Ainda há esperança(?)
Passamos pelo momento mais delicado da nossa economia e também o mais desafiador.
quarta-feira, 9 de dezembro de 2020
Atualizado em 14 de dezembro de 2020 09:32
O cenário econômico não é o dos melhores - e nem para os mais otimistas do setor financeiro. A alta dos preços que atingia os alimentos e bebidas, agora também abraçou outros produtos e serviços, como escolas e aluguéis. E não é para menos: a retomada da economia caminha timidamente e os investidores, especialmente os estrangeiros, permanecem com as propostas engavetadas, com a falta de credibilidade no país, já que não há um plano robusto para a recuperação econômica a nível internacional.
Em dados publicados pelo Banco Central do Brasil, o investimento externo vem reduzindo a cada ano, dadas as incertezas políticas vividas no cenário econômico brasileiro. A entrada de recursos é fundamental para o setor econômico, principalmente à indústria, que dentre a crise enfrentada durante a pandemia, vem encontrando muitas dificuldades na busca de matéria prima.
Todavia, com o cenário político austero, que se aproximou das ideologias americanas e abandonou as reais necessidades brasileiras, principalmente na questão ambiental, acabou se afastando do bloco europeu, que vem relutando em fechar um acordo comercial por conta de rigidez e falta de diálogo. Para piorar o cenário, o governo brasileiro travou um embate com a China, parceiro comercial de muito anos, afastando ainda mais a entrada de recursos em nosso país.
Com a falta de investimentos, os índices preocupam e apontam que aceleração da inflação invadirá 2021, com a desvalorização da moeda e das dívidas assumidas pelo governo para tentar controlar a situação na pandemia.
A "bolha de adimplência" está prestes a estourar, com a rolagem das dívidas para 2021, fruto da prorrogação dos prazos para empréstimo e do auxílio emergencial. O fato é que hoje temos o menor índice de inadimplência dos últimos anos e isso está distorcido, porque a conta foi apenas jogada para frente.
A previsão da chegada de uma vacina a curto prazo ou do recuo automático do Covid-19 pelo afastamento social, não ocorreu; as imagens das filas nos hospitais públicos e nos particulares estão em todos os noticiários, sem contar as incertezas quanto à evolução da pandemia e os riscos de recontaminação.
O fato é que não se sabe quando essa crise sanitária chegará ao fim, arrastando essa incerteza para o cenário econômico. Os bancos conseguiram segurar a inadimplência para o ano de 2020, mas o futuro é incerto. Se a roda da economia não voltar a girar com robustez, a corda estourará, principalmente para as pequenas e médias empresas.
Constata-se o movimento do Congresso Nacional e do Governo, por intermédio do Ministro da Economia, para acelerar e aprovar a alteração da Lei de Falência e Recuperação Judicial, com a recente aprovação do Senado do PL 4458/2020, encaminhado para sanção. Com a promulgação, o mercado prevê estímulo às empresas, principalmente no que tange à proteção ao financiador de empresas em recuperação judicial e a rápida retomada dos sócios da empresa falida, estimulando o reempreendedorismo.
Tal alteração é muito importante no cenário jurídico e econômico nacional, mas não é o suficiente. Ainda há uma necessidade regulatória a se adaptar, principalmente na concessão de novos créditos quando ainda se tem créditos a receber - já provisionados. Essas mudanças são fundamentais para que haja um novo olhar para essas empresas em dificuldades. Contudo, hoje, apenas conseguimos discutir as alterações no âmbito especulativo e teremos que aguardar a reação prática do mercado.
Concomitante a esse movimento do Executivo e do Legislativo, o Conselho Nacional de Justiça, com o aumento exponencial dos pedidos de recuperação judicial, procurou normatizar o tema para as empresas que não estavam conseguindo cumprir o plano de recuperação judicial em razão do coronavírus, estabelecendo algumas regras para que estas empresas pleiteiem o modificativo do plano de recuperação judicial.
Evidentemente que as empresas, sobretudo as pequenas e médias, sofrem com a diminuição do consumo e com as incertezas da economia. Sem a circulação de riqueza a recuperação do empresário é lenta; o recomeço ainda não foi suficiente para recompor das perdas do período de inatividade do comércio - fatalmente muitos fecharam e tantos outros ainda fecharão as portas.
Muitas empresas negociariam suas dívidas com os bancos, prorrogando-as e, aquelas que tinham algum caixa, procuraram pela liquidação com descontos mais atrativos. Parte das pequenas e médias empresas, classe que emprega o maior número de pessoas no país, também contou com o auxílio emergencial, o Pronampe - Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte -, com a disponibilização de capital de giro limitado até 30% do faturamento da empresa no ano de 2019.
Enquanto a política de contenção não avança, o Brasil adentra numa crise sem precedentes. O desemprego chegou a 14,4% em outubro - a maior taxa desde 2012 - o que corresponde a 13,8 milhões de pessoas.
As pessoas mais humildes são as que mais sofrem com alta dos preços, com dificuldades para manter suas despesas essenciais para a sua sobrevivência. O auxílio emergencial injetou mais de R$ 300 bilhões na economia, mas não há previsão de sua renovação. A "bolha do adimplemento" é bem frágil, similar a uma bolha de sabão, que pode romper-se a qualquer momento, pois se não houver a retomada da economia, o ambiente ficará cada vez mais recessivo. É necessário que as pessoas voltem a consumir em larga escala, para que a cadeia volte a sua produção normal.
Passamos pelo momento mais delicado da nossa economia e também o mais desafiador. O nosso país está inserido no ciclo de desaceleração econômica mundial e precisa, com urgência, de planos de ação e reformas eficazes, para que o fardo dessa retração não seja carregado por muitos anos, começando para as pequenas e médias empresa, à saúde, à educação, aos trabalhadores informais e aos desempregados.
Fábio Broccoli Cabelho
Advogado em São Paulo e membro efetivo da Comissão de Relações Internacionais da OAB em São Paulo.