Decisão liminar suspende a aplicação do IGP-M dos últimos 12 meses em contrato de compra e venda de imóvel
Determinando a aplicação do percentual fixo de 7,435%, referente a média dos índices dos anos de 2018 e 2019, a decisão aplicou a teoria da imprevisão e da onerosidade excessiva em detrimento de nítido desequilíbrio contratual, justificado pela alta do índice de correção monetária IGP-M.
quarta-feira, 14 de julho de 2021
Atualizado às 09:10
A 3ª Vara Cível da Comarca de Santa Bárbara d'Oeste deferiu o pedido de tutela provisória de urgência pleiteado por um adquirente de lote residencial, em contrato de compra e venda de imóvel, suspendendo a aplicação do índice de correção monetária IGP-M dos últimos 12 meses, determinando a aplicação, pelos próximos 12 meses, do percentual fixo do IGP-M de 7,435%, referente a média dos índices dos anos de 2018 e 2019.
Como é de conhecimento, em decorrência da pandemia do covid-19 que assola o mundo, houve uma elevação no preço das commodities, que puxou o IPA (Índice de Preços ao Produtor) para uma alta de 5,23%, um dos indicadores que compõem o IGP-M, correspondendo a 60% do seu valor, além de outros motivos, conforme dados e informações da própria FGV.
Desta forma, conforme informações fornecidas pela própria FGV, é possível verificar que o IGP-M está em franca ascensão.
Ainda, segundo os dados e informações da FGV, já se verifica que o IGP-M saltou de 1,51% em abril de 2021, para 4,10% em maio de 2021.
É o maior resultado mensal desde setembro de 2020.
Só em 2021, ou seja, em 5 (cinco meses) do ano, o índice já acumula alta de 14,39%, sendo que nos últimos 12 (doze) meses a alta acumulada foi de 37,04%.
Desta forma, a magistrada Dra. Eliete de Fátima Guarnieri aplicou o artigo 478 e 480 do Código Civil, amparando-se assim na teoria da imprevisão e na teoria da onerosidade excessiva.
A decisão mitiga a aplicação do princípio contratual do pacta sunt servanda aplicando assim o princípio contratual rebus sic stantibus.
Além dos fundamentos legais utilizados pela magistrada, quando se verifica fatos supervenientes imprevisíveis que acarretam na onerosidade excessiva, é possível a aplicação do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor e do artigo 317 do Código Civil.
O dispositivo legal consumerista versa que é possível a "modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas".
Em sentido semelhante, outro dispositivo legal em comento versa que "quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação."
Em que pese a existência do entendimento que "o contrato faz lei entre as partes", o ordenamento jurídico permite a revisão contratual para preservar o equilíbrio contratual.
O princípio rebus sic stantibus tem sua aplicação implícita nos contratos de longa duração, pois é notório que muitas vezes os fatos existentes no momento da assinatura do contrato se alteram, por fatos imprevisíveis, ao longo dos anos.
Por fim, necessário também ponderar que a correção monetária tem o intuito de manter o preço dos contratos em valores mais próximos da realidade possível, evitando o enriquecimento de uma parte às custas da outra, jamais podendo ser fonte de enriquecimento e lucro de uma das partes.
Neste sentido, a decisão liminar em comento se mostra justa, razoável e proporcional, pois lastreia-se no ordenamento jurídico e, sobretudo, nos princípios da boa-fé contratual, cooperação, lealdade e da função social do contrato.
Gabriel Silva Mingatto
Advogado associado no escritório Cascone Sociedade de Advogados, graduado pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), especialista em Direito Processual Civil, pela Escola Paulista de Direito.