Novo provimento da OAB sobre Marketing Jurídico: Muitas dúvidas!
Continuando a nossa árdua missão de analisar, elogiar e tecer críticas sobre a minuta do novo provimento da OAB sobre a Publicidade na Advocacia que irá substituir o provimento 94/20.
terça-feira, 30 de março de 2021
Atualizado às 12:18
Neste texto iremos analisar o artigo 5º da minuta do novo provimento que diz:
Art. 5º A publicidade profissional permite a utilização de anúncios, pagos ou não, nos meios de comunicação não vedados pelo Art. 40 do Código de Ética e Disciplina.
Lembremos dos meios vedados pelo art. 40 do CED: rádio, cinema e televisão... outdoors, painéis luminosos ou formas assemelhadas... muros, paredes, veículos, elevadores ou em qualquer espaço público ... a utilização de mala direta, a distribuição de panfletos ou formas assemelhadas de publicidade, com o intuito de captação de clientela...
O caput do artigo 5º é muito interessante, pois ele se abstém de fazer vedações aos meios e apenas reafirma a observância do que já não é permitido pelo CED. Desta maneira, este artigo segue a linha do artigo 1º da minuta, que prevê a obediência ao Código de Ética e Disciplina da OAB.
De maneira bem simplista, a OAB está liberando aquilo que nunca foi proibido. Se desde muito tempo atrás já era usual e nada discutido o pagamento de anúncios nas páginas amarelas das listas telefônicas para a divulgação de escritórios de advocacia, agora, com este artigo, o impulsionamento/patrocínio nas redes sociais e a utilização do Google Ads ficam liberados. Sendo assim, extinguimos as batalhas travadas em razão de anúncios em redes sociais, Google e seus parceiros. Batalhas estas, que geraram orientações expressas em algumas Seccionais contra a utilização de anúncios pagos.
Entretanto, nos anexos, foram feitas ressalvas à utilização de anúncios no Google Ads e demais redes sociais. Estes são os pontos que merecem uma análise mais profunda.
Anexos:
Google Ads |
Permitida a utilização do Google Ads quando responsivo a uma busca iniciada pelo potencial cliente e desde que as palavras selecionadas estejam em consonância com ditames éticos. Proibido o uso de anúncios ostensivos no youtube chamados "Bumper Ads", "Non-Skippable Ads" ou similares que obrigam o usuário a assistir vídeos não desejados. |
Patrocínio e impulsionamento nas redes sociais |
Permitido, desde que não se trate de publicidade contendo oferta de serviços jurídicos. |
No que tange ao Google Ads a intenção nos parece que foi separar a publicidade ativa da passiva, conceitos já debatidos em nosso primeiro artigo sobre o tema. Ou seja, pode usar o Ads de expressões/textos, que é uma das formas de caracterizar a publicidade definida como passiva, mas não pode o Ads de vídeos no YouTube, pois eles são exemplo de publicidade ativa, direcionados a um público que não tinha intenção de vê-los.
Já os anúncios nas redes sociais, denominados de patrocínio ou impulsionamento, estão liberados em qualquer formato, desde que não contenham oferta de serviços. O que acaba por reafirmar o artigo 7º, que libera na publicidade passiva a oferta de serviços jurídicos e nos leva a entender que a interpretação sobre as redes sociais como Instagram, Facebook e LinkedIn é que realizam a publicidade ativa, logo, não poderia ser feita a oferta de serviços.
Ora, se a intenção no item Google Ads era limitar a ação da publicidade ativa (não solicitada/desejada), por qual motivo nas demais redes sociais esta barreira não foi levantada?
Vamos supor a elaboração de um vídeo institucional, sem a oferta de serviços, mas apenas para fortalecimento da marca. Este mesmo vídeo pode ser patrocinado numa rede social como o Instagram e com isso ostensivamente passar no feed daquela rede, mas não pode ser anunciado no Ads para ser exibido no YouTube? Por quê? Qual é a diferença?
Os algoritmos usados em ambos os meios para selecionarem quais vídeos patrocinados serão exibidos para os expectadores são tão distintos que justificam este tratamento tão desigual? Ainda pensando na justificativa dos algoritmos, eles são atualizados insistentemente para melhorar a experiência do cliente, logo, se possuem diferenças hoje que justifiquem tal desigualdade, amanhã podem ser muito parecidos e não justificarem mais. E aí, o que faremos com esta separação em relação às redes sociais e Ads de vídeos no YouTube? Esperamos que o Comitê Regulador de Marketing acompanhe a atualização dos algoritmos para retificar o anexo?
