Gestão de riscos: O coração de um programa de integridade
A corrupção, como fenômeno, é um risco que afeta a gestão, seus objetivos, tornando-a mais onerosa, desviando-a dos seus objetivos, e sujeitando os gestores, públicos e privados, a efeitos sancionatórios por conta de multas, ou ainda, prejuízos pelo dano reputacional.
sexta-feira, 15 de janeiro de 2021
Atualizado em 18 de janeiro de 2021 13:14
No contexto dessa onda que afetou a discussão de accountability no país, por conta da influência da chamada Operação Lava Jato, avança nas falas e nos atos uma agenda anticorrupção, que dentre outros pressupostos, tem a centralidade em um instrumento específico, o Programa de integridade. Mas, como se verá nas linhas a seguir, os pressupostos e a abordagem desses programas ainda carecem de discussões no campo prático, e a gestão de riscos pode ser uma valorosa aliada nesse desiderato.
Para fins de definição, tem-se que o decreto federal 8.420/15, no seu art. 41, indica que esse programa de integridade consiste em um "(...) conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com objetivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos (...)". Ou seja, uma articulação de atores para uma ação integrada de prevenção e combate a corrupção, no âmbito daquela organização.
O parágrafo único desse mesmo artigo destaca a importância da gestão de riscos na construção desse tipo de programa, visão que se confirma no Inciso III, art. 19, do decreto 9.203/17, que trata da questão da governança no Poder Executivo Federal, bem como no conjunto de normas decorrentes sobre o tema. Tal preocupação com os riscos no trato da integridade não se dá à toa.
A corrupção, como fenômeno, é um risco que afeta a gestão, seus objetivos, tornando-a mais onerosa, desviando-a dos seus objetivos, e sujeitando os gestores, públicos e privados, a efeitos sancionatórios por conta de multas, ou ainda, prejuízos pelo dano reputacional. Por ser algo que afeta a gestão, valorado por uma probabilidade de ocorrência e um por um impacto a essa gestão, a discussão da gestão de riscos emerge na mesma medida.
Trazer a centralidade da gestão de riscos para os programas de integridade é olhar o perfil da organização, suas transações, suas partes interessadas, seu ambiente, e a partir dali, dessa análise de contexto, levantar os fatores que podem ocorrer no que se refere a corrupção, e a partir daí avaliar a magnitude desse risco, pensando nas respostas adequadas e suficientes. Uma visão racional e aplicada dessa questão.
Para a gestão de riscos de integridade, uma empresa de serviços é diferente de uma empresa de material de limpeza e expediente. Diferente, pois existe uma diversidade no inventário de riscos possíveis dessas duas organizações, sua probabilidade e impacto, e isso afeta o desenho das salvaguardas para esses riscos. O que é o programa de integridade, se não um conjunto de medidas preventivas em relação ao risco de corrupção?
Assim, a gestão de riscos de integridade ajuda a identificar e escalonar as principais ameaças, e proporciona a construção de salvaguardas na mesma medida, o que impede ações onerosas, que engessam empresas e são pouco efetivas. Muitos pensam que construir um programa de integridade é só recomendar a criação de um código de conduta, uma simplificação da questão da corrupção e das suas causas, o que pode trazer muito esforço e pouca efetividade.
O futuro dos programas de integridade passa pelo fortalecimento da gestão desses riscos, o que garantirá uma percepção adequada das principais ameaças, e uma construção de medidas protetivas efetivas e que impactem ao mínimo a gestão. A corrupção é um fenômeno de impossível extirpação, dado que está presente na delegação das relações humanas. Mas ele pode ser mitigado, por ações que podem até ser simples. E nesse sentido, a gestão de riscos pode ser uma efetiva aliada na construção dessa nova cultura.