Requisitos para a colaboração premiada
Para fixar os requisitos para a admissão da delação premiada, dever-se-á observar as normas contidas em todas as leis que a invocam, devendo o hermeneuta se valer de uma interpretação sistêmica acerca das mesmas.
quarta-feira, 29 de julho de 2020
Atualizado às 12:28
No Brasil não há padronização no tratamento do direito premial, o qual é objeto de considerações espalhadas em peças nada conexas como a Lei dos Crimes Hediondos, a Lei de Repressão ao Crime Organizado, a Lei contra o Sistema Financeiro e Nacional, a Lei dos Crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e contra as Relações de Consumo, a Lei de Lavagem de Capitais e a Lei de Proteção às Vítimas e às Testemunhas.
Diante desta realidade, para fixar os requisitos para a admissão da delação premiada, dever-se-á observar as normas contidas em todas as leis que a invocam, devendo o hermeneuta se valer de uma interpretação sistêmica acerca das mesmas.
Os requisitos que serão aqui analisados são os da lei 12.850/13, em razão da aplicação da delação premiada deve centrar-se nela, dado o seu caráter amplo e mais benéfico em relação às demais legislações. Contudo, as peculiaridades de cada lei que dispõe sobre o instituto deverão ser respeitadas.
Analisando a Lei de Organização Criminosa apreende-se ao Colaborador o seu direito constitucional ao silêncio, pois a colaboração implicará renúncia a esse direito com o compromisso legal de dizer a verdade, os benefícios previstos em lei, e a completude e veracidade dos fatos ditos na colaboração.
Os requisitos para os benefícios concedidos no acordo de colaboração premiada, ocorrem desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos resultados acerca da identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas, a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa, a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa, a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa, a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.
A lei não condiciona a presença de todos os requisitos para que haja tratativas e assinatura de acordo de colaboração, exige-se a observância dos seguintes requisitos: voluntariedade da colaboração com o processo criminal ou investigação; resultado que atinja a identificação dos demais coautores ou partícipes, ou a localização da vítima ou a recuperação total ou parcial do produto do crime.
A diferença entre tais termos é fundamental. No ato espontâneo a iniciativa de praticá-lo emana do próprio colaborador, é um ato que nasce unicamente da vontade do agente sem a interferência de terceiros. Já no ato voluntário não se exige que a ideia de realizá-lo tenha partido do próprio agente, basta que ele se efetive sem coação, sendo irrelevante a causa que o motivou.
Não se exige a espontaneidade no ato da colaboração, vez que o legislador, intencionalmente, utilizou a expressão 'voluntariamente', não se exigindo que a ideia de realizá-lo tenha partido do próprio agente, sendo irrelevante a causa que o motivou. É o que depreende-se do voto do Ministro Nefi Cordeiro, no acórdão do REsp 1.454.679/SC.
As declarações do colaborador terão que demonstrar importância em relação ao fato objeto da investigação ou do processo, resultando das mesmas a possibilidade de identificação dos demais coautores ou partícipes do crime, a localização da vítima, a recuperação total ou parcial do produto do crime.
Em vista disso, deve-se buscar nas declarações do delator, informações que possam contribuir com o interesse da Justiça, devendo ser vedada qualquer iniciativa de "acordo" que não vislumbre sinais de relevância em relação ao fato como, por exemplo, quando os dados prestados pelo corréu já foram alcançados através de outros meios de obtenção de prova.
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*Fernanda Pereira Machado é advogada criminalista - Mestre em Direito Econômico, Pós graduada em Direito Penal Econômico e Criminalidade Complexa. Pós graduanda em inteligência aplicada e investigação criminal e pós graduada em Direito Tributário.