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Atual lacuna do CDC sobre o conceito de produto essencial abre espaço para discussões e inovações legislativas

Assim como no caso do CDC paulistano, a lei estadual 4.878 de Rondônia causa polêmicas no meio jurídico.

terça-feira, 6 de abril de 2021

Atualizado às 12:34

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)
 

O governador Marcos José Rocha do Santos promulgou, em 27/10/20, a lei estadual de 4.878 que dispõe, especificamente, sobre os produtos essenciais de que trata o Código de Defesa do Consumidor em seu art. 18, § 3º. 

A lei que já está em vigor desde janeiro de 2021, aborda a possibilidade de que o consumidor, sempre que o produto for reconhecido pela norma estadual como essencial, faça o uso imediato das alternativas tratadas no § 1º do art. 18 do CDC.

Em vista disso, entendendo o consumidor rondoniense que o produto adquirido esteja acometido por vício de fabricação, ele poderá utilizar imediatamente de uma das hipóteses estipuladas pela norma consumerista - substituição, restituição ou abatimento do preço -, caso o bem esteja classificado como essencial pela lei estadual, que assim dispõe:

Art. 1°. Fica entendido como produto essencial, para fins do § 3º art. 18 da lei federal 8.078, de 11 de setembro de 1990, aquele cuja demora no reparo prejudique significativamente, as atividades diárias do consumidor e o atendimento de suas necessidades básicas, sendo, entre outros:

I - geladeira;

II - fogão;

III - máquina de lavar roupa;

IV - cama e/ou colchão;

V - celular;

VI - computador pessoal; e

VII - equipamento para tratamento médico.

Apesar da novidade, a norma em análise estabelece que, ainda que o produto seja considerado como essencial, o consumidor só terá o direito de escolha imediata caso o produto viciado esteja dentro do prazo da garantia legal, tratado no art. 26 do CDC.

Assim, considerando a listagem dos produtos essenciais ditados pela legislação estadual, o consumidor terá, a partir do recebimento, 90 (noventa) dias para reclamar de problemas com o produto.

Num parêntesis, salienta-se que no caso de um vício oculto - aquele defeito que só aparece depois de um certo tempo de uso do produto -, o prazo da garantia legal se iniciará a partir do momento em que este defeito é verificado.

Outra grande polêmica relacionada a norma envolve a aplicação de multa de até 41 (quarenta e um) UPF's por autuação da empresa, a ser aplicada pelos Órgãos de defesa do consumidor e revertida ao Fundo Estadual de Defesa do Consumidor - FUNDEC.

Neste ponto, vale ressaltar que o Governo de Rondônia, por meio da Secretaria de Estado de Finanças, divulgou o valor da Unidade Padrão Fiscal de Rondônia (UPF/RO) para o ano de 2021, atingindo a quantia de R$ 92,54 (noventa e dois reais e cinquenta e quatro centavos).

Tal possibilidade, entretanto, abre espaço para a aplicação de penalidade dupla sobre o mesmo fato gerador, tendo em vista que a Superintendência Estadual, por meio do Procon, já realiza a fiscalização e aplica multas pecuniárias em caso de infrações cometidas contra o direito do consumidor.

Não bastasse o ponto tratado acima, a determinação de troca imediata acabaria por prejudicar na análise, por parte da fabricante do produto, de eventual conduta do consumidor que possa ser caracterizada como excludente de responsabilidade daquela.

Conforme assim prevê o Princípio Constitucional do Contraditório e da Ampla Defesa, ainda que o Procon sirva para proteger os direitos do consumidor, é indiscutível que, mesmo assim, não se pode tomar toda e qualquer reclamação registrada como verdadeira sem a devida apuração da realidade dos fatos.

A lei estadual, entretanto, já é o objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) 6.665, de autoria da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) e distribuída ao ministro Marco Aurélio.

Segundo a Abinee a Assembleia Legislativa de Rondônia, ao promulgar norma que vai de encontro ao que prevê o CDC sobre o prazo de 30 dias para substituição, restituição ou abatimento do preço do produto viciado, extrapolou sua competência legislativa concorrente prevista pelo art. 24, incisos V e VIII, da Constituição Federal.

Sobre o tema em análise, é importante destacar a tramitação do projeto de lei 3.256/19, de iniciativa do senador Ciro Nogueira, que propõe a alteração do Código de Defesa do Consumidor, para definir os produtos essenciais sobre os quais os fornecedores não têm o direito ao prazo de 30 dias para sanar vícios.

O projeto de lei federal, ao contrário da lei rondoniense, é mais ampliativo ao considerar como produto essencial aquele cuja demora para ser reparado prejudique significativamente as atividades diárias do consumidor e o atendimento de suas necessidades básicas.

Além disso, propõe que os produtos utilizados como instrumento de trabalho, estudo, auxílio à locomoção, comunicação, audição ou visão, assim como aqueles destinados a atender as necessidades de pessoas com deficiência devem ser considerados essenciais.

A grande questão, portanto, se dá pela ausência de determinação do que seria o produto essencial elencado pelo CDC em seu art. 18, § 3º, porém, ainda que esta definição ainda seja analisa de caso a caso, alguns produtos e serviços já possuem jurisprudência consolidada acerca de sua essencialidade, tais como alimentos, medicamentos, fornecimento de água, energia elétrica e serviços de telecomunicações.

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RONDÔNIA. Lei 4.878.105, de 27 de outubro de 2020. Disponível aqui. Acesso em: 16 mar. 2021

BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990. Disponível aqui. Acesso em 16 mar. 2021

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Mariângela Silveira Menezes

Mariângela Silveira Menezes

Advogada da equipe de Direito Consumerista do Vilas Boas Lopes e Frattari Advogados.

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