Notem, fiz apenas uma suposição sobre a diferenciação dos algoritmos, embora eu acredite que eles tenham a mesma base de raciocínio para atuarem na entrega de vídeos de anúncio, ou seja, nem hoje haveria esta justificativa, a meu ver.
Outro ponto: a ostensividade dos anúncios é bastante similar, haja vista que dependem de algoritmos e de configurações de interesse de público na configuração do anúncio, que, aliás, podem ser completamente desconhecidos pelos advogados que operam tais ferramentas.
Mais um item a ser analisado é que os vídeos de anúncio podem ser divulgados em sites parceiros da Google e não somente no YouTube. Pelo texto, nestes sites parceiros o anúncio de vídeos pelo Google Ads estaria liberado?
Ainda precisamos considerar que o Google Ads possui uma terceira forma de divulgação, os banners, que não foram mencionados e que se assemelham mais aos vídeos do que às expressões de texto. Qual seria o tratamento deles? E se os banners forem exibidos em sites parceiros e não no YouTube, podem ser usados?
Há uma tecla que pessoalmente tenho batido insistentemente em todos os fóruns de discussão que participo sobre este tema, eu realmente penso que os meios não podem ser usados como base para a nova norma, mas somente o conteúdo.
Sendo assim, não interessa se é Ads no YouTube, em parceiros do Google ou vídeo no feed do Instagram, mas sim o que eles estão divulgando. Em um futuro próximo pode ser que lembremos de YouTube e Instagram da mesma maneira que recordamos hoje do Orkut, aliás, é possível que tenhamos outros meios de comunicação bem mais disruptivos e que nem imaginamos que poderão existir. Se isso acontecer, apostaremos que o Comitê Regulador de Marketing atualizará o anexo com a celeridade necessária? Ou aguardaremos por um novo provimento daqui 20 anos?
Precisamos definir:
Pode ou não pode haver anúncio pago em meios não proibidos pelo CED?
Eles podem ou não fazer oferta de serviços jurídicos?
A oferta está restrita somente à publicidade passiva?
Mais um ponto a ser considerado sobre a última questão:
No Instagram, por exemplo, existe um local onde é possível que qualquer usuário defina suas preferências de tópicos de anúncios. Vamos supor que teremos neste rol de tópicos a opção "serviços jurídicos" e que seja possível patrocinar um anúncio somente para quem tiver esta opção selecionada. Neste caso, quem a selecionasse poderia receber uma oferta de serviços, já que demonstrou interesse pela divulgação, logo seria publicidade passiva? Ou não, pois o anexo do provimento veda explicitamente a oferta de serviços jurídicos em redes sociais?
Acredito que o item do anexo que trata de patrocínio e impulsionamento nas redes sociais já nasceu para gerar discussões e necessidade de atuação do Comitê e isso não me parece fazer sentido diante de toda a expectativa que estamos em relação ao novo provimento.
Para continuar a análise do item do anexo sobre o Google Ads mencionado acima e seus impactos no artigo 5º, podemos ainda avaliar o trecho "obrigam o usuário a assistir vídeos não desejados.". Ora, ninguém é obrigado a nada em nenhuma rede social, nem no YouTube, que também é uma rede social e não compreendi por qual motivo está recebendo tratamento especial. Assim como no feed do Instagram, quando aparece um vídeo que você não deseja assistir, é possível rolar a tela para cima, em um vídeo no YouTube é possível passar de vídeo e não ver o anúncio.
Enfim, estou tentando entender os motivos do tratamento diferente e questionando os argumentos que poderiam ser dados.
Precisamos nos preocupar com O QUE e não com o ONDE, pois o "onde" vai sempre mudar.
A parte do anexo do Google Ads que diz "desde que as palavras selecionadas estejam em consonância com ditames éticos" é outra questão a ser debatida. A OAB pretende fiscalizar estas palavras/expressões configuradas no Ads? Como? Ou apenas agirá se for demandada em uma denúncia e neste caso solicitará os logs das configurações do anúncio para analisar se as palavras são éticas ou não? Os logs das configurações serão pedidos a quem e como deverão ser entregues para a OAB? Pontos para serem avaliados pela OAB e questionados por nós!
