Planejamento sucessório em foco: STJ decide que é anulável a venda de pai para filho sem o consentimento dos demais herdeiros
Um pai vende um imóvel de alto padrão a um de seus filhos a preço irrisório, e sem o consentimento dos demais. Esse negócio é anulável?
quarta-feira, 24 de junho de 2020
Atualizado às 08:52
Embora o Código Civil estabeleça de forma clara que se trate de negócio anulável, muita discussão pairava sobre a natureza do vício e o prazo de prescrição. No entanto, recentemente esta questão foi trazida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento do REsp 1.679.501/GO (2017/0064600-7) em 13 de março de 2020, que confirmou que o referido negócio é anulável, com prescrição de 2 (dois) anos, a contar da sua conclusão.
Portanto, passados 2 anos da venda, o negócio não poderá mais ser anulado. Assim, o herdeiro prejudicado deve zelar, de acordo com este entendimento, para exercer seu direito de ação em até 2 anos, contados a partir da conclusão da venda.
Requisitos
Além do prazo de prescrição, o STJ também definiu quais são os requisitos para a anulabilidade do negócio jurídico, e entre eles estão: a comprovação da simulação com objetivo de dissimular a doação com o pagamento de preço muito abaixo do mercado, a existência de relação de ascendência e descendência entre vendedor e comprador, a falta de consentimento dos demais herdeiros, entre outros. Por outro lado, se o preço de compra é compatível com o valor de mercado do bem, e foi efetivamente pago pelo descendente comprador, sem que tenha havido prejuízo aos demais herdeiros, a venda poderá ser mantida.
Utilização de "laranjas"
O STJ também decidiu que se aplica o prazo de 2 anos, a contar da conclusão do negócio, para anulação de venda mesmo que feita por interposta pessoa ("laranja"). Isto porque, a utilização deste intermediário "não é outra coisa que não a tentativa reprovável de contornar-se a exigência da concordância dos demais descendentes e também do cônjuge", como disse a relatora do caso, a ministra Nancy Andrighi.
No nosso ver, o prazo de 2 anos, contados da conclusão do negócio, é extremamente curto para este tipo de operação, que deveria ter como ponto de partida o conhecimento do evento pelos demais herdeiros, que seriam os prejudicados, principalmente porque este tipo de questão pode somente vir à tona em eventual processo de inventário, quando ocorre o falecimento do pai que vendeu o bem ao filho.
Já esta definição, trazida pelo STJ com a determinação dos requisitos, dá maior segurança jurídica aos herdeiros de forma geral, desde que estes, claro, se mantenham bastante atentos às movimentações patrimoniais de seus pais.
É um case importante e interessante e ATENÇÃO é a palavra da vez. Aqueles que dormirem no ponto perderão o direito de reivindicar o que uma vez já lhes foi de direito.
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*Carolina Ducci é especialista da área de Wealth Management do escritório KLA Advogados.
*Vera Helena Cardoso de Almeida é especialista da área de Wealth Management do escritório KLA Advogados.
*Julia Pellatieri é especialista da área de Wealth Management do escritório KLA Advogados.