Os efeitos da arbitragem na análise de riscos negociais
O termo risco está intimamente ligado à noção de incerteza. Relaciona-se a uma ocorrência que não depende exclusivamente da vontade do agente, mas de fatores externos a ele. Nesse sentido, os riscos são inerentes à atividade negocial. Há quem afirme que seja "impossível separar a medida do desempenho de uma empresa e da sua administração dos riscos assumidos para alcançar esse desempenho"
segunda-feira, 27 de novembro de 2006
Atualizado em 24 de novembro de 2006 14:49
Os efeitos da arbitragem na análise de riscos negociais
André Guskow Cardoso*
O termo risco está intimamente ligado à noção de incerteza. Relaciona-se a uma ocorrência que não depende exclusivamente da vontade do agente, mas de fatores externos a ele. Nesse sentido, os riscos são inerentes à atividade negocial. Há quem afirme que seja "impossível separar a medida do desempenho de uma empresa e da sua administração dos riscos assumidos para alcançar esse desempenho" (LIKIERMAN, Andrew. Avaliar o risco é a chave do bom desempenho. Valor Econômico. Gestão de Riscos, 3ª parte, out. 2005, p. 6). Também a inovação, fator de suma importância para o sucesso de determinada organização empresarial, relaciona-se com a noção de risco e de incerteza. Esses e outros exemplos permitem verificar que o processo decisório das entidades empresariais baseia-se, em grande medida, na correta avaliação e gerenciamento dos riscos que envolvem a sua atuação.
No entanto, o fato de a noção de risco ser inerente à atividade negocial não significa que as empresas e empresários estejam dispostos a assumir todo e qualquer tipo de risco. A propensão a assumir determinados riscos não afasta a verdadeira aversão das empresas a outras espécies de risco. Um dos riscos que usualmente as organizações empresariais sempre procuraram evitar é aquele relacionado ao descumprimento de contratos e acordos. Afinal, o surgimento de um litígio em decorrência do descumprimento de uma obrigação contratual não colocava alternativa ao empresário senão submeter tal litígio à decisão por parte do Poder Judiciário.
A sujeição de um litígio ao Judiciário não colocaria qualquer problema (e nem ampliaria os riscos inerentes à atividade negocial) se a solução fosse fornecida de forma rápida e eficaz. Ocorre que o histórico da atuação do Judiciário no Brasil, de modo geral, aponta para um processo moroso e rico em instrumentos processuais que permitem àquele que descumpriu uma determinada obrigação contratual protelar ao máximo o seu cumprimento. Nesse panorama, a realização de negócios e a assinatura de contratos - atividades inerentes à atuação negocial - sofrem uma brutal ampliação na avaliação dos seus riscos. A conseqüência natural é a redução da atividade empresarial e dos investimentos a ela inerentes.
A solução de controvérsias por meio da arbitragem (ou através de outras vias de solução alternativa de conflitos, como a mediação) constitui importante fator de redução da incerteza relacionada à atividade negocial. Antes da consolidação da arbitragem como modo de solução de controvérsias no Brasil (o que vem ocorrendo a partir da edição da Lei 9.307/1996), a grande maioria dos conflitos envolvendo as atividades negociais era submetida ao Poder Judiciário. Com a consagração da arbitragem, pôs-se à disposição dos interessados uma alternativa à solução de controvérsias surgidas na atuação negocial, que não passa necessariamente pela atuação do Poder Judiciário.
A redução da incerteza decorre de determinadas características da solução de conflitos por meio da arbitragem. A primeira delas relaciona-se com o prazo necessário para a solução das questões submetidas à arbitragem. A arbitragem permite que se estabeleça um prazo certo para a apresentação da solução (a sentença arbitral). Esse prazo é muito menor do que os prazos necessários para o encerramento de um processo judicial comum. Como afirma J. E. CARREIRA ALVIM, "se se pudesse apontar como única vantagem da arbitragem a possibilidade de julgamento do litígio exatamente no prazo estabelecido pelas partes, essa instituição já estaria plenamente justificada, num país onde a Justiça estatal não tem correspondido, com eficiência, às angústias dos jurisdicionados" (Direito Arbitral. 2ª ed., Forense, 2004, p. 54). Outro fator corresponde à supressão da possibilidade de recurso em face da sentença arbitral. A Lei de Arbitragem (art. 18) afasta expressamente a viabilidade de recursos contra a solução fornecida pela arbitragem e dispensa a sentença arbitral de homologação pelo Judiciário para que possa ser exigida pelas partes. Em caso de descumprimento da sentença arbitral, é possível obter a sua execução perante o Poder Judiciário, com a vantagem de já ter sido definida a solução do conflito propriamente dito pela sentença arbitral. Assim, ainda que a sentença arbitral venha a ser questionada no momento de se obter a sua execução compulsória por parte do vencido - o que, de todo modo, sujeita-se a limites previstos na Lei 9.307/1996 - o recurso à arbitragem já terá abreviado o tempo necessário para a solução do litígio. Além disso, na arbitragem, as partes escolhem aqueles que irão julgar o conflito. Os árbitros geralmente são escolhidos entre especialistas na matéria em discussão, o que reduz o tempo necessário para a decisão e possibilita que a solução fornecida seja a mais adequada sob o ponto de vista técnico. Isso é especialmente relevante naqueles conflitos que apresentam grande complexidade técnica.
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*Advogado do escritório Justen, Pereira, Oliveira & Talamini - Advogados Associados
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