§ 1º É vedado o pagamento, patrocínio ou efetivação de qualquer outra despesa para viabilizar aparição em anuários, recebimento de premiações, prêmios ou qualquer tipo de evento ou lista que vise destacar ou eleger profissionais como detentores de destaque.
Anexo:
Anuários |
Somente é possível a participação em Anuários que indiquem, de forma clara e precisa, qual a metodologia de pesquisa ou de análise que justificou a inclusão de determinado escritório de advocacia na publicação, ou ainda que indiquem que se trata de mera compilação de advogados. É vedado o pagamento, patrocínio ou efetivação de qualquer outra despesa para viabilizar anúncios ou aparição em anuários. |
Este parágrafo e o anexo que tratam de anuários muito me alegram, pois é impressionante como surgem premiações e rankings sem nenhum tipo de critério e que vivem à base do "pagou, entrou".
Eu mesma, que embora advogada com OAB ativa, não tenho nenhum processo em meu nome, já fui convidada a participar de uma premiação como Advogada destaque em Direito Digital. Para aceitar o convite eu deveria fazer uma módica contribuição de X mil reais para ter meu nome na revista, poder participar do evento/jantar de premiação e receber uma plaquinha como prêmio à minha atuação. Pasmem!!
E a divulgação dos mais Admirados da Análise Advocacia e da Análise Advocacia Mulher, como fica?
Ao que tudo indica, os mais Admirados poderão ser mencionados sem problema algum, já que a Editora Análise não cobra dos advogados e escritórios para isso. Entretanto a parte comercializada pela Análise denominada Diretório é composta por anúncios pagos e, segundo consta expressamente no anexo, isso estaria proibido: "É vedado o pagamento, patrocínio ou efetivação de qualquer outra despesa para viabilizar anúncios..."
Por qual motivo um anuário estaria proibido e outra revista não? Por que não seria possível pagar um anúncio em um anuário que é visto por um público interessado no tema, mas nas redes sociais que é aberta a todo tipo de público e interesses seria permitido?
O que exatamente a OAB quer dizer com o caput do artigo 5º ao mencionar que os anúncios pagos em meios não vedados pelo CED serão permitidos se nos anexos incluiu os vídeos no YouTube e os Anuários como meios escolhidos para serem proibidos? Que critérios objetivos foram usados para pinçar estes 2 canais?
§ 2º É permitida a utilização de logomarca e imagens, inclusive fotos dos advogados e do escritório, assim como de uma identidade visual nos meios de comunicação profissional.
O parágrafo me agrada, pois acaba com as discussões acerca de fotografias e imagens. No entanto, o artigo 6º diz que "Fica vedada, na publicidade ativa, qualquer informação relativa às dimensões, qualidades ou estrutura física do escritório...". Acreditando que fotografias podem passar informações sobre a dimensão, qualidades e estrutura física do escritório, como fica a interpretação?
Só é possível usar fotografias que não demonstrem a dimensão, qualidades e estrutura física do escritório?
Só é possível usar fotografias em publicidade passiva (para quem a buscou)?
Houve aqui uma incoerência nas permissões do parágrafo 2º do artigo 5º e as proibições do artigo 6º?
Ou realmente teremos que nos preocupar com todos estes SEs?
Ainda tenho muitos outros questionamentos e reflexões sobre a minuta analisada e irei compartilhar minhas angústias e reconhecimentos de progresso em outros artigos em breve!
Até lá, fica uma dica de leitura sobre o marketing que é permitido e não é tema de discussão: meu livro "Marketing Estratégico para Advogados" da Editora Juruá.
Até breve!
Juliana Pacheco
Advogada, especialista em gestão legal com experiência de 20 anos na área, sócia-fundadora da JP Gestão Legal, fundadora do BuscaJur, autora do livro Marketing Estratégico para Advogados, membro Consultora da CEGEI - Comissão Especial de Gestão, Empreendedorismo e Inovação do Conselho Federal da OAB Nacional, membro do Conselho da Fenalaw 2018, 2019, 2020 e 2021.