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A nova lei de licitações e a vedação à prévia habilitação fiscal

Na vida real do dia-a-dia das licitações a exigência prévia de regularidade diminui substancialmente a competitividade do certame devendo ser deixada para momento posterior, conforme delimitou a nova lei.

quinta-feira, 29 de julho de 2021

Atualizado às 14:16

(Imagem: Arte Migalhas)

A nova lei de licitações consagrou a fórmula da habilitação como fase posterior ao julgamento.

Nesse sentido o novo códex licitatório modificou a regra prevista na lei 8.666/93 e acolheu a regra da bem sucedida praticidade.

A regra, porém, pode ser invertida, caso haja justificativa nesse sentido. Por exemplo, numa licitação em que a futura concessionária necessite de grande capital para operar a futura concessão faz todo o sentido que a fase de habilitação se faça antes do julgamento. Empresas de acanhado capital não teriam a menor condição de participar do certame licitatório.

A questão que poderá levantar polêmica é o tema da vedação de inversão de fases no que diz respeito à regularidade fiscal do licitante.

Assim, prevê a nova lei:

"Art. 63. Na fase de habilitação das licitações serão observadas as seguintes disposições:

(...)

II - será exigida a apresentação dos documentos de habilitação apenas pelo licitante vencedor, exceto quando a fase de habilitação anteceder a de julgamento;

III - serão exigidos os documentos relativos à regularidade fiscal, em qualquer caso, somente em momento posterior ao julgamento das propostas, e apenas do licitante mais bem classificado;

A lei 14.133 criou uma hipótese em que a inversão não é permitida, especificamente no que tange à demonstração da regularidade fiscal.

Tal regra já estava prevista no âmbito restrito da ME/EPP. Assim, prevê a lei complementar 123/2006:

"Art. 42.  Nas licitações públicas, a comprovação de regularidade fiscal e trabalhista das microempresas e das empresas de pequeno porte somente será exigida para efeito de assinatura do contrato." 

Novamente a nova lei de licitações aproxima-se do conceito de gestão corporativa da iniciativa privada.

É provável que uma empresa privada deixe de contratar um fornecedor que tenha débitos junto à empresa contratante, mas é infinitamente mais provável que a empresa contratante exige uma negociação do débito como parte da nova contratação.

É nesse diapasão que a nova lei prevê a regularidade fiscal posterior já que os débitos fiscais são um problema crônico para parcela significativa das empresas nacionais.

Não se pode ignorar a elevada carga tributária calculada em torno de 1/3 do PIB, para utilizarmos valores oficiais disponibilizados em 2019 do tesouro nacional.

Primeiro ponto a ser abordado é se nunca poderia ocorrer a exigência prévia de habilitação da regularidade fiscal.

Termos categóricos como "nunca", "sempre", "jamais" não costumam combinar com a interpretação sistemática do sistema jurídico.

"Nunca" haverá pena de morte.....haverá, excepcionalmente, no caso de guerra declarada....

Então, pensamos que a hipótese de impossibilidade de prévia habilitação fiscal deve ser excluída da imensa maioria das licitações.

Porém, de forma excepcionalíssima, pode haver tal exigência.

Digamos que ocorra (hipoteticamente) uma licitação pelo INSS para contratação de empresa que investigue e detecte fraudes quanto à exigência de CND em contratações públicas.

Nesta hipótese a regularidade fiscal parece ter relevância superlativamente superior à média das demais contratações.

Uma empresa sem regularidade fiscal (pelo menos junto ao INSS) não poderia participar de tal licitação. A regularidade seria razoavelmente uma condição de participação tal e qual o capital mínimo para uma licitante que pode gerir uma concessão de elevado capital.

Essa hipótese, porém, é mais acadêmica que real.

Na vida real do dia-a-dia das licitações a exigência prévia de regularidade diminui substancialmente a competitividade do certame devendo ser deixada para momento posterior, conforme delimitou a nova lei.

A competitividade muitas vezes pode ser o pretexto para a contratação de produtos de baixa qualidade já que o Poder Público acaba não tem condições técnicas de delimitar em seu termo de referência as devidas qualificações mínimas e favorece a redução da qualidade como contrapartida da melhor oferta de preço.

A assimetria de informações é o pressuposto teórico da nova lei e a saída se encontra na modalidade diálogo competitivo, contratação integrada e semi-integrada e no uso admitido das regras do INMETRO (art. 17,§6º), além da vedação de marca (art. 41, III).

No caso em debate sobre a vedação à exigência da habilitação fiscal ocorre a ampliação da competitividade sem a mácula corriqueira de redução qualitativa da proposta do licitante. Pelo contrário, favorece a competição sem a válvula de escape do amesquinhamento qualitativo da oferta.

Não há relação lógica entre postergar a demonstração da regularidade fiscal e o oferecimento de produto de qualidade inferior.

O aumento da competitividade será significativo, já que num país com carga tributária superior a um terço do PIB (número otimista) a exigência de regularidade fiscal tangencia a inexigibilidade de licitação diante da singularidade do licitante.....

Laércio José Loureiro dos Santos

VIP Laércio José Loureiro dos Santos

Procurador Municipal, mestre em Direito pela PUCSP, autor de "Inovações da Nova Lei de Licitações", Ed. Dialética, 2.021, Foi coordenador do curso de Direito da UNISAL/SP, foi membro do TED-OAB

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