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Da desnecessidade do arrolamento prévio de testemunhas para audiência de instrução e julgamento

A preclusão não decorre da não qualificação da testemunha ou de seus elementos de identificação, mas sim, da omissão do desejo de ouvi-las a tempo e modo.

sexta-feira, 31 de julho de 2020

Atualizado às 12:19

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De regra da confecção da exordial já existe o singelo pedido do autor pela oitiva de testemunhas a fim de comprovar o caso concreto. Daí surge à hesitação: há necessidade de qualificação prévia dessas testemunhas ou elas poderão aparecer espontaneamente à audiência de instrução e julgamento?

Numa determinada pendenga o autor já havia requerido a oitiva de testemunhas na inicial, não obstante o magistrado em cada despacho determinar a qualificação das testemunhas em observação ao Art. 450 do Código de Processo Civil.  

O autor a fim de manter a estratégia sempre peticionava em resposta a cada despacho demonstrando o desejo de ouvir as testemunhas, mas, sem qualificá-las.

Iniciando-se a fase saneadora o juízo desembaralhando os autos a fim de viabilizar a instrução asseverou no despacho saneador: "Concedo às partes o prazo 10 (dez) dias para a apresentação do rol de testemunhas em observância ao Art. 450 d0 CPC sob pena de preclusão (...)".

Diante da insistência do juízo em saber previamente a qualificação das testemunhas o autor a fim de evitar maior imbróglio inseriu a devida qualificação, oportunidade em que os causídicos do réu manejaram Agravo de Instrumento em face do despacho saneador requerendo a sustação de seus efeitos sob a alegação de que o despacho reabrira o prazo para indicação de testemunhas conquanto referido ato processual já se encontrava precluso.  

Assiste razão os argumentos dos agravantes? Vejamos o que diz o dispositivo do Art. 450 do nosso Diploma Processual Civil.

Art. 450. O rol de testemunhas conterá, sempre que possível, o nome, a profissão, o estado civil, a idade, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas, o número de registro de identidade e o endereço completo da residência e do local de trabalho. 

Nota-se que referido dispositivo legal prevê uma circunstância de possibilidade e não de obrigatoriedade no que toca a identificação categórica das testemunhas, daí a possibilidade da sua não qualificação no momento imediato determinado pela decisão; inclusive, há equivoco da autoridade judiciária ao exigir a qualificação das testemunhas.

Assim, nada impede que as testemunhas compareçam pessoalmente e voluntariamente no dia da audiência e sejam qualificadas pelo juízo, é dizer, o pretérito aviso da parte no sentido de que se quer ouvir testemunhas já afasta qualquer efeito preclusivo, pois, a preclusão não está atrelada a identificação da testemunha, mas sim, na omissão de não querer utilizar-se desse meio de prova.

Portanto, a não qualificação da testemunha de modo prévio, mas, sim o desejo apresentado de querer ouvi-las é condizente com o nosso sistema processual, já que o próprio Diploma Processual prevê "sempre que possível", demonstrando a não obrigatoriedade de seus elementos identificadores, até porque conforme discorrido, comparecendo pessoalmente e voluntariamente poderá ser qualificada pelo juízo, causando efeito surpresa à parte contrária que poderá invocar a contradita caso exista interesse fundamentado para tanto.

Assim, não há se falar que o despacho saneador reabrira o prazo processual, pois, os despachos pretéritos que insistiam na qualificação das testemunhas - além de ser um ato prescindível - não possuía o condão de encerrar o referido ato processual acarretando a preclusão, eis que o momento adequado para indicação das testemunhas - além de ser a inicial - tem como limite o despacho saneador, ou seja, diante da insistência do juízo só viera o autor a qualificar as testemunhas, mas, desde a exordial já manifestara o desejo de utiliza-se desse meio de prova, o que por óbvio afasta a preclusão.

No escólio de Humberto Theodoro Junior temos o seguinte. Vejamos:

(...)O momento adequado para requerer a prova testemunhal é a petição inicial (NCPC, art. 319, VI),228 para o autor, ou a contestação, para o réu (art. 336), ou então na fase de especificação de prova, durante as providências preliminares (art. 348). É na decisão de saneamento que o juiz admitirá, ou não, essa espécie de prova (art. 357, II). Entende-se, porém, implicitamente deferida a prova testemunhal previamente requerida quando o juiz simplesmente designa a audiência de instrução e julgamento. A parte que desejar produzir essa prova deverá, no prazo que o juiz fixar na decisão de saneamento, depositar, em Cartório, o respectivo rol, no qual figurarão nomes, profissões, estado civil, idade, o número de cadastro de pessoa física e do registro de identidade e endereço completo da residência e local de trabalho das testemunhas a ouvir (arts. 357, § 4º, e 450). (...) Tem, outrossim, entendido a jurisprudência que a falta de requerimento ou especificação da prova testemunhal pela parte, antes do saneador, não a impede de arrolar testemunhas quando o juiz designa audiência de instrução e julgamento, desde, é claro, que não tenha havido expresso indeferimento desse tipo de prova. (Humberto Theodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, vol. I, 56ª edição, revista atualizada e ampliada, páginas 1255-1256).

Daí, a preclusão não decorre da não qualificação da testemunha ou de seus elementos de identificação, mas sim, da omissão do desejo de ouvi-las a tempo e modo, o que não ocorrera no caso concreto.

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*Carlos Henrique de Souza Pimenta é advogado no escritório Fábio Berti Advogados.

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