Quanto vou receber de 13° salário na pandemia?
O governo editou a MP 936/20 que, dentre outras soluções, permitiu a redução de jornadas e de salários em 25%, 50% e 70%, por até noventa dias,e suspensão de contratos de trabalho por até 60 dias enquanto durasse o período de calamidade pública fixado no art.1° do decreto 6/20.
segunda-feira, 16 de novembro de 2020
Atualizado às 09:55
O "13° salário", como é mais conhecida a gratificação de Natal prevista nas leis 4.090/62 e 4.749/65, corresponde a 1/12 da remuneração que o empregado deve receber a todo mês de dezembro, por fração igual ou superior a 15 dias de trabalho ou mês trabalhado durante o ano. Na prática, é um salário a mais pago a todo trabalhador, inclusive o doméstico. Nos casos de aposentadoria ou de terminação dos contratos de trabalho antes de dezembro, o 13° salário será proporcional ao número de meses trabalhados até a terminação do vínculo. O 13° salário não é devido nos casos de rescisão do contrato de trabalho por justa causa1. Se o empregado tiver mais de 15 faltas injustificadas no mês, perderá a fração do 13° correspondente àquele mês porque a lei 4.090/62 manda contabilizar para o 13° salário apenas a fração de 15 ou mais dias trabalhados. A empresa deve pagar 50% do valor do 13° salário entre os meses de fevereiro e novembro e o restante até o dia 20 de dezembro de cada ano2.
13° salário na redução da jornada de trabalho
Para combater a pandemia causada pelo coronavírus, o governo editou a Medida Provisória 936/203 que, dentre outras soluções, permitiu a redução de jornadas e de salários em 25%, 50% e 70%, por até noventa dias4,e suspensão de contratos de trabalho por até 60 dias enquanto durasse o período de calamidade pública fixado no art.1° do decreto 6/205. Esses prazos foram ampliados para 180dias pelo decreto 10.470/20. Alguns juristas entendem que para aqueles trabalhadores que durante a pandemia aceitaram a redução de jornada de trabalho e salários em 25%, 50% ou 70%, ou a suspensão total dos contratos de trabalho6, o cálculo do 13° salário é diferente do previsto no art.1°, §§1° e 2° da lei 4.090/62. Segundo afirmam, apenas os empregados que aceitaram redução de jornada e salário de até 25% conseguiriam cumprir pelo menos 15 dias de trabalho por mês e somente eles fariam jus ao 13° salário. Pelo que afirmam, os que aceitaram redução de 50% ou 70% na jornada, ou suspensão de contrato de trabalho, não teriam direito à gratificação de Natal porque não teriam completado o tempo mínimo de trabalho de que trata o art.1°, §2° da lei 4.090/62 (fração igual ou superior a 15 dias). A meu ver, trata-se de um equívoco. A MP 936, atual lei 14.020/20, fala em redução de jornada de trabalho. Jornada é o número de horas trabalhadas num dia. Um empregado que trabalhe oito horas por dia e aceite redução de 25% na jornada, passará a trabalhar seis horas por dia durante o período de redução e receberá salário reduzido em 25%. Suponhamos que trabalhe oito horas por dia, de segunda a sexta-feira, e ganhe R$3.000,00 por mês. Passará a trabalhar seis horas por dia, de segunda a sexta-feira, e receberá R$2.250,00. O restante será coberto pelo abono emergencial. A redução de oito para seis horas por dia não interfere no cálculo do 13° salário porque não estão sendo reduzidos dias de trabalho, mas jornadas, isto é, horas. Da mesma forma, quem aceitou a redução de 50% ou 70% da jornada. Caso aceite redução de 50% na jornada e no salário, por exemplo, esse mesmo empregado hipotético que trabalha oito horas por dia passará a trabalhar trabalhará apenas 4 horas e receberá salário de R$1.500,00, mas essa redução não interferirá no cálculo do 13° salário porque os dias de trabalho estarão sendo mantidos. O que as partes estarão reduzindo é a duração da jornada, isto é, a quantidade de horas por dia, e não o número de dias. Assim, mesmo que o empregado passe a trabalhar apenas quatro horas por dia durante o período de redução, estará trabalhando o mesmo número de dias de antes da pandemia, e não haverá ofensa ao §2° do art.1° da lei 4.090/62, que exige trabalho em pelo menos quinze dias no mês.
Para os empregados que não tiveram o contrato de trabalho suspenso, mas apenas redução de jornada de 25%,50% e 70% proporcionalmente à redução dos salários durante a pandemia, o cálculo não se altera porque, embora com redução de carga horária e de salário, continuaram trabalhando normalmente. Ainda aqui, para que não haja prejuízo ao trabalhador, o 13° salário deve ser calculado com base no salário contratual, e não no efetivamente pago com a redução de que trata a MP 936/20.
13° salário na suspensão do contrato de trabalho
O inciso III do art. 3° da lei 14.020/20 permitiu, também, a suspensão do contrato de trabalho como forma de contornar a crise na empresa causada pela covid-19. O prazo, inicialmente de 60 dias, prorrogáveis por mais 60, foi aumentado para 180 dias pelo decreto 10.517/20. Se se levar ao pé da letra a opinião de alguns teóricos do Direito, quem estiver com o contrato de trabalho suspenso em dezembro de 2020 não receberá qualquer valor a título de 13° salário porque o §1° do art.1° da lei 4.090/62 diz que o valor do 13° salário é o mesmo do salário pago ao empregado em dezembro de cada ano. Nesse caso, como o empregado não estará recebendo salário algum em dezembro, mas abono emergencial, o seu 13° salário equivaleria a zero.
Há uma regra de hermenêutica que diz que entre duas ou mais interpretações possíveis de uma mesma norma jurídica, o intérprete deve afastar-se daquela que conduza ao absurdo.
Este é o caso.
A lei 4.090/62 não foi revogada pela lei 14.020/20. O §2°, I do art.8° da lei 14.020/20 diz que mesmo durante a suspensão do contrato de trabalho o empregado terá direito a todos os benefícios concedidos pela empresa. Logo, não é possível sustentar que o empregado que teve o contrato de trabalho suspenso com base na MP n° 936 não terá direito a nenhum pagamento a título de 13° salário. Nos casos de suspensão, os meses em que o empregado aceitou suspender o contrato de trabalho não serão incluídos no cálculo do 13°. Assim, se a suspensão foi de três meses, o empregado terá direito a 9/12 do 13° salário porque os três meses de suspensão não entrarão no cálculo; se a suspensão foi de 4 meses, o 13° será de 8/12, e assim por diante, até o limite legal de suspensão autorizado pelo decreto 10.517/20.
Se o empregado recebeu o adiantamento do 13° salário antes do início da pandemia, a empresa deverá compensar o valor adiantado quando do pagamento da segunda parcela7. Como a lei 4.090/62 diz que o 13° salário é calculado à base de 1/12 por mês trabalhado, ou fração de mais de 15 dias, apenas os meses de suspensão total do contrato de trabalho do empregado ou de suspensão de mais de 15 dias não poderão ser contados para o seu cálculo. Em dezembro, esse empregado com contrato suspenso deve receber o 13° salário proporcional aos meses efetivamente trabalhados, calculado com base no salário contratual, e não sobre o salário pago porque, como dito, em dezembro ele não estará recebendo salário, mas abono emergencial.
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1 L. 4.090/62, art.3°.
2 L.4.749/65, arts. 1° e 2°.
3 Convertida na lei 14.020/20.
4 Art.7° da lei 14.020/20.
5 Até 31 de dezembro de 2020.
6 Previstos no art.5°, I e II da L.14.020/20.