Diversidade a serviço da sociedade: igualdade, poder e remuneração para mulheres
O papel da mulher nesse mercado precisa ser repensado porque o interesse da sociedade é aproveitar de forma produtiva as diferenças entre homens e mulheres.
quarta-feira, 20 de janeiro de 2021
Atualizado às 08:20
A pandemia não cria tendências, as acelera. O mercado de trabalho demanda novo conjunto de habilidades que incluem, também, conhecimento científico e tecnológico. O papel da mulher nesse mercado precisa ser repensado porque o interesse da sociedade é aproveitar de forma produtiva as diferenças entre homens e mulheres.
Isso não é tarefa simples. A CNN publicou nota alarmante: em dezembro de 2020, 140.000 empregos foram extintos nos Estados Unidos da América, todos exercidos por mulheres, e 16.000 postos femininos foram assumidos por homens, o que significa que 156.000 mulheres foram excluídas do mercado de trabalho norte-americano.
O que esses dados nos mostram? Visão simplista diria que nos Estados Unidos da América há preconceito em relação às mulheres. Perspectiva realista, e mais grave, mostra que as mulheres são percebidas como menos qualificadas do que os homens, o que as torna mais vulneráveis como força produtiva sobretudo em tempos de crise.
A realidade é que parte dos empregos que existirão em 2030 não foi nem mesmo criada, mas se antevê que grandes oportunidades estarão nas áreas das ciências, tecnologia, engenharia e matemática, com menor presença feminina, a priori por razões culturais. Na infância, meninas e meninos se interessam pelas "ciências", mas, com o tempo, as mulheres se voltam para outras áreas do conhecimento e, hoje, empresas de tecnologia encontram dificuldades para contratar mulheres.
As mulheres não têm sido estimuladas a serem cientistas, engenheiras ou matemáticas e as que se destacam nesses campos o fazem por esforço, por mérito pessoal. A trajetória extraordinária de Marie Curie com seus dois prêmios Nobel em Física e Química é ilustrativa. Ela abdicou daquilo que se considerava à época parte do feminino - a vaidade, os vestidos e o tempo com a filha - e foi vítima de preconceito por ser mulher. Seu legado extrapola suas conquistas científicas pois mostra que não deveria ser necessário para uma mulher tamanha abdicação para se sobressair.
O foco na análise das razões que levaram à desigualdade entre homens e mulheres em diversas áreas de trabalho, ou conhecimento, parece estéril e pouco produtivo. Concessões nunca são feitas por generosidade, mas sim por necessidade.
Avanços foram feitos porque a sociedade precisava aumentar a capacidade produtiva diante dos desafios econômicos e da nova conformação das famílias modernas que não mais se reúnem de forma exclusiva em torno do patriarca provedor. No mundo jurídico, por exemplo, as mulheres conquistaram espaço na magistratura, no ministério público, nas polícias, na defensoria pública e na advocacia não sem grande esforço e tendo que superar preconceitos que se percebem, ainda, desde o atrium de alguns tribunais que impõem regras de vestimenta para mulheres adentrarem nos recintos.
O importante é que homens e mulheres não são e nem precisam ser iguais, mas devem ter igual valor não por senso de Justiça ou empatia, mas porque a sociedade se beneficia com a ampliação da mão de obra qualificada em diversos ramos de atividade. Desprezar a aptidão feminina constitui-se opção pouco inteligente e o investimento na qualificação das mulheres em múltiplos campos profissionais é de retorno certo.
Empresas e países com olhos no futuro querem mulheres em posições de comando porque sabem existir conflitos éticos que contrapõem a produtividade a outros valores como a vida, a saúde e a dignidade humana, temas para os quais as mulheres são mais compreensivas. A pluralidade de ideias que decorre da diversidade assegura decisões mais maduras e, afinal, ambiente de trabalho, mercado, economia e até um mundo melhor.
Assim, políticas públicas que apenas obrigam empresas e organizações públicas a terem em seus quadros número igual de homens e mulheres constitui erro no enfrentamento dessa questão. "Cota" para mulheres não resolve o problema, pois o que se vê é a presença maciça de homens em cargos de direção e de mulheres em cargos de "menor relevância" e com inferior remuneração.
O número absoluto de homens e mulheres pode até ser igual, mas as conquistas sociais virão com a maior representatividade de mulheres em postos elevados. Leis e normas administrativas de conteúdo programático devem estimular a qualificação das mulheres e sua ascensão nas carreiras públicas e na atividade empresarial, assim como regular a isonomia na Administração Pública e o engajamento da iniciativa privada na implementação da efetiva igualdade, inclusive econômica.
Imagine-se, v.g., a instituição de diretrizes que obriguem empresas e órgãos públicos a terem na sua folha de pagamentos os mesmos gastos com homens e mulheres. De modo simples, gastos paritários imporão a funcionários públicos e empregadores que invistam tempo e dinheiro na qualificação feminina e seu reconhecimento, inclusive para compensar os custos da folha de pagamentos paritária.
Pensem-se nas Altas Cortes. O que se almeja não é apenas o mesmo número de mulheres e homens no Supremo Tribunal Federal, ou no Superior Tribunal de Justiça. Hoje, até mais assessoras do que assessores podem ser encontrados em gabinetes. O que se quer, em verdade, é o incremento da quantidade de Ministras no julgamento dos casos, com a mesma aptidão intelectual, mas com a sensibilidade própria que o pensar feminino sabe expressar na busca do justo. Pelas mesmas razões, a ampliação da representação feminina no Congresso Nacional agregará valor na formulação das normas definidoras das condutas que nortearão a sociedade.
Em síntese, nós não devemos aguardar séculos para que as desigualdades diminuam. Políticas públicas e programas educacionais voltados a melhorar a qualificação das mulheres e a percepção existente sobre essa qualificação são urgentes. A inclusão feminina nos processos decisórios, sejam políticos, públicos ou empresariais, se justifica pela proficiência alcançada por elas. A humanidade tem feito avanços significativos e deve continuar nessa direção ao escolher colocar a diversidade a serviço da sociedade.