Medidas de acesso ao crédito: Verdade ou ilusão?
Diante da situação extremamente desafiadora imposta pela pandemia, cabe a todos os agentes do mercado cooperarem mutuamente para a superação dos obstáculos e o desenvolvimento da sociedade.
segunda-feira, 15 de junho de 2020
Atualizado às 14:26
São notórias as implicações do isolamento social necessário para conter a disseminação do coronavírus (covid-19), situação que expõe as empresas a condição de total escassez de recursos, as quais enfrentam severas dificuldades para honrar com o pagamento de suas despesas ordinárias e folha salarial.
Considerando este cenário, o governo federal vem promovendo incentivos para que as personalidades jurídicas tenham fácil acesso ao crédito, o que contribui sobretudo ao fluxo de caixa e a manutenção das empresas.
Nesse contexto, observa-se a MP 944 que instituiu o Programa Emergencial de Suporte a Empregos, oportunizando o financiamento integral da folha salarial por até dois meses, limitada a R$ 2.090 por funcionário, a lei 13.999/2020 que criou o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), responsável por conceder as empresas que faturaram no ano de 2019 entre 360 mil e 4,8 milhões de reais crédito de até 30% de sua receita bruta, ainda, a MP 975 que concebeu o Programa Emergencial de Acesso a Crédito, destinado as empresas que faturaram no ano passado entre 360 mil e 300 milhões de reais.
As medidas abordadas têm similaridades, pois destinam as instituições financeiras, que encontram-se no final da cadeia e são responsáveis por alcançar aos empresários os recursos, garantias contra a inadimplência, eis que o governo se propõe a subsidiar parte significativa das dívidas, assim diminuindo significativamente o risco destas na disponibilização de crédito.
Outro ponto peculiar nas intervenções governamentais corresponde a dispensa de documentos outrora exigidos, quais sejam: (I) Certidão de regularidade trabalhista (§ 1º do art. 362 da CLT); (II) Comprovação de regularidade no exercício do direito a voto (inciso IV do § 1º do art. 7º da lei 4.737/1965); (III) Certificado de Regularidade do FGTS (alíneas "b" e "c" do caput do art. 27 da lei 8.036/1990); (IV) Certidão Negativa de Débito-CND (alínea "a" do inciso I do caput do art. 47 da lei 8.212/1991, art. 10 da lei 8.870/1994 e art. 62 do decreto lei 147/67); (V) Do respeito a vedação a instituição financeira conceder crédito lastreado em recursos públicos a quem dispõe de débito com o FGTS (art. 1º da lei 9.012/1995); (VI) Comprovação de recolhimento de ITR (art. 20 da lei 9.393/1996); (VII) Consulta prévia ao Cadin (art. 6º da lei 10.522/2002).
Ocorre, que mesmo sendo clara a intenção das mencionadas medidas, que pretendem possibilitar as empresas facilidades na obtenção de crédito e promover liquidez na economia, algumas instituições financeiras vem impondo entraves injustificados, por vezes exigindo de forma indireta os documentos indicados como prescindíveis e solicitando garantias reais astronômicas que as empresas não dispõem.
Assim, a conduta das instituições financeiras em dificultar demasiadamente a obtenção dos recursos, sobretudo por excesso de burocracia expõe as empresas ao risco do colapso e consequente bancarrota, o que é extremamente grave se considerado o efeito cascata que o fechamento de empresas representa na economia e na geração de empregos.
Por seu turno, o desprestígio a legislação pode ser interpretado como motivador da responsabilidade civil das respectivas instituições financeiras, nos termos do art. 389 do Código Civil, eis que "não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos."
Além disso, na hipótese de serem suportadas as dificuldades abordadas neste texto, é importante que o interessado demonstre documentalmente a intenção em dispor dos recursos e as barreiras abusivas apresentadas pelas instituições financeiras, notificando-as para que se abstenham de apresentar qualquer impedimento irrazoável para a obtenção do crédito.
Dessa forma, diante da situação extremamente desafiadora imposta pela pandemia, cabe a todos os agentes do mercado cooperarem mutuamente para a superação dos obstáculos e o desenvolvimento da sociedade, colhendo-se como mensagem deste momento caótico a importância da harmonia entre os indivíduos.
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*Gabriel Lazzari é advogado do escritório Ratc e Gueogjian Advogados. Pós-graduando em Direito Tributário.