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Presunção de inocência e princípio da insignificância X crime patrimonial durante pandemia

A presunção de inocência é reitora no processo penal brasileiro, não podendo o imputado por suspeita de ação ou omissão criminosa ser diminuído moral, social e fisicamente.

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Atualizado em 30 de outubro de 2020 09:07

De ordem constitucional, o princípio do estado de inocência (não-culpabilidade), tem previsão legal no rol de direitos fundamentais previstos no artigo 5º, LVII da Constituição Federal Brasileira de 19881, bem como, respectivamente, na Declaração dos Direitos do Homem e Cidadão 17892 e Declaração Universal dos Direitos Humanos de 19483.

A presunção de inocência é reitora no processo penal brasileiro, não podendo o imputado por suspeita de ação ou omissão criminosa ser diminuído moral, social e fisicamente. Dessa maneira, deverá o acusado receber tratamento de inocente enquanto estiver pendente julgamento de mérito na ação penal. Somente após esta fase processual, poderá ser imposta e executada a pena.

Em complementação ao princípio da presunção de inocência, de caráter protetivo à liberdade individual, temos o princípio da insignificância, também chamado de princípio da bagatela, que tem por origem mais próxima o final da segunda guerra mundial - época em que, devido a pobreza gerada pela guerra, os delitos patrimoniais de pouca importância foram classificados como causa de exclusão de ilicitude da conduta delitiva, oportunizando aos acusados a absolvição perante a Justiça Criminal. Ante o exposto, observa-se a origem, razão da existência e classificação dos crimes de bagatela.

Pois bem, diante do cenário de pandemia do novo coronavírus, bem como de realidades como: o índice de desemprego crescente devido ao isolamento social, que apresenta a quantidade de 13,7 milhões de desempregados, segundo dados colhidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística em 20204; o aumento do preço dos itens culturalmente populares na cesta básica brasileira, conforme notícia publicada no Jornal Nacional do Brasil5 e recentes registros de saques à comércios na capital de São Paulo - SP6, torna-se instintiva a preocupação com furtos nos comércios em âmbito nacional.

Com isso, é de rigor preocupar-se nesse momento com os delitos patrimoniais de baixo valor, visto que crimes praticados nas dependências dos estabelecimentos comerciais, com baixo valor pecuniário dos objetos furtados, são considerados crimes de bagatela, mas que em grande quantidade de casos - muitas vezes reincidente de um mesmo indivíduo, geram alto prejuízo ao comércio. Tal situação, inclusive, foi apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, ocasião em que foi considerada como atípica, aplicando-se a bagatela também nos furtos reincidentes de baixo valor, conforme trecho do entendimento exmo. ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes, no habeas corpus 181.389/20, onde nega provimento ao recurso interposto pela Ministério Público Federal, sob o fundamento que "a reincidência em crime de furto não obsta o reconhecimento da aplicação da bagatela".

Por sua vez, reconhecida a bagatela, é excluída a tipicidade material da conduta delitiva perante a justiça, livrando-se solto o autor dos fatos, em atenção ao princípio da insignificância (bagatela) adotado pela Constituição Federal Brasileira de 1988 e aplicado pelo poder judiciário.

Vale dizer que, para a aplicação do princípio da insignificância em qualquer caso concreto, é necessário o atendimento a requisitos elementares, quais sejam: a mínima ofensividade da conduta do agente; a inexistência de periculosidade social do ato; o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e por fim, a inexpressividade da lesão provocada.

Nestes termos, considerando a realidade enfatizada neste artigo e a falta de segurança trazida aos estabelecimentos comerciais pelo princípio da insignificância, independentemente dos investimentos na área de prevenção e perdas, é de extrema importância que os fatos delitivos sejam noticiados à autoridade policial, visando a deflagração do procedimento de responsabilização penal do indivíduo, proporcionando o conhecimento da situação pelos órgãos competentes, a fim de que haja ampliação e setorização dos sistemas de segurança dos estabelecimentos comerciais.

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1 Art. 5º, LVII/CF1988: ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

2 Art. 9º: Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei.

3 Art. XI: Todo acusado de um ato delituoso tem direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.

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*Juliano Luca Domingos Pereira é integrante do escritório Trigueiro Fontes Advogados em São Paulo.

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