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Das garantias bancárias frente ao cenário de calamidade

Gabriel José de Orleans e Bragança, Johan Albino Ribeiro, Leonardo Nobuo Pereira Egawa, Marcelo Barbosa Sacramone e Roberta Beatriz do Nascimento

Em se tratando de garantias bancárias, podemos citar as garantias reais, das quais encontramos com maior relevância a alienação fiduciária, hipoteca, ou garantias pessoais, com atenção à fiança e ao aval.

sexta-feira, 29 de maio de 2020

Atualizado às 10:50

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Dando continuidade ao webinar realizado no dia 22.04.20, apresentamos o presente artigo coletivo, compilando o essencial do que foi debatido no mencionado encontro virtual.

O primeiro artigo de lavra da dra. Roberta Nascimento1, aborda os aspectos práticos das garantias bancárias no cenário de pandemia.

Estamos vivendo um cenário atípico não só no Brasil, como também no contexto mundial, uma vez que a pandemia causada pela covid-19 coloca em evidência a capacidade do sistema jurídico para responder de forma rápida e adequada às relações contratuais.

Em se tratando de garantias bancárias, ou seja, aos contratos estabelecidos entre o banco e o cliente, em que é feita uma operação de crédito na qual o banco assume a satisfação de determinadas obrigações do seu cliente perante terceiro, podemos citar as garantias reais, das quais encontramos com maior relevância a alienação fiduciária, hipoteca, ou garantias pessoais, com atenção à fiança e ao aval.

Na prática quando falamos em execução judicial dos contratos de alienação fiduciária de veículo, ou seja, o ajuizamento de ações de Busca e Apreensão de veículos o impacto foi imediato, já que o isolamento social relativiza a atuação dos oficiais de justiça no cumprimento dos mandados, em que pese o provimento 313/20 do CNJ, permitir o cumprimento de mandados de Busca e Apreensão.

Por outro lado, quando analisamos a execução dos contratos de alienação fiduciária de imóveis, o provimento 95 do CNJ de 1º de abril de 2020, ao elencar a atividade cartorial com essencial, desburocratiza os entraves advindos da pandemia para os contratos inadimplidos anteriormente à decretação do estado de calamidade.

Mais do que nunca, é preciso que o Judiciário esteja atento, defina seus métodos decisórios com um mínimo de homogeneidade, a construir uma verdadeira política pública de controle, racional e planejada, para impedir que no afã por soluções excessivamente rápidas venha a agravar ainda mais o cenário social e econômico que estamos vivenciando.

No mesmo sentido, uma delimitação pelo legislativo de métodos e regras para atenuar os impactos da crise é questão urgente.

Afinal, se são bem-vindas tentativas de minimizar os efeitos da crise causada pela covid-19, também é bem-vinda a cautela e que se atente que o princípio segurança jurídica (que inclui o respeito aos contratos, sobretudo contra atos de apenas uma das partes) ainda é um relevante instrumento de proteção econômica.

O segundo artigo aborda o tema da supressão das garantias bancárias e dos bens de capital essenciais ao soerguimento da empresa, situando o leitor sobre o entendimento da jurisprudência e do projeto de lei 1.397/20, de lavra do advogado Leonardo Nobuo Pereira Egawa2.

Pois bem, para ingressarmos no tema da supressão das garantias se faz imprescindível apresentar as disposições contidas na lei 11.101/05 que tratam do tema sob análise. Nesse contexto, partimos do art. 49, § 1º que prevê que os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso. Em seguida, do art. 59, caput prevê que o plano de recuperação judicial implica em novação dos créditos anteriores ao pedido, sem prejuízo das garantias, observando o disposto no disposto no § 1º do art. 50, que, por sua vez, dispõe que a supressão das garantias ou sua substituição somente será admitida com a aprovação expressa do credor titular da garantia. Por fim, temos o art. 163, §4º dispondo da mesma forma, entretanto, no âmbito da recuperação extrajudicial.

