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Uma análise empírica do art. 927 do CPC: O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em perspectiva

Com a entrada em vigência da legislação processual iniciou-se debates acadêmicos sobre a natureza do rol do art. 927 do Código de Processo Civil.

terça-feira, 6 de outubro de 2020

Atualizado às 16:32

O que é um precedente? As decisões elencadas no rol do art. 927 do Código de Processo Civil são precedentes? São perguntas que vêm sendo debatidas entre a comunidade jurídica constantemente, contudo, sem chegar a um consenso. Com isso em vista, neste estudo, se buscou traduzir o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul sobre o instituto, através da análise empírica de decisões judiciais prolatadas no ano de 2019.

Com a entrada em vigência da legislação processual iniciou-se debates acadêmicos sobre a natureza do rol do art. 927 do Código de Processo Civil. Por um lado, as decisões elencadas são meramente exemplificativas e nisto implica a não taxatividade do rol, razão pela qual a disposição se mostra desnecessária para o sistema de precedentes.1 Por outro, o texto do art. 927 do Código de Processo Civil é inconstitucional, isso porque, a legislação federal atribui eficácia vinculante a pronunciamentos judiciais não previstos na Constituição Federal.2 Ainda, há entendimento que um sistema racional de precedentes se impõe a estrita observância ao texto legal, ao passo que todos os pronunciamentos judiciais previstos no dispositivo são precedentes em algum grau de vinculação, sob o ponto de vista formal.3

Em termos quantitativos, a pesquisa entrega resultados, pois foi feita com a análise de 254 (duzentas e cinquenta e quatro) decisões. Durante a investigação, se pode aferir que em nenhuma decisão ocorreu a conceituação do termo precedente. Se constata que, em 112 (cento e doze) decisões, o termo foi usado de forma indiscriminada, em referência a julgados anteriores proferidos pelo próprio Tribunal de Justiça ou pelas Cortes de Vértice. Ademais, o art. 927 do Código de Processo Civil foi mencionado em 103 (cento e três) oportunidades, dentre o escopo do estudo, sendo que em todas lhe fora atribuída força vinculante obrigatória, desde que as causas comportem a aplicação das decisões de seu rol. Cumpre destacar que, o art. 927 do Código de Processo Civil obteve acurácia de 65% dentro das decisões que abrangeram a pesquisa.

Ademais, se demonstra que não há qualquer indício de que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul entenda os pronunciamentos do art. 927 do Código de Processo Civil como persuasivos, pois em nenhuma decisão houve fundamentação neste sentido. Não bastasse, dois terços das decisões, dentro das que abrangem a pesquisa, advogam pela observância obrigatória aos pronunciamentos judiciais previstos no dispositivo legal analisado.

Sob a perspectiva qualitativa, considerando o objetivo e o tema proposto nesta pesquisa, as atenções quando da espreita dos julgados se voltaram aos fundamentos aduzidos para vinculação ou não à determinada decisão, à forma com que os desembargadores manusearam os termos pertinentes, bem como aos dispositivos legais mencionados.

Em primeiro lugar, foi constatado que as Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça, quando submetidas à discussão de direito com prévio entendimento fixado nas Cortes Superiores, observam o art. 927 do Código de Processo Civil. A constatação decorre da menção expressa nas fundamentações dos diferentes órgãos fracionários analisados, por exemplo, em trecho do acórdão do agravo de instrumento 70081591265 da 9ª Câmara Cível, resta sedimentado que o "Colegiado passa, então, a adotar em observância aos próprios preceitos dos artigos 926 e 927, ambos do NCPC". Nesta mesma linha, a decisão prolatada no acórdão da apelação cível 70079720835 da 23ª Câmara Cível está fundamentada somente em entendimento fixado em recurso especial repetitivo, considerando que "O referido entendimento é de observância obrigatória pelos juízes e tribunais (CPC, art. 927, III)".

