Não incide imposto de renda sobre as compensações dos registradores civis das pessoas naturais
As referidas reuniões têm como foco orientar os delegatários de serventias extrajudiciais sobre as regras tributárias aplicáveis à categoria.
sexta-feira, 21 de maio de 2021
Atualizado às 13:11
No ano de 2019, a Receita Federal do Brasil passou a realizar reuniões de conformidade tributária com titulares de cartórios em várias regiões fiscais do Brasil.
As referidas reuniões têm como foco orientar os delegatários de serventias extrajudiciais sobre as regras tributárias aplicáveis à categoria.
Dentre as diversas orientações da Receita Federal, consta a recomendação para que os registradores civis das pessoas naturais declarem como rendimentos tributáveis as compensações recebidas pela prática de atos gratuitos por força de lei.
Em que pese a orientação do Fisco Federal, a incidência de imposto de renda sobre as compensações pela prática de atos gratuitos é inconstitucional e ilegal.
O Superior Tribunal de Justiça assentou, em relação aos notários e oficiais de registro, que "art. 236 da CF/88 e a legislação que o regulamenta permitem a formação de uma estrutura economicamente organizada para a prestação do serviço de registro público, assemelhando-se ao próprio conceito de empresa"¹.
Portanto, constata-se que, segundo o STJ, as serventias extrajudiciais equiparam-se a sociedades empresárias para fins de tributação.
Entretanto, a remuneração dos notários e oficiais de registro é composta por emolumentos, que segundo o Supremo Tribunal Federal têm natureza tributária de taxa².
A competência tributária para instituir e fixar o valor dos emolumentos é dos Estados e do Distrito Federal (cf. §2º do art. 236 da Constituição da República e art. 1º da lei Federal 10.169/2000).
O parágrafo único do art. 1º da lei Federal 10.169/2000 estabelece expressamente que os Estados e o Distrito Federal devem fixar os emolumentos em valor correspondente ao efetivo custo e à adequada e suficiente remuneração pelos serviços prestados.
O art. 8º da aludida lei Federal, por sua vez, dispõe que os Estados e o Distrito Federal estabeleçam formas de compensação aos registradores civis das pessoas naturais pelos atos gratuitos praticados por força de lei.
O referido dispositivo visou a criar subvenção³ aos oficiais de registro civil das pessoas naturais em decorrência das isenções legais, sem fonte de custeio, instituídas pela lei Federal 9.534/97.
As isenções criadas pela aludida lei Federal colocaram em risco, por falta de recursos, o exercício dos serviços de registro civil das pessoas naturais em caráter privado, conforme determina o caput do art. 236 da Constituição da República.
Assim, a criação das subvenções instituídas para compensar os oficiais de registro civil das pessoas naturais foi essencial para manter as serventias em caráter privado.
A Receita Federal entende que as subvenções recebidas pelos registradores civis das pessoas naturais estão submetidas à tributação pelo imposto sobre a renda pessoa física.
Todavia, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não incide imposto sobre a renda em relação às referidas subvenções, sendo que a incidência de imposto de renda sobre as subvenções ou incentivos fiscais concedidos pelos Estados ou Distrito Federal "leva ao esvaziamento ou redução do incentivo fiscal legitimamente outorgado pelo ente federativo, em especial porque fundamentado exclusivamente em atos infralegais, consoante declinado pela própria autoridade coatora nas informações prestadas", bem como ressalta que "[n]ão está em xeque a competência da União para tributar a renda ou o lucro, mas, sim, a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-constitucionais inerentes à organicidade do princípio federativo, e em atrito com o princípio da subsidiariedade, que reveste e protege a autonomia dos entes federados"4.
Em que pese os precedentes do STJ serem referentes a pessoas jurídicas, a própria Corte Superior já equipara os delegatários de serventias extrajudiciais a sociedades empresárias para fins tributários, devendo prevalecer a mesma ratio.
Por todo o exposto, as subvenções recebidas pela prática de atos gratuitos, apesar de comporem a receita dos registradores civis das pessoas naturais, não estão submetidas à incidência do imposto sobre a renda, tendo em vista que a União Federal estaria invadindo a competência tributária dos Estados e Distrito Federal na fixação do valor dos emolumentos.
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1. REsp 1328384/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 04/02/2013, DJe 29/05/13
2. Rp 1094, Relator(a): SOARES MUNOZ, Relator(a) p/ Acórdão: MOREIRA ALVES, Tribunal Pleno, julgado em 08/08/1984, DJ 04-09-1992 PP-14090 EMENT VOL-01674-03 PP-00532 RTJ VOL-00141-02 PP-00430
3. Lei Federal 4.320/64:
"Art. 12. A despesa será classificada nas seguintes categorias econômicas:
(...)
§ 3º Consideram-se subvenções, para os efeitos desta lei, as transferências destinadas a cobrir despesas de custeio das entidades beneficiadas, distinguindo-se como:
I - subvenções sociais, as que se destinem a instituições públicas ou privadas de caráter assistencial ou cultural, sem finalidade lucrativa;
II - subvenções econômicas, as que se destinem a empresas públicas ou privadas de caráter industrial, comercial, agrícola ou pastoril".
4. EREsp 1517492/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, Rel. p/ Acórdão Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 8/11/17, DJe 1/2/18