Negativação indevida e seus reflexos junto ao sistema de score de crédito
Atualmente, quando solicitamos crédito para aquisição de algum bem ou serviço é comum que as empresas verifiquem, além de eventual pendência financeira junto aos órgãos de proteção de crédito, o sistema de score de crédito.
segunda-feira, 8 de junho de 2020
Atualizado em 9 de junho de 2020 09:43
Grande parte da aquisição de bens e serviços ocorre através da concessão de crédito, seja utilizando o cartão de crédito, empréstimos bancários ou financiamentos.
É comum que empresas, lojistas e bancos em geral façam análise de risco para concessão de crédito.
Em um tempo não muito distante a principal forma de avaliar os riscos quando da concessão do crédito ocorria através da simples verificação de eventuais negativações junto aos órgãos de proteção ao crédito. No Brasil, especificamente, os órgãos mais conhecidos e utilizados são o SCPC e SERASA.
Atualmente, quando solicitamos crédito para aquisição de algum bem ou serviço é comum que as empresas verifiquem, além de eventual pendência financeira junto aos órgãos de proteção de crédito, o sistema de score de crédito. Mas o que é o sistema score de crédito?
Segundo a Serasa1 "o score de crédito é o resultado dos hábitos de pagamento e relacionamento do cidadão com o mercado de crédito", sendo "um dos modelos estatísticos existentes no mercado para a análise de risco de crédito".
Ainda em análise ao sitio eletrônico da Serasa, verifica-se que a avaliação dos consumidores ocorre através de diversos fatores, tais como: pagamentos de contas em dia, histórico de dívidas negativadas, relacionamento financeiro com empresas e dados cadastrais atualizados.
Segundo a Boa Vista SCPC2, "o Score é apresentado em formato de pontuação, variando de 0 a 1000, sendo que quanto maior o valor, maior a probabilidade de o consumidor pagar um crédito em dia".
O Superior Tribunal de Justiça reconheceu a legalidade do sistema de Score com base no art. 5º, IV e no art. 7º, I, da lei 12.414/2011 (Lei do Cadastro Positivo), editando a súmula 550.
Deste modo, quanto à legalidade do sistema não há discussão.
A questão se torna problemática quando da negativação indevida de consumidores, o que tem se tornado cada vez mais corriqueiro. Nessa situação é comum que os consumidores busquem o Poder Judiciário - grande parte das vezes no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis - visando a declaração de inexistência de dívida e, por consequência, a exclusão das referidas negativações dos órgãos de proteção ao crédito, além de indenização por danos morais.
Ocorre que, a simples exclusão do rol de inadimplentes, muitas das vezes não resolve por completo o problema causado com a indevida negativação.
Isso porque, conforme demonstrado anteriormente, o histórico de dívidas negativadas é um dos critérios adotados pelo sistema de score de crédito para avaliação do consumidor. Logo, se o consumidor foi indevidamente negativado, tal fato afetará sua imagem junto ao sistema de score de crédito, ao menos por um período, mesmo após a exclusão da negativação.
A solução para o problema é aparentemente simples, mas muitas vezes negligenciada - para não dizer esquecida - tanto pelos consumidores, quanto por advogados ou serventuários que elaboram a petição inicial nas hipóteses de demandas junto ao Juizado Especial Cível em que a parte não é assistida por advogado.
Esse "esquecimento" se mostra visível quando da busca de julgados que abordam o tema. São pouquíssimas as decisões que julgam processos cujo tema seja negativação indevida, tratando do restabelecimento do status quo ante do sistema score de crédito.
A aparente simplicidade para solução do problema consiste no requerimento de expedição de ofício para o órgão responsável pelo sistema score de crédito, no sentido de determinar que se reestabeleça a pontuação anterior à indevida negativação, conforme determinado no julgado abaixo:
DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Ação proposta em face de instituição financeira que, não obstante a renegociação dos contratos e novação dos débitos com pagamento dentro do período aprazado, incluiu o nome da antiga devedora nos cadastros restritivos, deixando ainda de excluir brevemente a respectiva anotação. Afronta a súmula 548 do STJ que fixa em 5 (cinco) dias úteis o prazo para o credor excluir o registro da dívida do nome do devedor no cadastro de inadimplentes, a partir do pagamento do débito. Dano moral. Configuração. Indenização arbitrada em R$5.000,00. Majoração para R$10.000,00. Valor que melhor se adequa ao propósito de compensar o dano sofrido e dissuadir o ofensor na conduta que ensejou o ilícito, não podendo ser insignificante à luz de sua capacidade financeira. Caráter pedagógico. Score ou cadastro positivo da SERASA. Pretensão pelo seu restabelecimento. Acolhimento. O responsável pelo registro desabonador não tem gerência direta sobre a pontuação, porém, pode-se expedir ofício ao órgão responsável pelo dado para que informe o histórico do interessado e a pontuação anterior à negativação, restabelecendo-a, ou informe a impossibilidade de assim proceder. IMPROVIDO O RECURSO DO RÉU E PROVIDO EM PARTE O DA AUTORA. (TJSP; AC 1007958-60.2018.8.26.0302; Ac. 12805993; Jaú; Décima Oitava Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Ramon Mateo Júnior; Julg. 20/8/2019; DJESP 30/8/2019; Pág. 2364)
Deste modo, consumidores, advogados e operadores do direito em geral precisam ficar atentos quando do ajuizamento de ações judiciais que discutam negativações indevidas, de modo que pleiteiem, além da exclusão da negativação e indenização por danos morais, a expedição de ofício para os órgãos que possuem o sistema score de crédito para que a pontuação anterior a indevida negativação seja reestabelecida.
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*Felipe da Silva Lima é advogado inscrito na OAB/ES, compõe as equipes de Relações Privadas e Responsabilidade Civil do Escritório Brum & Advogados Associados em Vitória/ES, bacharel em Direito pela Faculdade MULTIVIX. Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Fundação Getúlio Vargas - FGV. Especializa-se em Direito Digital e Proteção de Dados pela Escola Brasileira de Direito e Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção São Paulo.