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O Código de Processo Civil e as mudanças nas penhoras de bens

De modo geral, as ações de cobrança são propostas por aquele que afirmar ter direito de exigir algo de alguém, seja dinheiro ou coisas, com base em provas com eficácia de título executivo (Ação de Execução) ou sem (Ação Monitória).

quarta-feira, 9 de junho de 2021

Atualizado às 10:38

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

O advento da nova ferramenta do SISBAJUD, apelidada de "teimosinha", foi muito esperada por quem figura como credor em alguma ação de cobrança. Isto porque tal ferramenta deve ajudar a encontrar ativos financeiros em nome dos devedores e a recuperar o crédito devido. Entretanto, a jurisprudência também tem evoluído neste sentido, com decisões mais favoráveis aos credores, apesar das limitações impostas pelo Código de Processo Civil (CPC).

De modo geral, as ações de cobrança são propostas por aquele que afirmar ter direito de exigir algo de alguém, seja dinheiro ou coisas, com base em provas com eficácia de título executivo (Ação de Execução) ou sem (Ação Monitória). Tais tipos de ação estão regulamentadas no CPC, artigos 741/925 e 700/702, respectivamente. No caso da Ação Monitória, a sentença constituirá título executivo judicial, fundamento para o Cumprimento de Sentença (artigos 513/536, do CPC).

O artigo 835 do mesmo diploma trata especificamente da ordem de preferência da penhora. Por outro lado, o artigo 833 determina quais são os bens impenhoráveis, com a intenção de proteger a dignidade e o sustento do devedor e de sua família. No presente artigo vamos nos concentrar na penhora de ativos financeiros e bens imóveis, que a meu ver, sofreram mais mudanças nos últimos anos.

O inciso I do artigo 835 do CPC afirma que o dinheiro, em espécie ou depósito bancário, deve ter prioridade na ordem de penhora. Todavia, o inciso IV do artigo 833 proíbe a penhora de salário, aposentadoria, pensão e valores destinados ao sustento do devedor. Entretanto, a jurisprudência tem relativizado tal dispositivo, mantendo a penhora sobre salários em alguns casos específicos. As exceções mais comuns são a penhora para o pagamento de verbas alimentares e quando os valores recebidos pelo executado forem superiores a 50 salários-mínimos mensais.

Ainda há uma corrente que tem ganhado força na jurisprudência, que é a penhora de percentual de salário do devedor. Inclusive a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do EREsp 1582475/MG, de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, firmou entendimento de que "a regra geral da impenhorabilidade de salários, vencimentos, proventos etc. (art. 649, IV, do CPC/73; art. 833, IV, do CPC/2015), pode ser excepcionada quando for preservado percentual de tais verbas capazes de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família".

Já em relação à conta poupança, impenhorável pelo inciso X do artigo 833 do CPC, esta permanece protegida, desde que o valor total seja menor que 40 salários-mínimos (independente de quantas cadernetas são utilizadas pelo devedor) e que não seja utilizada como conta corrente. Isto porque a caderneta de poupança foi protegida por ter um cunho de economia pessoal, para segurança futura do indivíduo e sua família, e não para blindagem do patrimônio contra futuras execuções. Para tanto, necessário que se comprove que a conta poupança não é movimentada como uma conta corrente, através de extratos que demonstrem que os valores ali depositados não são utilizados para transações corriqueiras, conforme decisão abaixo:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA - BLOQUEIO DE NUMERÁRIO EM CONTA POUPANÇA - INAPLICABILIDADE DA PROTEÇÃO INSCRITA NO INCISO X DO ART. 649 DO CPC - DESLOCAMENTO DA REDOMA PROTETIVA PELO DESVIRTUAMENTO DA FUNÇÃO SOCIAL DA APLICAÇÃO FINANCEIRA DE CUNHO POPULAR E MODESTO - LEGALIDADE DO ATO COATOR CONSTRITIVO. Afasta-se a redoma protetiva da impenhorabilidade, prevista no inciso X do art. 649 do CPC, se a constrição recai sobre valores depositados em conta poupança, quando o seu titular a utiliza como conta corrente, realizando transações inerentes a esta categoria de conta, desvirtuando das características de economia futura. Isso porque a conta poupança possui cunho de economia, de segurança pessoal e futura, ao contrário da conta corrente, cujo uso está vinculado a transações corriqueiras. Por derradeiro, a indicação de que a conta bancária era utilizada para depósitos de comissões oriundas da atividade de representante comercial autônoma, exercida pela impetrante, não foi em nenhum momento demonstrada nos autos, permanecendo inalterada a conclusão externada pelo Juízo regional de que não se tratava de conta salário, sequer protegida pela norma do art. 649, IV, do CPC. Recurso ordinário conhecido e desprovido. (TST-RO-20598-85.2013.5.04.0000, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Data de Julgamento: 16/2/16, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 19/2/16).

Quando se trata de bens imóveis, muito comum se falar sobre os bens de família. A lei 8009/90 dispõe sobre a impenhorabilidade dos bens de família, incluindo o imóvel utilizado como residência familiar. Contudo, a própria lei lista exceções à tal impenhorabilidade em seu artigo terceiro. Os casos mais comuns são: os bens imóveis do fiador dado em garantia ou a execução de hipoteca nos casos em que a dívida foi constituída a favor da família.

Entretanto, devemos reforçar que nos casos em que o imóvel declarado como bem de família, for de valor muito superior ao considerado padrão médio, ele também pode ser penhorado, reservando-se parte do valor levantado para que o devedor possa adquirir novo imóvel e constituir lar digno. Um exemplo é o julgamento da Apelação 1094244-02.2017.8.26.0100, em 2/9/20, pelo Relator Castro Figliolia, na qual afirmou que, apesar da inegável característica do imóvel ser bem de família, o mesmo poderia ser penhorado, desde que garantida a reserva de valor suficiente pra aquisição pelo devedor de outro imóvel digno. Isto porque a impenhorabilidade pretende a preservação da dignidade da pessoa humana, "não a intocabilidade de toda e qualquer moradia, valha o quanto valer."

Outra possibilidade pouco discutida é a de penhora de vagas de garagem que possuem matrícula própria no Registro de Imóveis, opção utilizada por alguns prédios residenciais e que não estão protegidas pela impenhorabilidade dos bens de família.

Por fim, justo se ressaltar que, respeitando-se os princípios do contraditório e da ampla defesa, as ações de cobrança possuem a função social de atender ao credor, reavendo valor ou coisa que a este pertence, e não ao devedor, que preservada sua dignidade, possui obrigação moral (e judicial, se o caso) de quitar os compromissos adquiridos.

Edmárin Ferrário de Lima Chaves

Edmárin Ferrário de Lima Chaves

Advogada associada do escritório Henrique & Gaspar Sociedade de Advogados.

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