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A vulnerabilidade de fornecedores e serviços diante do cenário do covid-19

Na tentativa de equilibrar aqueles serviços que foram adquiridos e não puderam e nem poderão ser desfrutados em um futuro próximo, em razão da pandemia do covid-19, é que foi editada a MP 948.

terça-feira, 7 de julho de 2020

Atualizado às 13:46

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Na atual situação atual em que o mundo se encontra, pode-se dizer que ninguém estava preparado para isso. É como se o coronavírus tivesse devastado o mundo de uma forma que ninguém estava preparado, seja de forma física, mental e, como não poderia deixar de ser, econômica.

É muito difícil encontrar uma pessoa, seja física, ou jurídica, que tenha conseguido fazer uma reserva financeira suficiente a ponto de lhe assegurar por um período de meses e sem qualquer previsão para término, que é o caso que se vivencia com essa pandemia.

Diante dessa situação de desespero, que apesar de possível nunca foi esperada, é normal que Executivo, Legislativo e Judiciário se encontrem em uma situação confusa a ponto de confrontar as atuais leis e tentar adequá-las, ainda que em caráter provisório, em uma tentativa de um equilíbrio situacional.

No universo do Direito Privado não poderia ser diferente, afinal de contas o consumo de toda ordem continua. Na tentativa de equilibrar aqueles serviços que foram adquiridos e não puderam e nem poderão ser desfrutados em um futuro próximo, em razão da pandemia do covid-19, é que foi editada a MP 9481.

Por certo, toda legislação que é criada é passiva de lacunas e, como bem apontado por Juristas2, tanto na MP 948, quanto na MP 9253, os consumidores, ao contrário do que pretende e preconiza todo o Código de Defesa do Consumidor, foram de fato um pouco preteridos em razão dos fornecedores.

Impactos relevantes trazidos pelas medidas a serem ressaltados são que, de acordo com a medida provisória 948 o consumidor precisará observar o prazo de 90 (noventa) dias, contados do último 8 de abril, para reaverem cancelamento de serviços, reservas e eventos, em contrapartida ao prazo de doze meses de devolução de valores concedidos aos fornecedores, contados do encerramento da situação de calamidade pública. E quanto à medida provisória 925, essa encoraja os consumidores a não pedirem o reembolso, mas sim a reutilização de crédito, sob pena de incidência de multas contratuais já previstas e prazo de doze meses para devolução dos valores.

É extremamente importante a reflexão trazida quanto aos cuidados que o consumidor deverá ter nesse período, sob pena de sair no prejuízo, apesar de ser uma situação que não foi gerada por este último, mas foi vítima de uma pandemia.

Apesar dos esforços em apontar uma situação frágil que se encontra o consumidor, a conclusão que se chega, no entanto, é que claramente essas medidas provisórias tentam equilibrar a situação entre fornecedor e consumidor, isso porque é certo que os consumidores foram vítimas dessa pandemia, mas da mesma forma os fornecedores. É necessário, ainda assim, ter um olhar mais compassivo ao fornecedor também.

Digamos que todos os passageiros que tenham passagens adquiridas até dezembro de 2020 resolvam cancelar e solicitar o reembolso dos valores de seus bilhetes, em razão da insegurança trazida pela pandemia. Como essas empresas aéreas vão sobreviver? Por trás dessas empresas, existem uma série de pessoas físicas, provedores de família, que não terão condição de sustentar a si ou os seus, já que suas empresas irão falir e não terão como pagar a eles.

Da mesma forma o mercado de eventos, digamos que todos os casamentos até dezembro de 2020 sejam cancelados, não remarcados. A quantidade de fornecedores envolvidos, de todos os tamanhos, desde ateliês de vestidos de noiva até a pequena doceira, como é que todos esses fornecedores, que trabalham com um capital de giro terão condições de indenizar todos os consumidores e manter os seus auxiliares? Esses auxiliares são provedores de família, existe todo um círculo de pessoas que serão afetadas diante da manutenção do direito do consumidor de cancelar e ter o direito de indenização garantido, caso não observada a boa-fé.

O cenário proposto, portanto, pela MP 948, no qual garante aos fornecedores o prazo de doze meses após o fim da calamidade pública para devolução dos valores, não parece tão injusto, tendo em vista que seria um prazo razoável para essas empresas se reerguerem e formarem um novo capital, já que não se sabe por quanto tempo a pandemia irá durar e nem é possível mensurar o prejuízo que irá trazer para essas empresas. Infelizmente muitas nem irão conseguir se reerguer.

O que se conclui, finalmente, é que é necessária empatia e boa-fé principalmente por parte do consumidor, já que este já tem todo um resguardo e garantia constitucional, o qual deverá considerar e priorizar a remarcação de serviços, ou a reutilização de créditos, sempre que possível, a fim de pensar no próximo, tendo em vista que não é a quebra de expectativa apenas do consumidor, mas de toda a economia, em uma proporção mundial.

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1 BRASIL. Medida Provisória nº 948, de 8 de abril de 2020. Dispõe sobre o cancelamento de serviços, de reservas e de eventos dos setores de turismo e cultura em razão do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19). Disponível clicando aqui Acessado em 03.07.20 às 15:04hs.

2 BARROS, João Pedro Leite. CASSANO, Adriano Olian. A ampliação da vulnerabilidade dos consumidores em contratações de serviços turísticos e culturais - análise da MP 948. Empório do Direito.com.br, 2020. Disponível clicando aqui Acessado em 05.06.20 às 16:59hs.

3 BRASIL. Medida Provisória nº 925, de 18 de março de 2020. Dispõe sobre medidas emergenciais para a aviação civil brasileira em razão da pandemia da covid-19. Disponível clicando aqui Acessado em 03.07.20 às 15:04hs.

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t*Marianne Neiva dos Santos é advogada do ASBZ Advogados da área Cível, com foco em Tribunais Superiores.

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