TRF-1 afasta restrições ao exercício da licença para capacitação por servidores públicos federais
A 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região afastou regras previstas no Decreto 9.991/15 ao constatar abuso do poder regulamentar pelo Poder Executivo.
sexta-feira, 11 de dezembro de 2020
Atualizado às 11:14
A 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) decidiu, por maioria, por suspender provisoriamente a aplicação de dispositivos regulamentares previstos no decreto 9.991/15 e na Mensagem Oficial Circular 15/19 DGP/PF, os quais restringem o exercício da licença capacitação por parte dos servidores públicos vinculados ao Poder Executivo Federal, e, em específico, aos servidores do Departamento de Polícia Federal.
O decreto 9.991/15 dispõe sobre a chamada "Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoas da administração pública federal direta, autárquica e fundacional", regulamentando dispositivos da lei 8.112/90 - o Estatuto dos Servidores Públicos Federais -, em especial o art. 87 da Lei, o qual confere aos servidores públicos federais o direito a licença para capacitação.
A decisão foi proferida por maioria em sede de agravo de instrumento interposto pela Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF), entidade representativa dos Peritos Criminais da Polícia Federal. Na oportunidade, a Associação questionou os arts. 18, § 1º, inciso I, 26 e 27 - todos do decreto 9.991/15 - bem como a Mensagem Oficial Circular 15/19 DGP/PF - ato administrativo editado no âmbito da Polícia Federal com o intuito de concretizar as disposições previstas no mencionado decreto.
Os dispositivos regulamentares impugnados pela Associação consistem em restrições significativas ao exercício da licença capacitação.
O art. 27 do decreto 9.991/19, com redação dada pelo decreto 10.506/20, estabelece que apenas cinco por cento dos servidores em exercício poderão usufruir da licença para capacitação simultaneamente. Como consequência dessa restrição, no âmbito da Polícia Federal foi editada a Mensagem Oficial Circular 15/19 DGP/PF, a qual determina que o limite máximo de duração da licença para capacitação será de 30 (trinta) dias.
Já o art. 26 do decreto 9.991/19 prescreve que a licença capacitação só poderá ser concedida quando a carga horária total da ação de desenvolvimento ou do conjunto de ações for superior a trinta horas semanais. Ainda, o art. 18, § 1º, inciso I, do Decreto estabelece que, nos afastamentos por período superior a trinta dias consecutivos, o servidor deverá pedir exoneração ou dispensa do cargo ou função de confiança eventualmente ocupado para fazer uso da licença.
Diante desse cenário, a 1ª Turma do TRF-1, em acórdão divulgado em 3 de dezembro de 2020, entendeu por suspender a eficácia de todas essas disposições por considerar que elas consistem em uma extrapolação do poder regulamentar da Administração. Isso, em síntese, pois o art. 87 da lei 8.112/90 em nenhum momento exige quaisquer dessas condicionantes para o exercício do direito à licença capacitação - limitando-se a prescrever que esse direito será concedido por até três meses após cada quinquênio de efetivo exercício.
Até se admite que, em concreto, a Administração Pública acabe por restringir pontualmente o exercício da licença com esteio na discricionariedade administrativa. Essa impossibilidade, no entanto, deve ser demonstrada em concreto. Ao instituir as restrições acima mencionadas de forma abstrata e idêntica para toda a Administração, o decreto 9.991/19 agiu como se Lei fosse - limitando peremptoriamente a conveniência e oportunidade dos órgãos e entidades a eles submetidos.
Por fim, o acórdão consignou que, ao invés de promover a adequada capacitação dos quadros da Administração Pública Federal, a "Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoas" acabou por prejudicar o aprimoramento dos servidores públicos, sobretudo por desincentivar os ocupantes de cargos e funções de confiança a exercer esse direito.
Nesse contexto, a Corte entendeu por suspender a eficácia dos arts. 18, §1º, 26 e 27, todos do decreto 9.991/19, e da Mensagem Oficial Circular DGP/PF 15/19, com fulcro no art. 87 da lei 8.112/90.
A decisão é aplicável apenas aos Peritos Criminais Federais representados pela Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais. Todavia, ela representa um precedente importante, sobretudo porque muitas outras categorias, por meio de suas próprias entidades de classe, também buscam afastar disposições similares do decreto 9.991/19.
Processo: 1009882-03.2020.4.01.0000
Alberto Malta
Alberto Malta é sócio-fundador do escritório Malta Advogados. Presidente da Comissão de Direito Imobiliário e Condominial da Ordem dos Advogados do Brasil. Professor de Direito Imobiliário da UNB. Mestre em Direito, Estado e Constituição, com ênfase em Direito Imobiliário Registral, pela UnB. Pós-graduado do programa de Master in Business Administration em Gestão de Negócios de Incorporação Imobiliária e Construção Civil pela Fundação Getúlio Vargas - MBA/FGV. Pós-graduado em Direito Imobiliário pelo IDP. Árbitro da Câmara Brasileira de Arbitragem na Administração Pública - CAMBRAAP.