Evolução da comunicação e sua importância
A comunicação continuará a evoluir em suas técnicas, mas seu papel estruturante, individual e democrático, permanecerá como guia permanente à construção de seu conteúdo: estabelecer elos entre pessoas.
terça-feira, 15 de dezembro de 2020
Atualizado às 07:53
Como numa dança social, comunicação e tempo dialogam, ritmando e estruturando um ao outro. O pausar ou acelerar de um dão a toada do outro, em um agir sincrônico, mas também marcado por desequilíbrios pontuais, para logo em seguida se começar uma nova busca por harmonia tempo-comunicação.
Cada tempo possui sua forma própria e disruptiva de comunicação, dos desenhos em cavernas, passando pelos hieróglifos em papiros e pedras, pela escrita manual, pelas letras impressas até as digitadas na rede mundial.
A velocidade e a multiplicidade das relações alteram a comunicação, assim como a velocidade e a diversidade da comunicação alteram as relações e a própria percepção do tempo. Ambos, tempo e comunicação, vão se ajustando às invariantes culturais da curiosidade humana, do desejo de obter informações, do anseio de manter elos relacionais.
Pela comunicação, o humano exerce inúmeras facetas do poder e do ser, no espaço íntimo e social. Acompanhar sua evolução, portanto, é parte do próprio processo de realização individual e de inserção pública. Através dessa análise evolutiva, compreende-se a articulação humana e sua posição como receptor de informação, ser contemplativo, crítico e protagonista da estruturação da personalidade e da cena pública.
Dado que a palavra cimenta as relações humanas íntimas e públicas, seu domínio é forma inegável de poder. Adequar o uso da palavra e a aquisição de informação à comunicação justa a seu tempo potencializa sua capacidade de inserção social.
A contemporaneidade é marcada pelos excessos, no que se pode chamar de hipermodernidade: excesso de informação, excesso de canais de comunicação, excesso de relações. Ante o excesso, confusão e superficialidade impedem a construção do saber, fragilizam o desenvolvimento do senso crítico. As marcas iluministas de que o acesso à informação consolidaria o conhecimento empalidecem ao longo do século XX. A tecnologia dos meios de comunicação, se, por um lado, intensificaram-na, por outro, trouxeram novos desafios tanto à comunicação inter-relacional, como à comunicação de massa.
Quanto à comunicação de massa, o elemento do poder comunicativo deixa de girar em torno da mera detenção de informação, migrando para fatores como a rapidez na transmissão de dados, a credibilidade e o apelo visual. Não que se manter informado ou transmitir informações tenha diminuído sua relevância, apenas, diante do aumento da complexidade da comunicação, esse passou a ser critério mínimo de poder comunicativo.
O Migalhas foi vanguardista, no mundo jurídico brasileiro, em ofertar essas possibilidades a seus leitores: amplitude do saber, com profundidade técnica, seriedade informativa e ainda humor na análise de estruturas e conjunturas complexas. Lembro do meu encantamento com a primeira leitura que fiz do Migalhas. Encontrei citações pertinentes da literatura elevada, notícias com chamada instigante, e um bom conteúdo a cada clique de hiperlink. Recordo também da sensação que deixou na alma: quero ler mais, saber mais, me atualizar mais. Eram letras digitadas e links que me davam a sensação de estar em uma extensa e clássica biblioteca, num saboroso paradoxo entre virtual e real que o melhor da internet nos proporciona.
A comunicação continuará a evoluir em suas técnicas, mas seu papel estruturante, individual e democrático, permanecerá como guia permanente à construção de seu conteúdo: estabelecer elos entre pessoas. É nos princípios éticos e estéticos desse guia que a humanidade encontrará tranquilidade para saber que os novos desafios que sempre chegarão serão superados e vividos com sentimentos comunitários de construção coletiva do saber.
Raquel Cavalcanti Ramos Machado
Mestre pela UFC, doutora pela Universidade de São Paulo. Professora de Direito Eleitoral e Teoria da Democracia. Membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político - ABRADEP, do ICEDE, da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/CE e da Transparência Eleitoral Brasil.