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Dia Internacional da Mulher frente à pandemia

A pandemia é uma ameaça não só à saúde pública, mas também à saúde e à sobrevivência das mulheres, sobretudo em âmbito doméstico.

segunda-feira, 8 de março de 2021

Atualizado às 08:18

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

 

Mulher, na escola em que você foi ensinada

Jamais tirei um dez

Sou forte, mas não chego aos seus pés.

(Erasmo Carlos e Narinha)

Em meio ao caos provocado pela quarentena, esta devido ao aumento dos casos de COVID-19, as mulheres de todo o mundo não têm muito o que comemorar no "Dia Internacional da Mulher", em especial em nosso país. Temos a firme convicção de que as mulheres, em tempos de crise, foram as que pagaram o preço mais alto por cumprir os imprescindíveis ajustes sanitários.

 

Mesmo em casa, a luta dessas guerreiras pela igualdade de direitos não pode parar, e alterna-se com os cuidados à saúde de crianças, adultos e até idosos, sem nos esquecermos do trabalho doméstico já rotineiro e ainda não dividido de modo equânime.

O dia 8 de março, celebrado em todo o mundo para reconhecer as conquistas sociais, políticas e culturais das mulheres, também é uma oportunidade de chamar a atenção para a necessidade de acelerar os movimentos em direção à igualdade de direitos e de condições destas em relação aos homens.

Mesmo com restrições, que seja uma data lembrada e devidamente celebrada: em meio a mortes, fome, hospitais lotados e lágrimas, as mulheres seguem, ao longo dos anos, com lutas e vitórias. Mais do que nunca, no epicentro do caos, aflora o papel, em cada mulher de guardiã da vida, ainda que nem todas tenham, necessariamente, passado pela experiência da maternidade.

O Dia da Mulher foi comemorado pela primeira vez em 1908, nos Estados Unidos, quando mulheres se reuniram para uma manifestação reclamando igualdade econômica e política no país. A história que se conta é de que a data surgiu para lembrar a morte de 130 operárias de uma fábrica têxtil, em Nova Iorque. Mas hoje sabe-se que esse evento foi mais um entre tantos que levaram a celebração a ser instituída e, a partir de 1911, marcada internacionalmente, de maneira ainda extraoficial.

Entretanto, antes disso, ainda no século XIX, as mulheres europeias já se reuniam em organizações e manifestavam-se por salários dignos e jornadas de trabalho menos extenuantes. Naquele tempo, operários tinham de cumprir 15 horas de serviços diariamente, em troca de renumeração ridiculamente baixa. 

Foi na Rússia, em 8 de março de 1917, quando as mulheres iniciaram uma greve que se tornaria a Revolução de Fevereiro, e esta culminou com a deposição do czar Nicolau II, que a data passou a representar a luta feminina. A partir daí, o calendário internacional referenda e reverencia o Dia da Mulher.

Cento e quatro anos depois, as festividades do Dia Internacional da Mulher estão suspensas devido à pandemia. Mas não é por isso que a luta por igualdade, por mais segurança e por respeito deve ser esquecida: em meio à reclusão forçada, mais mulheres foram espancadas e assassinadas. Infelizmente, famílias fechadas em casa, isoladas, com muitos dos homens sem trabalho, renda ou perspectivas a curto/médio prazo, fizeram com que a violência contra a mulher atingisse patamares alarmantes. Segundo a mais recente Pesquisa das Mulheres Brasileiras nos Espaços Públicos e Privados (FPA/SESC), temos, em média, uma agressão a cada 2 minutos. Em 80% dos casos, o agressor é namorado, marido, companheiro ou já teve alguma relação com a vítima, mesmo que terminada. Na mesma linha, estudo da UERJ acrescenta o estresse às causas já expostas.

Segundo o monitoramento "Um Vírus e Duas Guerras", feito em parceria por sete veículos de comunicação, desde o começo da pandemia de COVID -19 no Brasil, 497 mulheres foram mortas. Foi um feminicídio a cada nove horas entre março e agosto de 2020, com uma média de três mortes por dia. O número absoluto de casos foi liderado por São Paulo, Minas Gerais e Bahia, com 79, 64 e 49 assassinatos, respectivamente.

Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, houve aumento de 22% nos registros de feminicídio no Brasil durante a pandemia, entre os meses de março e abril, passando de 117, em 2019, para 143, em 2020, com uma taxa de feminicídios de 0,56 por 100 mil habitantes mulheres.

Apenas na cidade de São Paulo, foram registrados mais de 14 mil atendimentos de mulheres vítimas da violência durante 2020, segundo a Secretaria Municipal de Direitos Humanos. No total, foram 647 mulheres assassinadas por causa do gênero nos primeiros seis meses de 2020, 90% destas pelo companheiro ou pelo ex-companheiro, de acordo com o relatório do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

As mulheres também foram mais afetadas pela pandemia e a explicação da OMS (Organização Mundial da Saúde) é que elas são a maioria das pessoas lidando diretamente com doença. Nos hospitais, 70% dos trabalhadores da saúde são do sexo feminino - médicas, enfermeiras, fisioterapeutas, entre outras, em contato direto com os doentes. Além disso, são as mulheres, também, a maioria dos trabalhadores informais; consequentemente, mais vulneráveis.

Percebe-se que, ao mesmo tempo, o isolamento pode trazer benefícios para conter o avanço da doença, mas também desencadear uma série de transtornos mentais na população: depressão, ansiedade, pânico e estresse têm sido os mais frequentes. Assim, buscar ajuda para manter o equilíbrio mental é fundamental nesse período. Para explicar o aumento de casos de violência doméstica durante a pandemia, a OMS elenca, em períodos de crises, a diminuição do acesso ao emprego e a serviços sociais considerados básicos.

Para a psicóloga Paola Luduvice, do Setor de Análise Psicossocial da Promotoria de Justiça de São Sebastião, esses mesmos fatores, apontados pela OMS, unem-se ao estresse e a ansiedade, em sobrecarga à tensão já existente.

Conclui-se que a pandemia é uma ameaça não só à saúde pública, mas também à saúde e à sobrevivência das mulheres, sobretudo em âmbito doméstico. Com o isolamento, a crescente violência contra a população feminina mostrou que assassinatos, espancamentos e demais formas de tortura e intimidação também constituem sério e, lamentavelmente, ainda silencioso quadro pandêmico.

Clarice Maria de Jesus D'Urso

Clarice Maria de Jesus D'Urso

Bacharel em Direito com especialização em Direito Penal e Processo Penal. Conciliadora na área da família pela Escola Paulista da Magistratura do Estado de São Paulo. Membro da Associação Brasileira das Mulheres de Carreiras Jurídicas - ABMCJ.

Umberto Luiz Borges D'Urso

Umberto Luiz Borges D'Urso

Advogado Criminal, mestre em Direito Político e Econômico. Pós-graduado "Lato Sensu" em Direito Penal, em Processo Penal e em Direito. Presidente do Conselho Penitenciário do Estado de São Paulo por quatro gestões. Advogado do escritório D'Urso e Borges Advogados Associados.

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