É crime declarar e não recolher o ICMS, em tempo de pandemia?
O empresário que deixa de recolher o ICMS cobrado, de forma contumaz e com dolo pratica crime, segundo decisão do STF. Cabe ao contribuinte, em meio à pandemia, se acautelar, mantendo em dia sua escrita fiscal.
terça-feira, 4 de agosto de 2020
Atualizado em 5 de agosto de 2020 07:25
Em decisão polêmica e conflitante, o STF considerou crime a atitude do empresário que declara e não recolhe o ICMS. (ver artigo publicado no Jus Navigandi: Prisão por débitos tributários - crime por falta de pagamento do icms declarado - decisões conflitantes.)
Acontece que a tese acolhida pelo STF, no Recurso Ordinário em Habeas Corpus RHC 163334, em Plenário, decidiu, por maioria que o contribuinte que deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, de forma contumaz e com dolo pratica crime.
Decisão: O Tribunal, por maioria, negou provimento ao recurso ordinário, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. Revogada a liminar anteriormente concedida. Em seguida, por maioria, fixou-se a seguinte tese: "O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/1990", vencido o Ministro Marco Aurélio. Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello. Presidência do Ministro Dias Toffoli. Plenário, 18/12/19.
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No caso, tal decisão foi em decorrência de um caso concreto que chegou ao Tribunal, não sendo de repercussão geral, portanto não aplicável a outros casos.
Por outro lado, a tipificação de crime é objeto de lei federal e não compete ao STF tal tarefa, portanto considerar crime a conduta do empresário que declara suas obrigações e não as adimple como crime, foge à sua competência de Corte Constitucional.
A referida decisão, considerou que essa prática de não recolher o ICMS seja "contumaz e com dolo", ou melhor, que aconteça de forma costumeira e reiterada e haja a vontade de o fazê-lo, para que se configure como crime a apropriação. Sem esses dois elementos presentes no ato de se apropriar, não havia a incidência de crime.
Ora, considerar crime o simples inadimplemento, estaríamos diante de uma prisão por dívida, inadmissível em nosso ordenamento jurídico e condenada pelos tratados de Direitos Humanos dos quais o Brasil é signatário.
Diante do cenário atual de confinamento em que houve um grande impacto no exercício das atividades comerciais e econômicas, decorrentes de medidas impostas por normas governamentais, momentaneamente o empresariado se viu em um impasse que redundou na redução drástica de seus recursos e muitas vezes não encontra outra saída, a não ser deixar de recolher os tributos para manter a sobrevivência de seu negócio e a de famílias que vivem dos recursos gerados pelo empreendimento.
Então, se o empresário, em sua trajetória empresarial, cumpre regularmente com suas obrigações tributárias e diante desta avassaladora pandemia, deixa de pagar os impostos, como a única opção para a sobrevivência de seu negócio, essa inadimplência não pode ser considerada crime, porque sua conduta não decorre de um ato costumeiro, contumaz e nem é fruto de sua vontade.
Convém seguir, por cautela, a opinião dos causídicos Drª Monica Matsuno de Magalhães e Drª João Vinícius Manssur, estampada no artigo: "A precipitada criminalização da apropriação indébita de ICMS", publicado na Revista Consultor Jurídico, a saber:
"Por fim, para evitar a arbitrária aplicação da tese fixada pelo STF no final de 2019, é indispensável que o contribuinte mantenha a sua escrituração contábil e fiscal em dia, para demonstrar a ausência de dolo em caso de eventual não recolhimento de tributos." Fonte: Clique aqui.
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*Marco Aurélio Bicalho de Abreu Chagas é advogado tributarista, assessor jurídico da ASSOCIAÇÃO COMERCIAL E EMPRESARIAL DE MINAS - ACMinas e Consultor home-office.