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Por um instrumento de defesa da segurança nacional

A revisão dos crimes políticos na legislação brasileira não pode se dar a todo custo como desejam alguns.

segunda-feira, 26 de abril de 2021

Atualizado às 17:39

A segurança nacional é a próxima vítima do surto neoconstitucionalista brasileiro, que mais uma vez conta com suporte institucional suficiente para agradar suas tentações. Aparentemente, quanto mais fraca e estéril for a legislação de crimes políticos, mais seguras estarão as instituições e a ordem comum que ela se destina a proteger.

A aplicação desmedida e inconsequente da Lei de Segurança Nacional é um dos traços que singularizam a passagem de Jair Bolsonaro pela presidência da República. O que deveria ser um instrumento excepcional foi pervertido em um petrecho de intimidação e a comunidade jurídica não deixou por isso.

O descontentamento com a LSN, avivado pelas ações do governo federal, não é de todo recente. Seria demais esperar que os operadores do direito transigissem mansamente com dispositivos concebidos durante os anos obscuros do regime militar de 1964 para limitar o exercício de liberdades cívicas tão vitais à nossa ordem constitucional. A estranheza com a coexistência da lei de segurança nacional e da Constituição de 88 não é injustificada.

Entretanto, a mais tímida leitura do seu conteúdo é capaz de demonstrar que sua vocação não é outra que não a salvaguarda do Estado e da população contra ameaças internas, universal a qualquer corpo político soberano estabelecido sobre um território e uma população. Ainda que uma porção substancial do seu texto mereça ser reformada, especialmente no que interessa aos seus elementos procedimentais, não há nada tão reprovável em suas tipificações ou em sua finalidade que legitime a sua eliminação.

Malgrado a relutância de alguns entusiastas dessa cruzada medonha, a origem, histórica como doutrinária, da lei de segurança nacional não é suficiente para afastar a sua validade. Apesar dos seus artesãos, o texto declara expressamente seu compromisso com o Estado de direito e o livre debate de doutrinas quaisquer, o que suplanta por si só qualquer alusão a resquícios autoritários em sua redação.

Do ponto de vista doutrinário, o conceito de segurança nacional forjado pela Escola Superior de Guerra não reproduz senão primados inseparáveis de qualquer organismo soberano. Na tradução do seu principal exegeta e patrono da ESG, a segurança nacional não é outra coisa que não

Um grau relativo de garantia que, por meio de ações políticas (internas e externas), econômicas, psicossociais (inclusive atividades científicas), e militares, um Estado proporciona à coletividade que jurisdiciona, para a consecução e salvaguarda de seus Objetivos Nacionais, a despeito dos antagonismos existentes. 

A defesa da segurança nacional não tem um credo político de preferência. Manifestações de hostilidade contra as instituições do Estado e a ordem comum devem ser vigorosamente punidas independentemente dos seus destinatários e não é outra a função da LSN. Quando a validade de um instrumento impreterível é contestada, a prudência inclina para o seu aperfeiçoamento e não pela sua proscrição.

Ainda que se decida pela retirada integral do seu texto do direito brasileiro, o Estado precisará de calço jurídico para guarnecer sua autoridade contra perturbações internas, que hão de ocorrer com ou sem a LSN. É o que faz o PL 6764 que, ao revogar a lei de segurança nacional, não deixa o Estado inerme diante das ameaças que aquela vinha combater e é, de todos os atos empreendidos para flanquear a LSN, o mais sensato.

Essas observações são esmiuçadas com mais vagar no draft em meu perfil no Academia.edu, no qual eu visito as raízes teóricas e políticas da LSN e analiso suas críticas mais recorrentes, além de dedicar especial atenção aos fundamentos veiculados em dois dos atos mais peculiares dessa controvérsia: a ADPF 799 e o PL 3.862/20(Lei de defesa do Estado democrático de direito). Gostaria de divulgá-lo quando já estivesse solenemente hospedado em algum periódico, mas a velocidade com que os fatos têm se desdobrado não me permitem o luxo de esperar.

A publicação do substitutivo ao mencionado PL 6.764 que está sendo preparado pela relatora Margarete Coelho será o próximo capítulo da saga histórica que testemunhamos.

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TÁVORA, Juarez. A Segurança Nacional e a ESG. ESG: C 01-54, 1954.

Pedro Merheb

Pedro Merheb

Integra o grupo de pesquisa de História Constitucional no Brasil República do IDP. Colaborador no Conselho Nacional do Ministério Público.

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