A importância da aprovação anual de contas para sociedades empresárias e entidades sem fins lucrativos
Faz-se necessário destacar que a relevância do tema se justifica pois a aprovação de contas anual das sociedades e entidades serve como quitação pelos atos praticados por seus administradores e confere à pessoa jurídica adequação às normas vigentes.
quarta-feira, 24 de março de 2021
Atualizado às 12:30
É de rigor que as pessoas jurídicas de direito privado, com ou sem fins lucrativos, possuam um representante ou órgão responsável pela condução da administração das atividades empresariais ou sociais, tais como celebração de contratos e parcerias, representação perante órgãos públicos, poder judiciário, dentre outros.
Determina o ordenamento jurídico brasileiro que, ao menos uma vez por ano, os sócios/acionistas/associados das sociedades, associações e fundações se reúnam para tratar das atividades realizadas e seu planejamento, deliberar sobre a homologação das contas da administração, das demonstrações financeiras e da destinação do resultado do exercício social.
Considerando o previsto no artigo 1.078 do Código Civil e no artigo 132 da Lei das S.A., as reuniões ou assembleias gerais ordinárias devem realizar-se nos quatro meses seguintes ao término do exercício social. No Brasil, o término do exercício social geralmente coincide com o término do ano civil, de modo que a assembleia geral ordinária anual para aprovação de contas deverá ocorrer até 30 de abril de cada ano.
Faz-se necessário destacar que a relevância do tema se justifica pois a aprovação de contas anual das sociedades e entidades serve como quitação pelos atos praticados por seus administradores e confere à pessoa jurídica adequação às normas vigentes, o que pode ser um diferencial na hora de vender a sociedade, receber um investimento, contratar empréstimos ou obter concessões governamentais para parcerias público-privadas, entre outros.
Isto em razão de o artigo 1.016 do Código Civil determinar que "os administradores respondem solidariamente perante a sociedade e os terceiros prejudicados, por culpa no desempenho de suas funções". Deste modo, com a aprovação de contas sem reservas pela assembleia geral, os administradores ficam exonerados de responsabilidade perante a pessoa jurídica. Este, inclusive, é o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça1.
Assim sendo, é de extrema importância que sejam atendidas as previsões legais tanto em benefício das pessoas jurídicas como de seus administradores.
Sociedades limitadas
Nas sociedades limitadas é regra legal, disposta no artigo 1.078, § 1º do Código Civil, que o balanço patrimonial e a demonstração do resultado econômico sejam disponibilizados aos sócios não administradores até 30 dias da realização da reunião anual. Para deliberações na assembleia, deverá ser realizada a leitura do balanço patrimonial e da demonstração do resultado econômico, os quais serão submetidos, pelo presidente, à discussão e votação, nestas não podendo tomar parte os membros da administração e, se houver, os do conselho fiscal. A forma de votação deverá ser especificada em ata, a qual deverá ser registrada perante a Junta Comercial competente para que surta seus efeitos legais.
Merece destaque ainda que, por meio da Deliberação JUCESP 2/15, a Junta Comercial do Estado de São Paulo aplica o entendimento de que as sociedades de grande porte devem obrigatoriamente publicar o balanço anual e as demonstrações financeiras do último exercício, em jornal de grande circulação no local da sede da sociedade e no Diário Oficial do Estado, sob pena de indeferimento do registro da ata de reunião ou assembleia de sócios.
Para os fins legais, considera-se de grande porte, conforme dispõe a lei 11.638/07 em seu artigo 3º, a sociedade ou conjunto de sociedades que apresentar, no exercício social anterior, ativo total superior a R$ 240.000.000,00 (duzentos e quarenta milhões de reais) ou receita bruta anual superior a R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais).
Sociedade por ações
Nas sociedades por ações, os administradores devem comunicar, até 1 mês antes da data marcada para a realização da assembleia geral ordinária, por anúncios publicados por 3 vezes, no mínimo, que se acham à disposição as demonstrações financeiras na sede social, nos termos da o artigo 133 da Lei das S.A., e publicá-las com pelo menos 5 dias de antecedência da realização da AGO, conforme § 3º do dispositivo legal.
Ainda, os §§ 4º e 5º do citado artigo contemplam duas hipóteses em que as publicações nos prazos acima referidos serão dispensadas, quais sejam: (I) quando a assembleia geral ordinária reunir a totalidade dos acionistas; (art.133, § 4º); ou (II) quando a companhia publicar o balanço e demonstrações financeiras até 1 (um) mês antes da data marcada para a realização da assembleia geral ordinária (art.133, § 5º).
