Disputas societárias em empresas familiares de pequeno porte
Não é novidade que as pequenas e médias empresas familiares possuem enorme importância na composição da atividade econômica brasileira.
quarta-feira, 14 de abril de 2021
Atualizado às 07:41
A falta de previsão de mecanismos para solucionar disputas societárias com frequência acaba causando o fechamento da empresa e graves rupturas de laços familiares.
Não é novidade que as pequenas e médias empresas familiares possuem enorme importância na composição da atividade econômica brasileira.
CENÁRIO BRASILEIRO
Apenas para ilustrar, de acordo com dados do IBGE, existiam no Brasil, conforme levantamento de 2015, 4.552.431 (quatro milhões quinhentos e cinquenta e dois mil quatrocentas e trinta e uma) empresas, em sua grande maioria, (69,8%) conforme dados do Departamento de Registro Empresarial e Integração "DREI", do tipo limitada, sendo 90% delas de perfil familiar.
E dentre as sociedades limitadas, estima-se que em mais de 90% delas o quadro societário seja formado por dois ou três sócios, conforme aponta estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas denominado "Radiografia das Sociedades Limitadas".
Ainda segundo o mesmo estudo, quase 90% das sociedades limitadas possuem capital inferior a 50 mil reais e mais da metade delas são microempresas com receita bruta anual inferior a R$360.000,00 mil
Em outras palavras, fica fácil perceber que a grande maioria das empresas no Brasil não apenas possuem caráter familiar, mas que são de pequeno porte e formadas por menos de três sócios, características que costumam gerar uma "tempestade perfeita" para disputas societárias.
Neste tipo de empresa, tipicamente, inexistem regras de governança corporativa para impedir que as disputas societárias atinjam diretamente a operação da empresa, muitas vezes causando sua falência.
Os laços familiares que antes serviam para unir os sócios e fixar o propósito da empresa geram uma enorme carga emocional que degrada rapidamente o ambiente da empresa e o equilíbrio psicológico dos envolvidos.
Para piorar, raramente o contrato social destas empresas prevê de forma clara como os impasses societários devem ser resolvidos (deadlock provisions) e qual valor deve ser pago caso um dos sócios deseje sair da sociedade trazendo para a mesa de negociação graves pontos de discórdia, muitas vezes solucionáveis apenas na via judicial.
ACORDO DE COTISTAS
Por essa razão é primordial que os sócios planejem previamente como os potenciais conflitos entre si devem ser resolvidos de forma célere e sem impactar o futuro da empresa, o que geralmente é feito através de um compilado de regras chamado "acordo de quotistas", no qual podem ser criadas:
(I) regras de administração
(II) formas de solucionar impasses entre os sócios
(III) regras de avaliação da empresa
(IV) regras em caso de falecimento
(V) regras para lidar com as relações com parentes e herdeiros etc.
(VI) regras para distribuição dos lucros dentre outros.
É também fundamental que os sócios busquem assessoria de profissionais acostumados a lidar com as peculiaridades destas empresas familiares, até porque as regras estabelecidas pelo Código Civil para quóruns de votação, regras de exclusão de sócio e regras de avaliação das quotas podem variar conforme o tipo societário, o número de sócios e as previsões estabelecidas no contrato social.
Um exemplo disto é a possibilidade que a lei dá ao sócio majoritário, em sociedades com apenas 2 titulares, de excluir o sócio minoritário por justa causa, mediante simples alteração do contrato social, sem convocar assembleia ou dar direito de defesa, quando o contrato social assim permitir.
Portanto, o melhor momento para equacionar possíveis impasses entre os sócios é antes deles acontecerem. E a lei, como visto, permite que isso seja feito através de regras criadas pelos próprios sócios em um acordo de quotistas. Ter esse documento no momento certo pode ser a diferença entre uma empresa de sucesso ou um negócio falido, com relações familiares despedaçadas.
Paulo André M. Pedrosa
Advogado, sócio do escritório Battaglia & Pedrosa Advogados. Graduado no Mackenzie. Mestre em Direito Societário pelo INSPER. Especialista em Processo Civil pela PUC/SP. Mestrando em Direito dos Negócios pela FGV/SP.