Aspectos gerais da nova Lei de Licitações - Lei 14.133/21
O fundamental é a familiarização com os principais dispositivos da lei que será, mais cedo ou mais tarde, sobretudo depois da regulamentação, amplamente utilizada pela Administração Pública em suas diferentes esferas.
sexta-feira, 9 de abril de 2021
Atualizado às 12:39
Foi sancionada, no último dia 1º de abril de 2021, a nova Lei de Licitações - lei 14.133. No presente artigo, a Área de Direito Administrativo de Trigueiro Fontes Advogados tem por objetivo principal apresentar os principais dispositivos da nova lei relacionados às licitações em geral, sem a pretensão de aprofundamento nos temas neles contemplados (outros escritos sobre a norma abordarão aspectos específicos de forma detalhada). Por ora, o fundamental é a familiarização com os principais dispositivos da lei que será, mais cedo ou mais tarde, sobretudo depois da regulamentação, amplamente utilizada pela Administração Pública em suas diferentes esferas.
Em seu artigo 5º, a lei faz referência expressa aos seguintes princípios: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, interesse público, probidade administrativa, igualdade, planejamento, transparência, eficácia, segregação de funções, motivação, vinculação ao edital, julgamento objetivo, segurança jurídica, razoabilidade, da competitividade, da proporcionalidade, da celeridade, da economicidade e do desenvolvimento nacional sustentável. Chama a atenção a referência ao planejamento, noção que será retomada em outros trechos da norma, conforme será destacado a seguir.
O artigo de número 12 prevê, em seu inciso VII, a possibilidade de que os órgãos responsáveis justamente pelo planejamento de cada ente federativo possam elaborar o plano anual de contratações. Tal plano, se bem elaborado, terá o objetivo de racionalizar as contratações permitindo, inclusive, a preparação do setor privado para atendimento das demandas advindas da Administração Pública.
Realça-se o artigo 17 ao estabelecer que o processo de licitação observará as seguintes fases, em sequência: I - preparatória; II - de divulgação do edital de licitação; III - de apresentação de propostas e lances, quando for o caso; IV - de julgamento; V - de habilitação; VI - recursal; VII - de homologação. A despeito da sequência acima apresentada - que deverá ser a regra geral -, a fase de habilitação poderá, mediante ato motivado, excepcionalmente, anteceder as fases de apresentação de propostas e lances e de julgamento, desde que expressamente previsto no edital de licitação.
Como forma de maximizar a eficiência, ganha ênfase a necessidade de que cada contratação seja fundamentada em estudo técnico preliminar que caracterize o interesse público envolvido (artigo 18, inciso I). O referido estudo técnico deverá evidenciar o problema a ser resolvido e a sua melhor solução, de modo a permitir a avaliação da viabilidade técnica e econômica da contratação.
Importante o incentivo à prévia participação social ao se prever a possibilidade de que seja convocada audiência pública sobre eventual licitação que se pretenda realizar, inclusive com disponibilização prévia do estudo técnico preliminar para discussão. No mesmo sentido, a licitação poderá ser submetida a prévia consulta pública.
Com o intuito de conferir segurança jurídica às partes contratantes, é de fundamental importância a previsão contida no artigo 22 de acordo com a qual, quando necessário, seja contemplada, no instrumento convocatório, a matriz de riscos. O documento tem por finalidade principal a de fixar a alocação eficiente dos riscos de cada contrato e estabelecer, previamente, a responsabilidade de cada parte contratante, bem como os mecanismos que afastem a ocorrência do sinistro e mitiguem os seus efeitos, caso este ocorra durante a execução contratual. A matriz de risco está diretamente relacionada à busca constante de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro de cada contrato, aspecto imprescindível para uma justa e contínua relação entre setores público e privado.
O setor privado deverá estar atento às disposições da lei 14.133/21 tratando de sobrepreço. Exige o artigo 23 que o valor previamente estimado da contratação deverá ser compatível com os valores praticados pelo mercado, considerados os preços constantes de bancos de dados públicos e as quantidades a serem contratadas, observadas a potencial economia de escala e as peculiaridades do local de execução do objeto. Como parâmetros para fixação do valor estimado de cada contratação, a norma exige que seja observado, dentre outros, os seguintes parâmetros: I - composição de custos unitários menores ou iguais à mediana do item correspondente no painel para consulta de preços ou no banco de preços em saúde disponíveis no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP); II - contratações similares feitas pela Administração Pública, em execução ou concluídas no período de 1 (um) ano anterior à data da pesquisa de preços; III - utilização de dados de pesquisa publicada em mídia especializada; IV - pesquisa direta com no mínimo 3 (três) fornecedores, mediante solicitação formal de cotação;
Especificamente quanto às contratações diretas por inexigibilidade ou por dispensa de licitação, será ônus do contratado comprovar previamente que os preços cotados estão em conformidade com os praticados em contratações semelhantes de objetos de mesma natureza, por meio da apresentação de notas fiscais emitidas para outros contratantes no período de até 1 (um) ano anterior à data da contratação pela Administração, ou por outro meio idôneo.
Sob a ótica de compliance, destaca-se o teor do artigo 25, § 4ª, ao estabelecer que, nas contratações de obras, serviços e fornecimentos de grande vulto, o edital deverá prever a obrigatoriedade de implantação de programa de integridade pelo licitante vencedor, no prazo de 6 (seis) meses, contado da celebração do contrato.