Não obstante a dispensa ao atendimento dos referidos prazos, destaca-se que a publicação do balanço e das demonstrações financeiras da companhia ainda deverá ser realizada antes da assembleia geral ordinária. Após, tais demonstrações devem, obrigatoriamente, ser arquivadas na Junta Comercial competente.
Vale mencionar que, em consonância ao artigo 124 da Lei das S.A., a companhia fechada que tiver menos de vinte acionistas, com patrimônio líquido inferior a R$1.000.000,00 (um milhão de reais), poderá deixar de publicar o balanço e demais demonstrações financeiras, desde que sejam, por cópias autenticadas, arquivados no registro de comércio.
Quanto a ata da assembleia geral ordinária, esta deve ser registrada perante a Junta Comercial e, em seguida, publicada no diário oficial da União ou do Estado ou do Distrito Federal, conforme o lugar em que esteja situada a sede da companhia, e em outro jornal de grande circulação editado na localidade em que está situada a sede da companhia, conforme o artigo 289 da Lei das S.A., que estabelece as regras de publicação.
Com relação as especificidades das companhias abertas, salienta-se que estas devem seguir as orientações da CVM - Comissão de Valores Mobiliários, tais como as contidas no Ofício Circular CVM/SEP 01/21, de 26 de fevereiro de 2021, que dispõe sobre diretrizes a serem observadas na elaboração das demonstrações financeiras para o exercício social encerrado em 31/12/20.
Ademais, necessário se atentar que o atraso na publicação do balanço e demonstrações financeiras, por companhias abertas, é tido falta grave pela CVM, sujeito a aplicação de multa diária.
Entidades sem fins lucrativos
Em se tratando de entidades sem fins lucrativos, aplica-se o disposto no artigo 1.078 do Código Civil, de modo que a assembleia geral ordinária destinada a tomar as contas da administração também deve ocorrer nos quatro meses subsequentes ao término do exercício social, ou seja, até 30 de abril de 2021.
Quanto às demonstrações financeiras e à proposta de destinação do resultado, relativas ao exercício social findo, estas devem ser disponibilizadas aos associados que não exerçam a administração da entidade, até 30 dias antes da data marcada para a assembleia.
As pessoas jurídicas sem fins lucrativos devem, ainda, com base no art. 2º, § 2º, do decreto Federal 6.022/07, que institui o Sistema Público de Escrituração Digital, manter sob sua guarda e responsabilidade os documentos que integram sua escrituração contábil e fiscal, inclusive aquelas entidades imunes e isentas.
Após o cumprimento de tais determinações, é necessário que a ata da assembleia seja levada a registro no Cartório de Registro de Títulos e Documentos competente para que surta seus efeitos legais.
Considerações finais
Diante do cenário de calamidade sanitária, instaurado em decorrência da pandemia de covid-19, no ano de 2020 foram editadas normas que permitiram a realização de assembleias virtuais (artigo 180-A do Código Civil).
Frente a esta nova realidade, é aconselhável às pessoas jurídicas de direito privado que adequem seu respectivo estatuto/contrato social, a fim de positivar a hipótese de realização de assembleias virtuais, bem como a modalidade e forma de deliberações nestas assembleias.
Ainda, vale mencionar que até o momento não há qualquer deliberação efetuada pelos órgãos competentes sobre a prorrogação de prazos para a aprovação anual de contas, como ocorrera no ano passado. Merece atenção o prazo legal de quatro meses seguintes ao término do exercício social para aprovação de contas, sob pena da aplicação das penalidades peculiares a cada tipo de pessoa jurídica.
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1 STJ. REsp 1.313.725/SP (2011/0286947-4). relator: ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.
Fernanda Pereira Leite
Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Bacharel em Administração de Empresas pela FAAP. Especialização em Comércio Exterior pelo Programa de Educação Continuada da FGV. Sócia do escritório Araújo e Policastro Advogados.
Regina Célia Baraldi Bisson
Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da USP. Sócia do escritório Araújo e Policastro Advogados.
Bruno Caruso
Advogado no escritório Araújo e Policastro Advogados. Pós-graduando em Direito Processual Civil pela Universidade de São Paulo - USP.