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3 anos do acordo coletivo formado no âmbito de discussões de planos econômicos

O acordo coletivo de expurgos inflacionários, de uma só vez, põe fim ao processo e ainda proporciona pagamento ao poupador, apesar da incerteza do julgamento pelo STF sobre o tema.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

Atualizado às 13:35

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

O que está faltando para o poupador se dar conta de que a sua adesão neste momento é o melhor caminho? Não só porque põe fim ao processo, mas também, e principalmente porque, elimina a incerteza do julgamento pelo STF.

O tema de expurgos inflacionários e de planos econômicos aguarda solução definitiva pelo STF desde o ano de 20101. São mais de 1 milhão de processos sobrestados que aguardam2, dentre outras coisas, ao menos a solução da controvérsia pelo STF que se resume nas seguintes reflexões: é constitucional a mudança de regime monetário? Ou será que tal alteração afetou o ato jurídico perfeito e direito adquirido?

Para aqueles que acreditam na inconstitucionalidade, amparados em argumentos criativos de um suposto ganho excessivo de um dos lados, o que justificaria a espera de um julgamento, encontram barreiras no inegável fato de que os bancos, quando da edição dos planos econômicos, figuraram somente como cumpridores de normas cogentes.

A propósito, o cumpridor do comando legal que sofreu revés, justamente por sujeitar-se à aplicação da nova lei de correção da poupança, nos exatos moldes da reforma monetária e, agora, responde pela própria política econômica monetária adotada na época.

Apesar de os tribunais terem dado interpretação diferente ao longo das últimas décadas, aplicando um princípio jurídico constitucional e um cabedal de direito privado contratual, sejamos francos, não era essa a conclusão que da norma se extraía.

A jurisprudência do STF, a propósito do julgamento do plano real3, decidiu que normas sobre correção monetária, editadas no âmbito de planos econômicos, tem natureza institucional e estatutária e, por conseguinte, aplicam-se, imediatamente, para disciplinar cláusulas de correção monetária em contratos em curso de execução.

Fato é que o acordo inaugurou e aplicou, da forma mais pragmática possível, todos os princípios de solução consensual de conflito previstos no CPC/154 e, também, na Resolução 125 do CNJ.

É desafio, porém, nisso tudo, a expectativa do poupador em receber vultuoso valor. Invariavelmente, o poupador prefere o litígio desejoso de valores dissociados, até mesmo, dos saldos das suas respectivas cadernetas de poupanças.

É exemplo dessa situação a experiência obtida em uma audiência de conciliação, na qual a parte declinou a proposta de acordo ofertada pela instituição financeira porque, na sua ótica, seu crédito era superior a 6 milhões de reais. Apesar da recusa inicial, o acordo foi aceito. Isto porque, após reflexões mais precisas sobre os cálculos, foi possível demonstrar ao poupador a incorreção da sua expectativa, que se baseava em um saldo de um outro período, não do respectivo plano econômico5.

A esperança de um resultado melhor, na hipótese de se aguardar pelo julgamento no STF também é um desafio, porque o poupador, firme na convicção de que a solução lhe será melhor pelo julgamento, não adere ao acordo coletivo.

É quase que uma preferência pela tutela jurisdicional litigiosa que, como se sabe, não é a única forma de se solucionar um conflito. O professor Kazuo Watanabe a esse respeito destacou6:

"Esse resultado demonstra a cultura do povo brasileiro, muito dependente de autoridade, e os sociólogos procuram apontar tal característica.

(...)

Quando se trata de solução adequada dos conflitos de interesses, insisto em que o preceito constitucional que assegura o acesso à Justiça traz implicitamente o princípio da adequação; não se assegura apenas o acesso à Justiça, mas se assegura o acesso para obter uma solução adequada aos conflitos, solução tempestiva, que esteja bem adequada ao tipo de conflito que está sendo levado ao Judiciário.

(...)

É importante haver uma mudança da mentalidade dos profissionais do Direito e da própria sociedade" (Watanabe).

Essa preferência pela via judicial para solução de conflito cada vez mais tem de ser diminuída7, à luz da pacificação social, dado que, como sabido, a via judicial não é o único caminho para a resolução de um conflito.  Aliás, vale ressaltar pertinente apontamento:

"a Justiça estatal adjudicada pelo juiz não é mais o único meio adequado para a solução de conflitos, pois, ao lado desta Justiça de porta única, surgem novos meios de acesso, ou seja, surge a Justiça multiportas. Nesse contexto, a solução judicial deixa de ser aquela dotada de primazia nos litígios que permitem a autocomposição, e passa a ser a última ratio. Portanto, em vez do acesso à Justiça dos tribunais, passamos ao acesso aos direitos pela via adequada da composição" (Nascimento e Araújo, 2018, pág. 2)8.

Vale chamar a atenção que, desde o início, o acordo coletivo nunca carregou consigo a vertente de aliviar a sobrecarga do Judiciário, haja vista que sempre teve como pauta a pacificação da sociedade mediante o encontro de uma solução adequada e razoável para uma incerteza que assola todos os poupadores em solo nacional.