A margem de preferência prevista no artigo 26 que, na prática, beneficiará empresas brasileiras, carece de regulamentação e deve ser apreciada com cautela. Por um lado, poderá efetivamente estimular a produção de bens e serviços nacionais. Por outro lado, poderá onerar mais a Administração Pública e reduzir a competitividade dos certames.
O artigo 28 fixa, como modalidades de licitação, as seguintes: I - pregão; II - concorrência; III - concurso; IV - leilão; V - diálogo competitivo. Na prática, o pregão, que era objeto da lei 10.520, de 17 de julho de 2002, foi incorporado à nova Lei de Licitações que, aliás, revoga, expressamente, a então Lei do Pregão. No mais, destaca-se a extinção da tomada de preços do convite e a criação do diálogo competitivo. Foge ao escopo do presente artigo um detalhamento sobre o tema, mas o diálogo competitivo consiste em modalidade restrita a contratações relativas, essencialmente, (I) a inovação tecnológica ou técnica; (II) nas hipóteses em que haja necessidade de adaptação de soluções disponíveis no mercado; e (III) sempre que houver impossibilidade de as especificações técnicas serem definidas com precisão suficiente pela Administração.
Os critérios de julgamento fixados na nova norma são: I - menor preço; II - maior desconto; III - melhor técnica ou conteúdo artístico; IV - técnica e preço; V - maior lance, no caso de leilão; VI - maior retorno econômico. Destaca-se a previsão do maior retorno econômico atrelado, exclusivamente, para a celebração de contratos de eficiência, considerando-se a maior economia para a Administração Pública. Em tal hipótese, a remuneração do particular será fixada em percentual proporcional à economia gerada a partir da execução do contrato.
Especificamente quanto às propostas apresentadas pelos licitantes, a lei 14.133/21 prevê a desclassificação das propostas que: I - contiverem vícios insanáveis; II - não obedecerem às especificações técnicas pormenorizadas no edital; III - apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação; IV - não tiverem sua exequibilidade demonstrada, quando exigido pela Administração; V - apresentarem desconformidade com quaisquer outras exigências do edital, desde que insanável.
Interessante registrar, sob a ótica da economicidade, que, uma vez definido o resultado do julgamento, a Administração Pública poderá negociar condições mais vantajosas com o primeiro colocado.
Quanto à habilitação, fase crucial das licitações, os documentos a serem exigidos dos licitantes dividem-se nos seguintes grupos de habilitação: I - jurídica; II - técnica; III - fiscal, social e trabalhista; IV - econômico-financeira. Conforme previsto no artigo 64, após a entrega dos documentos para habilitação, apenas será permitida a substituição ou a apresentação de novos documentos para complementação de informações acerca dos documentos já apresentados ou para atualização de documentos cuja validade tenha expirado após a data de recebimento das propostas. Sobre o tema, especificamente quanto às empresas criadas no exercício financeiro da licitação, estão autorizadas a substituir os demonstrativos contábeis pelo balanço de abertura.
Conforme fixado pelo artigo 71, uma vez encerradas as fases de julgamento e habilitação, e exauridos os recursos administrativos, o processo licitatório será encaminhado à autoridade superior que poderá: I - determinar o retorno dos autos para saneamento de irregularidades; II - revogar a licitação por motivo de conveniência e oportunidade; III - proceder à anulação da licitação, de ofício ou mediante provocação de terceiros, sempre que presente ilegalidade insanável; ou IV - adjudicar o objeto e homologar a licitação.
Como procedimentos auxiliares às licitações e contratações, estão previstos os seguintes (artigo 78): I - credenciamento; II - pré-qualificação; III - procedimento de manifestação de interesse; IV - sistema de registro de preços; V - registro cadastral. Destaca-se a pré-qualificação como procedimento técnico-administrativo para selecionar licitantes que, basicamente, reúnam condições de habilitação para participar de futura licitação ou bens que atendam às exigências técnicas ou de qualidade estabelecidas pela Administração. Ressalta-se, ainda, o Procedimento de Manifestação de Interesse de acordo com o qual a Administração Pública poderá solicitar à iniciativa privada a propositura e a realização de estudos e projetos de soluções inovadoras que contribuam com questões de relevância pública.
Especificamente quanto ao Sistema de Registro de Preços (SRP), a nova Lei de Licitações a aborda o tema prevendo, dentre outras questões, a possibilidade de que sejam previstos preços diferentes (I) quando o objeto for realizado ou entregue em locais diferentes; (II) em razão da forma e do local de acondicionamento; (III) quando admitida cotação variável em razão do tamanho do lote; ou, ainda (IV) por outros motivos justificados no processo.
Pois bem. Como já mencionado, outros escritos serão desenvolvidos e divulgados sobre a nova Lei de Licitações abordando temas específicos de forma detalhada.
Rodrigo da Fonseca Chauvet
Sócio advogado do escritório Trigueiro Fontes Advogados.
Mariana Vianna Martinelli
Advogada do escritório Trigueiro Fontes Advogados.
Ivana Eduarda Dias Arantes
Advogada do escritório Trigueiro Fontes Advogados.