Limbo jurídico previdenciário e trabalhista - Responsabilidade
Algumas empresas tem realizado o pagamento dos salários referentes ao período do limbo previdenciário, e ajuizado ação contra o INSS para tentar o ressarcimento.
terça-feira, 29 de setembro de 2020
Atualizado às 08:16
A doutrina denomina limbo jurídico previdenciário e trabalhista, o período compreendido entre a negativa da previdência social em manter o benefício, devido à doença ou acidente do trabalho, e o reconhecimento de inaptidão por parte do médico do empregador para autorizar o retorno do empregado ao trabalho para desempenhar as suas funções.
Dessa forma, existe um verdadeiro conflito.
O médico do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) entende que o segurado não necessita de permanecer em gozo do benefício, motivo pelo qual encontra habilitado para trabalhar.
De outro lado, o médico da empresa posiciona no sentido de que o emprego não pode retornar, porque não possui condições para executar as suas atividades.
Diante desse impasse, a autarquia previdenciária não se vê responsável em conceder o benefício. O empregador na ausência da principal contrapartida do empregado na relação de emprego, que é a prestação dos serviços, não se vê responsável pelo pagamento dos salários.
Já o empregado, consequentemente, fica desguarnecido, sem receber o benefício previdenciário ou o salário.
Em razão desse contexto, podem surgir alguns desdobramentos, sendo que dentre eles destacamos.
O empregado ajuíza ação contra o empregador reivindicando a responsabilização pelos salários, sendo, ainda, comum nessa circunstância, deduzir pretensão de declaração de rescisão indireta e reparação por danos morais.
A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho - TST - possui julgados em todas as suas Turmas responsabilizando o empregador, enquanto perdurar a situação de indefinição. Confira-se a título de exemplo:
RECURSO DE REVISTA. LEI 13.467/17. LIMBO PREVIDENCIÁRIO. EMPREGADO CONSIDERADO APTO PELO INSS E INAPTO PELO EMPREGADOR. PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE A ALTA PREVIDENCIÁRIA E O RETORNO AO TRABALHO. TRANSCENDÊNCIA. O entendimento desta c. Corte Superior é de que é responsabilidade do reclamado o pagamento de salários ao empregado impedido de retornar ao trabalho pelo empregador, que o considerou inapto, não obstante a cessação do benefício e alta previdenciária. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-1675- 64.2017.5.12.0059, 6ª turma, relator ministro Aloysio Correa da Veiga, DEJT 13/3/20).
A principal justificativa para assim decidir, encontra-se embasada no artigo 476, da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT. Sustenta-se que ao terminar o benefício previdenciário o contrato de trabalho volta a gerar todos os efeitos, devendo o empregado prestar serviços e o empregador pagar salários.
E se o empregado está impossibilitado de retornar às suas atividades anteriores, devido ao posicionamento do médico da empresa, a primeira alternativa para evitar a responsabilização, se for possível e viável, é realocar ou encaminhar o trabalhador para reabilitação ou readaptação em função compatível com a sua condição pessoal, tal como previsto 89, da lei 8.213/91.
Nessa direção, o ministro Mauricio Godinho Delgado, recentemente mencionou em julgado de sua relatoria:
Dessa forma, cabia ao empregador, na incerteza quanto à aptidão da Reclamante para o exercício de suas funções, realocá-la em atividade compatível com suas limitações físicas, e não puramente recusar seu retorno ao trabalho - ante o seu demonstrado interesse em voltar às atividades laborais e diante da divergência entre as conclusões médicas do INSS (consubstanciada na concessão da alta previdenciária) e a do médico da própria empresa (que a considerou inapta para retornar). Isso porque, segundo o ordenamento jurídico pátrio, o empregador também é responsável pela manutenção e respeito aos direitos fundamentais do empregado, devendo zelar pela afirmação de sua dignidade e integração no contexto social - e a readequação de suas funções no processo produtivo da empresa faz parte deste mister. (Ag-AIRR-1000483-39.2016.5.02.0012, 3ª turma, relator ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 29/5/20).
De todo modo, recomenda-se que após o resultado da perícia do INSS, que fez cessar o benefício ou concluiu pela impossibilidade da reabilitação, o empregado munido de laudo e exames médicos, busque a reconsideração da decisão da autarquia e, posteriormente se necessário, ajuíze a competente ação para tentar o restabelecimento do benefício, com as repercussões financeiras decorrentes.
Vale realçar que algumas empresas tem realizado o pagamento dos salários referentes ao período do limbo previdenciário, e ajuizado ação contra o INSS para tentar o ressarcimento.
O que pode observar é que diante do posicionamento que vem sendo adotado pelo Tribunal Superior do Trabalho, no sentido de responsabilizar o empregador, em regra, este deve adotar as cautelas devidas para evitar o passivo trabalhista ou, pelo menos, que tenha meios de buscar o reembolso de eventuais quantias dispendidas.
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*Orlando José de Almeida é sócio advogado de Homero Costa Advogados.
*Bernardo Gasparini Furman é advogado associado de Homero Costa Advogados.