STF define, em repercussão geral, a constitucionalidade da inclusão de valores retidos por administradoras de cartões de crédito na base de cálculo do PIS e da Cofins
A recente decisão do STF, apesar de trazer uma definição sobre a questão para os contribuintes que utilizam cartões de crédito e débito em suas operações, é mais um capítulo que envolve as discussões do conceito de receita sob a ótica da Suprema Corte.
terça-feira, 29 de setembro de 2020
Atualizado às 08:39
Em 4/9/20, o STF concluiu a análise de mais um dos temas que envolvem o conceito de receita para a definição da base de cálculo da contribuição ao PIS e da Cofins. Ao julgar o RE 1.049.811 (Tema 1024), sob a sistemática da repercussão geral, o STF definiu que devem ser incluídos os valores retidos pelas administradoras de cartões de crédito, a título de taxa de administração, na base de cálculo das contribuições devidas por empresas que utilizam esses meios de pagamentos no exercício das suas atividades.
Por seis votos a quatro, foi sugerida a fixação da tese de que "É constitucional a inclusão dos valores retidos pelas administradoras de cartões na base de cálculo das contribuições ao PIS e da COFINS devidas por empresa que recebe pagamentos por meio de cartões de crédito e débito".
Sob a ótica dos contribuintes, a inclusão desses valores tem como consequência a ampliação indevida da base de cálculo do PIS e da Cofins. Isso porque, se os valores são retidos antes do repasse ao contribuinte, esse montante não deveria ser receita do vendedor da mercadoria ou do serviço, mas da empresa de administração de cartões.
Interpretação diferente desta violaria o princípio da capacidade contributiva, na visão dos contribuintes, na medida em que eles seriam responsáveis pelo pagamento de tributos incidentes sobre valores que são receita de terceiros e não receita deles próprios.
Por outro lado, o Fisco seguiu na linha de interpretação diversa no sentido de que o valor total da compra, recebido pela empresa que faz a administração de cartões, é a receita total auferida pelo contribuinte, sendo a taxa de administração, retida pela empresa que recebe o valor da compra, mero custo operacional do contribuinte.
Sob a ótica do Fisco, é opção do contribuinte cobrar as suas vendas mediante cartões de crédito ou débito com a finalidade de facilitar a venda da mercadoria ou do serviço. Assim, sendo receita do contribuinte o valor total arrecadado pelas administradoras de cartões de crédito, o PIS e a Cofins seriam devidos sobre o valor total da venda, incluindo a taxa de administração retida pela administradora de cartões.
Ao analisar a discussão, o Ministro Marco Aurélio, relator do processo, reconheceu que "Se não há o aporte, ao patrimônio da empresa, da quantia, surge descabida a imposição tributária". Reiterando o seu posicionamento adotado em julgamentos históricos do STF, como é o caso do RE 346.084 (ampliação da base de cálculo do PIS e da Cofins pela Lei 9.718/98) e RE 240.785 e RE 574.706 (exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins), o Ministro destacou a impossibilidade de tributação pelo PIS e pela Cofins de valores que não integram o patrimônio do contribuinte.
Ao final do seu voto, o Ministro Marco Aurélio concluiu que eventual exigência do PIS e da Cofins sobre o montante retido pelas administradoras de cartão de crédito implicaria dupla tributação e violação do princípio da capacidade contributiva.
Na contramão desse entendimento, o Ministro Alexandre de Moraes, que votou a favor do Fisco, entendeu que o resultado de vendas de mercadorias ou da prestação de serviços não perde a natureza jurídica de receita em razão do destino que a empresa dá ao seu resultado financeiro. Com fundamento nesse racional, o Ministro concluiu que como não existe norma que autorize a exclusão de custos da base de cálculo do PIS e da Cofins, caso das taxas retidas pelas administradoras de cartões de crédito e débito, seria constitucional a tributação desses valores por ambas as contribuições.
Chegando à mesma conclusão, o Ministro Edson Fachin reconheceu que, embora não haja incremento patrimonial, as taxas das operadoras de cartões de crédito deverão integrar a receita efetiva do contribuinte, pois irão gerar oscilação patrimonial positiva, independentemente da existência de obrigação contratual assumida perante terceiro, correspondente ao pagamento da taxa retida pela administradora de cartões.
Por fim, o Ministro Luiz Fux apresentou seu voto destacando, em primeiro lugar, que essa discussão é diversa daquela analisada pelo Plenário do STF no julgamento do RE 574.706 e que tratou da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. No entendimento do Ministro, os valores retidos por administradoras de cartões de crédito e débito decorrem de obrigação contratual, enquanto que o ICMS naquela situação é obrigação tributária principal decorrente de lei.
Por esse motivo, o Ministro Luiz Fux entendeu pela possibilidade da inclusão dos valores na base com a consequente tributação pelo PIS e pela COFINS dos montantes retidos pelas administradoras de cartões de crédito.
Portanto, parece-nos que a natureza contratual dos valores retidos por empresas administradoras de cartões de crédito conduziu o entendimento do STF nesse caso.
Por outro lado, a nosso ver, o resultado do julgamento evidencia a natureza jurídica de despesa necessária das taxas retidas por administradoras de cartões de crédito e débito. Dessa forma, a decisão reforça o direito ao crédito de PIS e Cofins sobre tais valores, na medida em que os serviços de cartões de crédito devem ser reconhecidos como insumos, nos termos dos artigos 3º, inciso II, das Leis 10.833/03 e 10.637/02.
Como conclusão, a recente decisão do STF, apesar de trazer uma definição sobre a questão para os contribuintes que utilizam cartões de crédito e débito em suas operações, é mais um capítulo que envolve as discussões do conceito de receita sob a ótica da Suprema Corte.
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*Tércio Chiavassa é sócio da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Marco Aurelio Louzinha Betoni é associado da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados e cofundador do Grupo de Estudos de Política Tributária (GEPT).
*Mariana Brandão Fantini é assistente da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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