Por que mudar a Lei de Improbidade?
Dizer que a mudança foi aprovada para beneficiar parlamentares é um argumento falacioso.
quarta-feira, 14 de julho de 2021
Atualizado às 09:06
A Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que altera a Lei de Improbidade Administrativa (LIA).Os críticos do projeto dizem que as mudanças "afrouxam" ou "flexibilizam" as punições por improbidade. Dizem que foi aprovado às pressas e que seu objetivo é proteger os interesses pessoais dos parlamentares. Entretanto, as mudanças aprovadas são necessárias e corrigem problemas decorrentes da aplicação das normas atuais.
O projeto de lei foi objeto de ampla discussão com a sociedade. Foram realizadas 14 audiências públicas com participação de magistrados, membros do Ministério Público, advogados, integrantes de órgãos de controle, advogados públicos, professores e representantes de associação, entre outros.
Dizer que a mudança foi aprovada para beneficiar parlamentares é um argumento falacioso. Eles são eleitos justamente para aprovar leis. Se há necessidade de mudança da LIA, só poderá ser pela via do Legislativo. Personificar a discussão, dizendo que serve para beneficiar deputado X ou o partido Y, é fugir do debate que importa; o mérito das mudanças.
A LIA foi aprovada, em 1992, com o propósito de estabelecer punições por atos praticados por agentes públicos que caracterizassem enriquecimento ilícito, dano ao Erário ou violação a princípios da administração pública. Embora seja inquestionável que a LIA tenha punido inúmeros agentes públicos desonestos, a lei trouxe como efeito colateral o ajuizamento de inúmeras ações contra cidadãos honestos, o que é causado tanto pela banalização do conceito de improbidade quanto pela existência de ações com nítida conotação política.
Isso torna a gestão pública uma atividade de risco. Aqueles que assumem um cargo público receiam agir de forma proativa com o temor de infringir a LIA, contribuindo para o "apagão das canetas". E os mal-intencionados não parecem estar inibidos com os riscos de uma condenação.
O princípio da presunção de inocência não mitiga esse risco. Por se tratar de processo civil, a simples propositura da ação exige do acusado a constituição de advogado às suas expensas para apresentação de defesa, sob pena de se presumirem verdadeiros os fatos. Além disso, o pedido de indisponibilidade de bens, medida excepcional nos primeiros anos da lei, virou regra a partir da última década. A própria existência do processo passou a ser uma punição para o acusado.
O projeto de lei visa a resolver esses problemas. Entre as alterações aprovadas, está a melhor delimitação do conceito de ato de improbidade, eliminando o tipo culposo, já que ninguém é desonesto sem intenção. Também merece destaque a regulamentação para a adoção de indisponibilidade de bens dos réus, estabelecendo as hipóteses de cabimento, meios e limites.
A reforma da LIA aprovada pela Câmara, se virar lei, evitará injustiças, dará mais segurança jurídica à gestão pública e punirá com mais celeridade aqueles que efetivamente devem ser condenados.
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*Texto originalmente publicado pelo O Globo
Lucas Cherem de Camargo Rodrigues
Especializado em Direito Público pela Faculdade de Direito de Itu. Graduado em Direito pela USP. Advogado na área de Direito Administrativo no escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados.