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Concurso público: As principais ilegalidades que acometem os certames das carreiras policiais

Se faz oportuno a apreciação de cada fase típica de concursos dessa natureza para compreender as possíveis violações de direito que daí podem surgir.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Atualizado às 08:17

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Com a iminência de várias concursos voltados para carreiras policias para 2021, é importante esclarecer as ilegalidades e equivocos que ocorrem durante os certames, assim, se faz oportuno a apreciação de cada fase típica de concursos dessa natureza para compreender as possíveis violações de direito que daí podem surgir.

Da prova objetiva

Comumente, a primeira fase nos aludidos concursos é a prova objetiva, esta, apesar de a princípio parecer muito simples para que haja ilegalidade, infelizmente, é o que mais ocorre.

Sem dúvidas qualquer concurseiro já se irritou com um gabarito, seja pela ambiguidade das alternativas, seja por não haver resposta correta.

Assim, os editais preveem a utilização de recursos administrativos para tentar sanar a divergência.

É possível acionar o Poder Judiciário por erro em questão objetiva?

Sim, porém é necessário ter atenção. Como concurseiro você provavelmente já ouviu dizer que a Administração Pública aprecia o mérito dos atos administrativos, cabendo ao Poder Judiciário analisar, apenas, a legalidade do ato.

Assim, é possível o Poder Judiciário apreciar a legalidade da questão e a consonância desta com o edital, e, caso haja conflito entre a lei e alguma alternativa, será considerada nula a referida questão, considerando como se correta fosse apenas ao candidato que ajuizou a ação.

Da prova discursiva

A prova discursiva, geralmente aplicada na segunda fase dos certames é sem dúvidas uma prova que abre um leque de possibilidades, e, assim, paira sobre esta fase do certame a possibilidade iminente de ilegalidades.

Muitos candidatos são considerados reprovados, mesmo chegando próximo ao padrão de resposta ofertado pela banca.

Isso pode ocorrer pela caligrafia, pela correção do próprio examinador ou até mesmo divergência no enunciado da questão.

Nesse caso, aplica-se o raciocínio utilizado para as provas objetivas, isto é, é possível fazer uso de recursos administrativos, previstos nos editais, para haver uma recorreção da prova ou impugnar o cartão resposta. Apesar das controvérsias, como mencionado acima, é possível acionar o Poder Judiciário, desde que o objetivo seja analisar a legalidade da questão em contraste com o edital.

Nessa linha, o Supremo Tribunal Federal, por unanimidade decidiu:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUICIONAL. CONCURSO PÚBLICO. ANULAÇÃO DE QUESTÃO.

1. Anulação de questão não prevista no edital do concurso.

2. O Supremo Tribunal Federal entende admissível o controle jurisdicional em concurso público quando "não se cuida de aferir da correção dos critérios da banca examinadora, na formulação das questões ou na avaliação das respostas, mas apenas de verificar que as questões formuladas não se continham no progama do certame, dado que o edital - nele incluído o progama - é a Lei do concurso"1

Como se vê, a incidência de questão cujo tema sequer não conste no edital já é passível, por si só, de anulação, contudo, caso não por iniciativa da banca, ao Poder Judiciário é dado a competência para assim proceder.

Do Teste de Aptidão Física - TAF

Desde já, infere-se a posição do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, vejamos:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. VINCULAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. CASO EM QUE SE AUTORIZA O PODER JUDICIÁRIO A EXAMINAR O EDITAL DE PROCESSO SELETIVO. TESTE DE CAPACIDADE FÍSICA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO EM LEI ESPECÍFICA. ILEGALIDADE DA EXIGÊNCIA NO EDITAL. PRECEDENTES DO STJ.

1. É firme o entendimento do STJ de que, em concurso público, o teste de capacidade física somente pode ser exigido se houver previsão na lei que criou o cargo, sendo vedado ao Edital do Certame limitar o que a lei não restringiu ou alargar o rol de exigências, especialmente para incluir requisito que não consta da lei.

Precedentes: REsp. 1.351.480/BA, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJe 26/6/13, AgRg no RMS 26.379/SC, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 2/5/13, AgRg no REsp. 1.150.082/DF, Rel. Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJe 2/10/12.

2. No caso dos autos, não basta estar previsto na Portaria 46 de 6/8/14, é necessário constar na Lei e no Edital a exigência de teste de aptidão física para o cargo de Segurança Institucional de transportes.

3. Embargos de Declaração providos com efeito infringente.

(EDcl no REsp 1.665.082/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, 2ª turma, julgado em 3/10/17, DJe 11/10/17)

Nessa linha, para que haja a realização do referido teste é necessário, antes mesmo da existência do Edital, a previsão expressa na Lei que rege a carreira, sob pena de ilegalidade.

Atualmente, várias são as ramificações do teste de aptidão física, dentre outros: a corrida; a flexão de braço; o impulso horizontal; abdominal e natação.

No que tange a corrida, em muitos casos há várias raias onde cada atleta realiza o percurso, bem como a grande quantidade de candidatos acaba por fazer com que um concorrente faça o teste pela manhã, enquanto o outro ao meio-dia.

Vislumbra-se aqui uma violação à isonomia entre os candidatos, vez que o desempenho de alguém que corre no período da manhã em contraste com aquele que correu ao sol escaldante do meio-dia, será consideravelmente melhor.