Após décadas de desgastes no assunto, a melhor e única certeza de recebimento de valores, nesse momento, está associada à adesão do acordo coletivo que contou, inclusive, com a participação do IDEC e com o parecer favorável da Procuradoria Federal9, resultando na sua respectiva homologação.

Além disso, a PGR manifestou-se nesse sentido na ADPF 77, o que demonstra uma mudança de posição que, por sua vez, poderia também ser manifestada na ADPF 165, não fosse o acordo coletivo.

O acordo coletivo do qual o poupador - com contas elegíveis e processo pendente - pode aderir, em verdade, é um alento. Muito além disso, é um instrumento que, por si, demonstra com robustez um dos pilares da negociação, qual seja, a disposição de resolver uma crise por intermédio da composição, afinal, não se pode ignorar que, quem aceitou pagar, também abriu mão de sua eventual vitória.

Está na hora de aceitar que a adesão ao acordo coletivo põe fim a crise lamentada pelo poupador e proporciona a ele uma situação jurídica definitiva de credor, apesar do sobrestamento do julgamento pelo STF.  O professor Dinamarco afirma:

a exagerada valorização da tutela jurisdicional estatal, a ponto de afastar ou menosprezar o valor de outros meios de pacificar, constitui um desvio de perspectiva a ser evitado (DINAMARCO, p. 121, 2013)

Portanto, a adesão ao acordo coletivo é a melhor opção, além de ser uma manifestação da possibilidade de pacificação da sociedade.

_________

1- Refiro-me aos Recursos Extraordinárias 631.363/SP, 632.212/SP, 591.797/SP e 626.307/SP, nos quais a discussão é sobre direito ao pagamento de expurgos inflacionário/planos econômicos.

2- Divulgação no material Supremo em ação, especialmente na figura 45, disponível aqui

3- Nos REs 211.304 e 212.609.

4- São diversos os dispositivos que incentivam a composição, entre eles: o art. 3º, 4º, 5º, 6º e 7º do CPC. Em relação a Resolução 125, que dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências, o conteúdo que me refiro faz parte dos "considerandos".

5- Acontece que o Plano Verão converteu a moeda de Cruzado para Cruzado Novo e isso culminou na mudança de valor: Cz$ 1.000,00 (mil cruzados) passaram a valer NCz$ 1,00 (um cruzado novo), por ocasião da Lei 7730/89, art. 1, §1ª. A confusão é essa, pois nesse exemplo, ao invés de aplicar o índice do acordo sobre NCz$ 1.000,00, com a alteração monetária teria de ser somente sobre NCz$ 1,00.

6- Watanabe, Kazuo. 2001, pág. 44, 46 e 50.

7- [...] a Justiça Estatal não é o único caminho pelo qual se procura oferecer solução aos conflitos. Como forma de autocomposição, existe também a negociação, em que as parte em conflito dirimem seus conflitos diretamente ou com intermediação de seus advogados, sem recorrer a formas mais institucionalizadas que se servem de um terceiro facilitados (conciliador ou mediador). (CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, 2014, p. 32-33)

8- Nascimento e Araújo, 2018

9- Também estampada na última manifestação favorável de lavra do Excelentíssimo Procurador Geral Augusto Aras, juntado no movimento 1085 da ADPF 165.

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ADPF 77, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 16/05/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-109 DIVULG 04-05-2020 PUBLIC 05-05-2020

CINTRA, Carlos de Araújo. DINAMARCO, Candido Rangel. GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. Ed Malheiros. 30ª edição. São Paulo. p. 32-33, 2014.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Supremo em ação 2018: ano-base 2017, figura 45, Brasília. 2017.

DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. Vol I. Ed: Malheiros, 7ª edição. P. 121, 2013.

NASCIMENTO, Felipe Costa Laurindo do. ARAÚJO, Bruno Manoel Viana de. A arbitragem em direito nacional: justiça multiportas e o código de processo civil de 2015. Revista de Processo, São Paulo, vol. 285, p. 397-417, 2018

WATANABE, Kazuo. Modalidades de Mediação. Série Cadernos do CEJ, n. 22, Brasília: Conselho da Justiça Federal, 2001, pág. 44, 46 e 50.

RE 211304, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 29/04/2015, DJe-151  DIVULG 31-07-2015  PUBLIC 03-08-2015 EMENT VOL-03992-02  PP-00339

RE 212609, Relator(a): CARLOS VELLOSO, Relator(a) p/ Acórdão: TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 29/04/2015, DJe-153  DIVULG 04-08-2015  PUBLIC 05-08-2015 EMENT VOL-03993-01  PP-00001

 

Guilherme Vinicius Justino Rodrigues

Guilherme Vinicius Justino Rodrigues

Especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica (2018), com Extensão em Arbitragem pela mesma instituição (2018) e Extensão em Direito Imobiliário pelo Mackenzie (2017). Atualmente é advogado no Itaú Unibanco.

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