Alienação parental: a criança vira arma de vingança
De maneira básica, alienação parental é a pratica pela qual um dos genitores, de forma consciente ou não, descarrega todo o rancor com a finalidade de fazer com que a criança escolha se afastar do outro genitor.
quarta-feira, 14 de julho de 2021
Atualizado às 15:38
O divórcio é fundamento pelo qual, geralmente, ocorrem os casos de alienação parental. Quando o casal se entende, aceita e dialoga o divórcio passa a ser uma fase mais tranquila para os filhos. Entretanto, não é o que geralmente acontece nos processos de divórcio, principalmente quando é litigioso.
Nesse cenário, ocorre disputa pelo poder familiar e os filhos passam a ser arma e/ou instrumentos de vingança contra o ex. cônjuge. Maria Berenice Dias afirma tal fato ao dizer "Os filhos tornam-se instrumentos de vingança, sendo impedidos de conviver com quem se afastou do lar. São levados a rejeitar e a odiar quem provocou dor e sofrimento"1.
Geralmente o alienante nutre raiva, dor, sofrimento, angústia e vingança contra o ex. cônjuge que decidiu por um fim na relação. Buosi destaca que:
"[...] o inconformismo do cônjuge com a separação, a depressão, a insatisfação das condições econômicas advindas pelo fim do relacionamento, a necessidade de posse exclusiva sobre os filhos, a solidão a que se vê no presente ou o fato do ex-cônjuge manter a relação com o parceiro da relação extramatrimonial que adveio a separação são causas determinantes para que um dos cônjuges (geralmente o detentor da guarda) utilize-se da única "arma" que lhe resta para atingir e vingar-se de outro: os filhos do ex-casal."2
Quem detêm a guarda dos filhos, na maioria dos casos, é quem pratica a alienação parental. Muitas vezes de forma inconsciente. Tal fato também pode ocorrem em casais que ainda vivem juntos ou, também, por aquele que não detém a guarda. Aliás, essa prática pode ocorrer por parte de outros parentes, como avós, tios e irmãos, inclusive por ambos pais.
A finalidade de praticar a alienação parental é apenas uma: fazer com que a criança escolha se afastar de um dos seus genitores. Para isso são cotadas histórias falsas, até verdadeiras, mas deturpadas e, de alguma forma maculando a imagem do outro genitor. Nesse contexto, Silvio de Salvo Venosa (2011, p.320), afirma que:
"O guardião em geral, seja ele divorciado ou fruto de união estável desfeita, passa a afligir a criança com ausência de desvelo com relação ao outro genitor, imputando-lhe má conduta e denegrindo a sua personalidade sob as mais variadas formas. Nisso o alienador utiliza todo o tipo de estratagemas. Trata-se de abuso emocional de consequências graves sobre a pessoa dos filhos. Esse abuso traduz o lado sombrio da separação dos pais. O filho é manipulado para desgostar ou odiar o outro genitor."3
Ocorre que, tal prática pode causar prejuízos psicológicos gravíssimos à criança, pois geralmente passa a odiar o outro genitor. O ponto chave da questão é que o que une os filhos aos pais é o sentimento de afeto, respeito e admiração e tais sentimentos devem prevalecer com o fim da sociedade conjugal e nesse contexto Fábio Vieira Figueiredo (2014, p.44) traz que:
"O que se nota é que o universo de possibilidades em que se insere o fenômeno da alienação parental é tão amplo quanto a multiplicidade de relações familiares, de parentesco e por laços de afinidade que possam existir, buscando alienar um em detrimento do contato com o vitimado, por motivos egoísticos, vingativos, pessoais e, que de forma geral, não enxerga os benefícios da manutenção de diversas relações interpessoais para a formação humana da pessoa alienada."4
Com o passar do tempo, a influência negativa trazida pela prática de alienação parental é tão maléfica que os filhos passam a acreditar de tal forma, na repulsa que acreditam absolutamente que a raiva e a repulsa que sentem pelo genitor vítima da alienação parental são provenientes deles próprios, com o tempo a criança internaliza todos os sentimentos e já não consegue mais distinguir o que é a realidade da fantasia criada nas histórias e o que é a verdade de fato, inclusive para o alienador.
Gabriela dos Santos Barros faz a seguinte ponderação:
"O Ambiente Familiar Hostil (conhecido pela doutrina estrangeira como Hostile Aggressive Parenting) é, muitas vezes, tido como sinônimo de Alienação Parental, mas não devem ser confundidos. A alienação parental está ligada a situações envolvendo a guarda de filhos ou caso análogo por pais divorciados ou em processo de separação litigiosa. Está mais relacionada ao fator psicológico. Enquanto, o ambiente familiar hostil (AFH) é mais abrangente, fazendo-se presente em qualquer situação em que duas ou mais pessoas ligadas à criança ou ao adolescente estejam divergindo sobre aspectos referentes à criação do infante (educação, religião, valores, atividades esportivas e lúdicas, etc.), por exemplo, quando os avós divergem dos pais acerca da criação das crianças. O AFH está mais associado intimamente não ao aspecto psicológico, mas sim aos comportamentos e às decisões concretas que influenciem a vida e o desenvolvimento dos menores."5
Dessa forma, em que pese ser incomum, é possível que aconteça alienação parental entre casais que vivem juntos, sendo imprescindível que não seja confundida com ambiente familiar hostil.
Dessa forma, conclui-se que as sequelas da alienação parental podem surgir tanto em quem comete quanto em quem é vítima da prática. Entretanto, as consequências mais graves são identificadas nas crianças e podem repercutir para a vida adulta, em suas futuras relações amorosas.
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1 DIAS, Maria Berenice. Incesto e alienação parental. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 78.
2 BUOSI, Caroline de Cássia Francisco. Alienação parental: uma interface do direito e da psicologia. Curitiba: Juruá, 2012, p. 57.
3 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 320.
4 FIGUEIREDO, Fábio Vieira; ALEXANDRIDIS, Georgios. Alienação parental. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 44.
5 BARROS, Gabriela dos Santos. Análise poliédrica da alienação parental e da síndrome de alienação parental. Acesso em: 15 de junho de 2021.
Sarah Priscilla Guimarães
Advogada Civilista especialista em Direito das Famílias, Direito Empresarial e Direito Bancário. Vasta experiência em Direito Sucessório. Atualmente cursando pós-graduação em Direito Empresarial. Membro das Comissões de Direito de Família da ABA - Brasília, Direito de Família, Direito Empresarial e Direito Notarial e Registros Públicos da OAB/DF.