, no valor de R$ 1,00 (real) cada uma, e 5.000 (cinco mil) cotas de serviços, assim distribuídas entre os sócios:
§ 2º - Todos os sócios devem contribuir com seu trabalho profissional para a realização dos objetivos sociais.
§ 3º - Todos os sócios têm os mesmos direitos e obrigações, exceto no que toca à contribuição pecuniária para a constituição do capital social, que é exclusiva dos sócios patrimoniais, bem como à sua contrapartida, que é o direito a receber seus haveres no momento do desligamento da sociedade, avaliados com base no seu acervo, calculados conforme estabelecido no presente contrato, também exclusivo dos sócios patrimoniais.
§ 4º - As cotas de serviços, por não constituírem objeto de direito sucessório, não gerando direitos aos herdeiros de receberem os eventuais haveres do sócio falecido na sociedade, com a exceção prevista no § 5º, sendo intransferíveis a terceiros a contribuição de serviço na sociedade, em caso de retirada, voluntária ou por morte, ou exclusão do sócio detentor das mesmas, ficarão em Tesouraria para cessão a outros e eventuais sócios de serviço.
§ 5º - Em relação aos sócios de serviço, os seus haveres serão calculados unicamente em função da participação a que têm direito e que não tiverem sido efetivamente percebidos até a sua retirada, voluntária ou por morte, ou exclusão.
Cláusula Compromissória
A seguir uma sugestão de Cláusula Compromissória, lembrando-se que o número de árbitros deve ser ímpar:
Toda e qualquer controvérsia que surgir da execução ou da interpretação do presente contrato, ou que com ele se relacionar, inclusive nas hipóteses de exclusão, retirada ou dissolução parcial ou total da sociedade, será resolvida por meio de arbitragem, de acordo com as normas do Regulamento de Arbitragem da CÂMARA DE ARBITRAGEM DA......... por árbitro (s), nomeado (s) conforme o disposto no referido Regulamento. O procedimento arbitral será realizado na cidade de ..................... (Estado).
Conclusão
As espécies de sociedades de advogados têm por objeto regular e disciplinar as relações entre advogados, administrativa e financeiramente, praticando os atos que não sejam privativos de advogados (artigo 1º., lei 8.906). A reunião de advogados em sociedades volta-se para suas próprias necessidades e não para a atividade em si.
Às advogadas e aos advogados a certeza de que a vida em uma das espécies citadas é uma oportunidade disfarçada e bem mais confortável em vários níveis.
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Disponível aqui.
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Stanley Martins Frasão
Presidente da Comissão de Sociedades de Advogados da OAB/MG. Membro da Comissão Nacional de Sociedades de Advogados. Advogado do escritório Homero Costa Advogados.