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A alteração desnecessária na legítima defesa feita pelo pacote anticrime

A lei 13.964/19 incluiu o parágrafo único no artigo 25 do Código Penal, destacando situação em que o agente de segurança pública estaria inserido na legítima defesa.

terça-feira, 6 de outubro de 2020

Atualizado às 11:23

Conforme previsto no artigo 25, caput do Código Penal, considera-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

A legítima defesa é prevista como causa excludente de ilicitude. Trata-se de uma norma permissiva, ou seja, que autoriza, desde que cumpridos certos requisitos, a prática de um comportamento que, a princípio, é considerado crime, afastando a previsão de punição para aquele ato.

A Lei 13.964/19, conhecida popularmente como "Pacote Anticrime", incluiu o parágrafo único no artigo 25 do Código Penal, determinando que considera-se em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes, desde que preenchidos os requisitos previstos no caput.

A grande discussão nesse caso é: essa alteração era necessária? A resposta dessa é pergunta é não. É até estranho falar em modificação, melhor seria dizer que a nova lei apenas acrescentou um parágrafo destacando uma situação que já era abarcada pelo caput.

Ora, antes da nova lei, caso um agente de segurança pública matasse alguém que estivesse mantendo uma vítima refém com uma arma, utilizando moderadamente dos meios necessários, estaria automaticamente incluso na excludente de legítima defesa. Com a alteração, nada mudou.

Isso porque, a legítima defesa pode ser própria, ou seja, a agressão é ao seu próprio direito ou também pode ser "de terceiro". Nesse caso, o bem jurídico a ser protegido é alheio, como no exemplo mencionado. Em ambos os casos, a consequência é a mesma, qual seja, a exclusão da ilicitude e, por consequência, do crime.

Importante ressaltar que, caso seja possível defender a vítima mantida refém, sem matar o agente, esse deve ser o meio utilizado.

Por que, então, foi feita a inclusão do parágrafo único? Bom, o discurso punitivista de campanha da última eleição e a pauta da segurança pública defendida pelo atual governo justificam a mudança, a fim de criar uma ideia ilusória de maior proteção para aqueles que trabalham para garantir a segurança da sociedade.

A proposta inicial enviada pelo ex-Ministro da Justiça Sérgio Moro contava com mais uma alteração no artigo 25 do Código Penal, qual seja a de que "o agente policial ou de segurança pública que, em conflito armado ou em risco iminente de conflito armado, previne injusta e iminente agressão a direito seu ou de outrem" também estaria em hipótese de legítima defesa. Além disso, também previa a inclusão do §2º no artigo 23 do mesmo diploma legal, positivando que o juiz poderia reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção.

Obviamente, muitas foram as críticas, no sentido de que, as previsões isentariam de pena o policial que mata em serviço em qualquer circunstância, banalizando a questão. Ora, em caso de excesso o agente deve responder por ele, sendo doloso ou culposo (nos casos em que houver previsão de culpa). Como previsto na proposta original, me parece que se pretendia evitar a punição por esses excessos. Felizmente, ambas as previsões não passaram no Congresso Nacional.

Pela leitura do que foi aprovado e está agora previsto no Código Penal, vemos que a aplicação do parágrafo único do artigo 25, não deve ser automática em todos os casos, é necessário que sejam observados os requisitos previstos no caput, quais sejam: repulsa a uma agressão injusta, atual ou iminente; no caso, o direito deve ser alheio; uso moderado dos meios necessários e o elemento subjetivo consistente no "animus defendendi".

Logo, como visto, no que concerne à legítima defesa, as propostas mais polêmicas e que poderiam se tornar uma verdadeira "licença para matar" não passaram, de modo que, desde que seja feito exatamente como está previsto na lei, apesar de ser uma previsão desnecessária e redundante, acredito que não teremos problemas. Basta saber como a nova alteração será interpretada e aplicada nos casos concretos pelos Tribunais.

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 *Letícia Barreto Coelho é advogada e especialista em Advocacia Criminal pela Escola Superior de Advocacia da OAB/MG.

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