Ademais, não há qualquer tese jurídica percebida nas decisões, sejam monocráticas ou colegiadas, no sentido de inobservância aos pronunciamentos judiciais do art. 927 do Código de Processo Civil. Por outro lado, pode-se aferir que, em caso de não aplicação de decisão prevista no rol, há a distinção no caso concreto, isso é, são postas as razões pelas quais o pronunciamento judicial de observância obrigatória não merece aplicação. Esse cenário pode ser verificado na fundamentação da apelação cível 70060318516 da 3ª Câmara Cível, pois deixa de se vincular ao julgamento do recurso especial 1.336.026-PE (tema 880) em razão da modulação dos efeitos no julgamento dos embargos de declaração no recurso especial 1.336.026-PE, fulcro no art. 927, §3º do Código de Processo Civil. Ainda, em matéria de direito estritamente semelhante, a 25ª Câmara Cível, através do agravo de instrumento 70072865793, afastou a aplicação do recurso especial 1.336.026-PE em face da modulação dos efeitos.

Não obstante, ainda que o Tribunal de Justiça em suas Câmaras Cíveis esteja vinculado aos pronunciamentos judiciais previstos no art. 927 do Código de Processo Civil, através das razões em cada acórdão analisado se afere que o termo precedente é utilizado de forma indistinta, ou seja, se trata de qualquer decisão anterior prolatada, seja monocrática ou colegiada, proferida pelo próprio tribunal ou Cortes Superiores. A expressão 'precedentes jurisprudenciais' foi de uso corriqueiro nas fundamentações, em regra, logo após a menção a precedentes ou precedentes jurisprudenciais são colacionadas ementas de casos anteriores, sem, contudo, correlacioná-las ao caso concreto. Ou ainda, a ementa da decisão expunha a expressão 'precedentes deste TJRS' e/ou 'precedentes jurisprudenciais' e/ou 'precedentes' e ao analisar a fundamentação se percebe que a ementa se refere à jurisprudência ou a decisões anteriores do próprio órgão.

Portanto, a pesquisa de forma objetiva busca verificar como o art. 927 do Código de Processo Civil é recepcionado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, posto que sobressalta, no sistema jurídico brasileiro, a discussão sobre a natureza dos pronunciamentos nele presentes e se deveriam ser considerados precedentes. Diante disso, o estudo teve como objetivo geral analisar as decisões proferidas pelas Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul para extrair o entendimento majoritário da Corte sobre os precedentes judiciais e art. 927 do Código de Processo Civil. Em atenção aos objetivos e ao problema de pesquisa, o método de abordagem permitiu atingir resultados quantitativos para a partir deles concretizar a análise empírica das decisões judiciais localizadas dentro dos termos de pesquisa.

Destarte, considerando que as Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul se vinculam aos pronunciamentos judiciais do art. 927 do Código de Processo Civil; considerando que as Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul não afastaram a aplicação dos pronunciamentos judiciais do art. 927 do Código de Processo Civil sem que houvesse justificação; considerando que o termo precedente é utilizado de forma indiscriminada e sem conceituação teórica.

A pesquisa, através do modo qualitativo e quantitativo, conclui que o Tribunal de Justiça se vincula aos pronunciamentos judiciais previstos no art. 927 do Código de Processo Civil efetuando a distinção e explicitando as razões de decidir, bem como não discrimina a conceituação de precedente judicial e utiliza-o em referência a qualquer decisão anterior.

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1 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel Francisco. Novo curso de processo civil : tutela dos direitos mediante procedimento comum. vol. 2, 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017.
2 NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil.  São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.
3 ZANETI JR, Hermes. O valor vinculante dos precedentes. Salvador: JusPodvim, 2019.

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 *Diogo Alvarenga Saraiva é graduando em Direito pelo IBGEN Business School. Membro do Grupo de Pesquisa - UFRGS "Processo Civil e o Estado Constitucional" e Grupo de Pesquisa - ESA/OABRS "Processo Civil". Tem experiência na área de Direito, com ênfase no Direito Processual Civil com foco na resolução estratégica de conflitos judiciais cíveis. Atualmente exerce cargo comissionado no Governo do Estado do Rio Grande do Sul, com atuação na assessoria jurídica do Instituto de Assistência à Saúde dos Servidores Públicos do Rio Grande do Sul.

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