Em sentido semelhante, no Distrito Federal já há a lei distrital 4.949/12 a qual veda a realização do aludido teste entre 11h da manhã até às 15h da tarde, nitidamente na tentativa de igualar as condições climáticas de quem faz a prova no período matutino e quem a realizará no perído vespertino.

Nesse diapasão, chama atenção o Supremo Tribunal Federal, o qual reconheceu o direito de uma candidata gestante remarcar a referida prova, independente de haver previsão nesse sentido no Edital, pois, ao tempo da realização da referida prova estava grávida, o que notadamente restringiria ou impediria completamente o seu desempenho.2

Da cláusula de barreira

Trata-se da hipotése em que o Edital prevê, em outras palavras, que somente será corrigido a redação ou será submetido ao teste de aptidão física os 500 primeiros colocados, por exemplo.

Nesse caso, inúmeros questionamentos surgiram, contudo, quando da apreciação do RE 635.739 o Supremo Tribunal Federal entendeu pela Constitucionalidade da chamada Cláusula de Barreira, desde que seja usado o critério meritório.

Ou seja, não há que se falar em cláusula de barreira nas fases que não possui uma forma de avaliar o mérito de cada candidato, por exemplo, viola o entendimento da Suprema Corte a incidência da referida cláusula na fase de avaliação médica, pois, não há como apreciar o desempenho, leia-se, o conhecimento do candidato.

Noutro aspecto, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás concedeu liminar a candidata que estava fora da cláusula de barreira, por entender, em outras palavras, que o próprio percentual fixado pela cláusula de barreira era desproporcional ao número de aprovados, e, por conseguinte, causa ao candidato prejuízo suscetível de reparação pelo Poder Judiciário.3

Do exame psicotécnico

Assim como o teste de aptidão física, é necessário para a realização do aludido exame a sua exigência na Lei da carreira. É esse o verbete da súmula vinculante 44.

Ainda, recentemente o egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios entendeu pela necessidade de anulação do exame, pois, apesar de haver previsão legal determinando a sua realização, não haviam critério objetivos para a avaliação do candidato, ficando a aprovação sujeita ao subjetivismo do examinador, fixando, assim, realização de novo exame com parâmetros objetivos de avaliação.4

Não obstante a força vinculativa da súmula supramencionada, é comum a imposição do exame em comento, mesmo sem a previsão legal o exigindo.

Foi o que ocorreu com o concurso da Escola preparativa de Cadetes do Ar(EPCAR) em que o candidato foi surpreendido pela realização do exame psicotécnico. Ao procurar o Poder Judiciário o Tribunal Regional Federal da 5º Região entendeu que haveria a previsão legal necessária na lei 4.375/64.

Contudo, ao apreciar o recurso pertinente, entendeu o Superior Tribunal de Justiça que a legislação supramencionada não se aplicava àquele caso concreto, o qual necessitava de lei própria.5

Da fixação de idade máxima

A idade máxima imposta pelas bancas, notadamente em cargos para carreiras policias sempre foi alvo de discussão.

Assim, o Supremo Tribunal Federal pacificou o entendimento de que a imposição de idade máxima é legítima, desde que haja previsão legal e tal determinação seja justificada pela própria natureza e peculiaridades da atribuição do cargo, e, ainda, ponderou a Suprema Corte que a aferição da idade deve ser no ato da inscrição.6

Desse modo, o fato da banca deixar para eliminar o candidato que, ao tempo da inscrição já ostentava idade acima daquela determinada, mostra-se desproporcional, assim, entendeu o

Conclusão

Diante do exposto, é possível identificar várias as possibilidades de ilegalidades praticadas pelas bancas, e, por conseguinte, gera ao candidato o direito de ter qualquer lesão ao seu direito reparada, seja pela via administrativa, seja pela via judicial, desde que representada por advogado devidamente especializado nessa área de atuação, que, de maneira artesanal, busque a melhor solução para cada caso.

_________

1 STF - RE-AgR: 440335 RS, Relator: EROS GRAU, Data de Julgamento: 17/6/08, 2ª turma, Data de Publicação: DJe-142 DIVULG 31/7/08 PUBLIC 1/8/08 EMENT VOL - 02326-06 PP-01188

2 STF - RE: 1058333 PR 0002642-19.2013.8.16.0179, Relator: Luiz Fux, Data de Julgamento: 21/11/18, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 20/7/20.

3 TJ/GO - MS 5075666.32.2019.8.09.0000, Rel. Des. Leobino Valente Chaves, Data de Publicação 14/2/19

4 TJ/DFT - EB 20140110602246EIC, Relator: JOÃO EGMONT, 2ª Câmara Cível, data de julgamento: 14/3/16, publicado no DJE: 5/4/16.

6 STF- RE 595.893 AgR, STF - 2ª turma, Rel. Min. Teori Zavascki, julgamento 10/6/14, Dje 1/7/14)

Thárik Uchôa Luz

Thárik Uchôa Luz

Advogado, pós-graduado lato sensu pela Escola Superior de São Paulo, especialista em causas envolvendo concursos públicos e servidores públicos. Capitaneia o escritório Uchôa Advocacia.

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