O processo de Frei Galvão
Em dezembro último, o Sumo Pontífice da Igreja Católica Apostólica Romana decidiu, mediante decreto, em processo formal junto à Congregação das Causas dos Santos, aprovar a canonização do primeiro santo genuinamente brasileiro: Frei Galvão, nascido em Guaratinguetá, São Paulo, no ano de 1739.
segunda-feira, 15 de janeiro de 2007
Atualizado em 12 de janeiro de 2007 11:06
Francisco de Assis Chagas de Mello e Silva*
Em dezembro último, o Sumo Pontífice da Igreja Católica Apostólica Romana decidiu, mediante decreto, em processo formal junto à Congregação das Causas dos Santos, aprovar a canonização do primeiro santo genuinamente brasileiro: Frei Galvão, nascido em Guaratinguetá, São Paulo, no ano de 1739.
Resta, ainda, para homologação definitiva do processo, que seja ele convalidado
A iniciativa do apelo sugere ação tresloucada. Eis que se presume a infalibilidade do Chefe da Igreja Católica em casos dessa natureza e o Brasil há muito anseia para que um filho seu seja venerado nos altares das casas do Senhor.
A par disso, Frei Galvão foi um proeminente representante da Igreja nestas paragens: fundou o Mosteiro da Imaculada Conceição da Luz e distinguiu-se como homem de paz, piedade e conselheiro dos aflitos, inclusive percorrendo a pé grandes distâncias para confortar os fiéis.
Entretanto, os dois milagres que lhe são atribuídos e constituem imperativa condição para a sua canonização não atendem, com a máxima vênia, os princípios rigorosos e elementares para assim caracterizá-los. O primeiro, a cura de uma hepatite gravíssima em uma criança, valeu-lhe a beatificação em 1998; o segundo, o parto bem sucedido de uma devota com má formação do útero, propiciou o decreto de canonização.
Ocorre que a despeito das surpreendentes e auspiciosas curas, ambos os casos foram submetidos a tratamento médico de última geração.
Ora, na contramão do ditado popular da mulher de César, o milagre não deve ser só aparente, mas deve, sim, ser milagre.
Além disso, é sabido que o Papa João Paulo II repetia à exaustão que o Brasil precisava de santos. Aliás, no seu papado, ele bateu todos os recordes de canonização: quase quinhentos em 25 anos. Para que se tenha uma idéia do que significam estes números basta tomar ciência de que após a criação da Congregação dos Ritos (antigo nome da atual Congregação da Causa dos Santos) em 1588 por Sixto V, o Papa João Paulo II canonizou mais gente do que todos os outros 263 papas juntos.
Agora, com a proximidade do Conselho Episcopal Latino-americano a ser realizado em maio no Brasil, na Igreja de Nossa Senhora de Aparecida, e a postulação, também em maio do ano passado, dos bispos presentes à 44ª Assembléia Geral da CNBB para que fossem acelerados os processos de santificação do nosso país, o Vaticano corre , em visível açodamento, para atender à reivindicação dos príncipes da Igreja do Brasil e anunciar, oficialmente, naquela Basílica, a santidade de Frei Galvão.
Temo, todavia, que a precipitação em apreço possa trazer menores louvores para a Igreja e maiores descréditos para os católicos brasileiros face à desconfiança descortinada pela banalização dos ritos de consagração das santidades.
É fato que o país vive um momento de muitas carências: não temos santos, não temos assento permanente na ONU, somos ignorados pelos ricos e famosos, jamais ganhamos o Prêmio Nobel e até mesmo o Oscar.
Seja como for, não precisamos de um santo brasileiro a qualquer custo.
Contudo, prevalecendo o entendimento contrário e tendo em mira a atual flexibilização de normas rígidas seculares, ouso propor, democraticamente, para análise das autoridades eclesiásticas, especialmente a Colenda Congregação da Causa dos Santos, as candidaturas do seringueiro Chico Mendes, natural do Acre, do advogado Sobral Pinto, natural de Minas Gerais e do arcebispo Dom Hélder Câmara, natural do Ceará.
Todos os três fizeram na terra o trabalho de Deus. Todos dedicaram suas vidas ao amor pelo próximo. Embora não tenham curado as mazelas do corpo humano após a sua morte ou mesmo antes dela, o exemplo da sua conduta permanece produzindo milagres em profusão mediante a purificação de milhares de almas de seus seguidores que rejeitaram a delícia das facilidades e adotaram a retidão do caminho torto e penoso desse mundo em benefício do outro.
A propósito, não me atrevo a unir àquele grupo o sociólogo Betinho porque suponho que não acreditava em Deus, mas me atrevo a olhar para o céu e lá vislumbrar a sua presença.
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