Nessa linha, a jurisprudência era pacífica, principalmente por conta da súmula 581 do c. Superior Tribunal de Justiça e do REsp. repetitivo 1.333.349/SP, no sentido de que "a recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos arts. 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1º, todos da Lei nº 11.101/2005".

No mesmo sentido, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo publicou a súmula 61 no sentido de que "na recuperação judicial, a supressão da garantia ou sua substituição somente será admitida mediante aprovação expressa do titular".

Entretanto, o tema passou a ser analisado por outra perspectiva por conta de julgados da 3º Turma do Superior Tribunal de Justiça nos REsp. 1.532.943/MT, 1.700.487/MT, em votações não unanimes, no sentido de que, já que a lei de regência prevê expressamente a possibilidade de o plano de recuperação judicial dispor de modo diverso sobre as obrigações anteriores ao pedido de recuperação judicial, nos termos do art. 49, §2º, também poderia dispor de modo diverso sobre as garantias, de modo que estas garantias poderiam ser suprimidas, se a maioria assim decidisse.

A matéria foi afetada para julgamento da 2ª Seção, mas não no regime de repetitivo, no REsp. 1.797.924/MT, para decidir se é possível a supressão de garantias pelo princípio da maioria em detrimento da aprovação expressa do credor titular da garantia. Até o momento, e. ministra Fátima Nancy Andrighi, relatora, apresentou voto no sentido de que, mesmo que a AGC seja soberana, esta não pode contrariar o ordenamento jurídico e alcançar os credores que não se manifestaram expressamente pela anuência da suspensão das próprias garantias reais e fidejussórias. Já o e. min. Luis Felipe Salomão propôs uma solução intermediária. Em relação aos direitos reais de garantias, considerou que a maioria em AGC poderia deliberar pela supressão. Já as garantias fidejussórias, estas seriam inalcançáveis pela RJ.

O tema também é tratado no substitutivo do PL 10.220/18, no qual se prevê a possibilidade de o credor apresentar o plano de recuperação judicial, desde que haja a isenção das garantias pessoais prestadas pelos sócios em relação aos créditos a serem novados, nos termos do proposto art. 56, § 6º, inciso V, além de outros requisitos, como o apoio escrito de credores que representem mais de um terço dos crédito totais sujeitos ao procedimento da recuperação judicial.

Passo seguinte, no que se refere aos bens de capital essenciais à atividade da empresa, previstos na parte final do art. 49, §3º, vale destacar que o PL 1.397/20 prevê que durante a vigência das disposições transitórias, serão liberados em face do devedor o montante de 50% (cinquenta por cento) do valor ou do recebível anterior ou posterior ao pedido, independentemente da natureza da garantia, sendo que tal garantia deverá ser recomposta de forma gradual a partir do sexto mês, contado da apresentação do novo pedido, atingindo até o máximo de 36 (trinta e seis) meses, nos termos do proposto art. 13, III.

A proposta deve ser analisada de forma cautelosa, sob pena de se criar um incentivo reverso, pois o credor não poderá usar da garantia para satisfazer seu crédito e não poderá votar o plano de recuperação, pois é excluído da RJ, nos termos do art. 49, §3º, além do precedente do STJ, resultado do REsp. 1.758.746/GO, que exclui a possibilidade da cessão fiduciária de recebíveis ser considerada como de bem de capital essencial.

Para ler o artigo na íntegra clique aqui

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1 Advogada, Sócia no RNA Advogados Associados, Presidente da Comissão de Direito Bancário da OAB/SP - 21ª Subseção e Presidente da Comissão Especial de Direito Bancário da OAB/SP Seccional São Paulo.

2 Advogado em São Paulo. Aluno Especial em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo - USP (2019). Educação Executiva sobre Recuperação Judicial e Falência pela Escola Paulista da Magistratura - EPM (2019). Pós-Graduado em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas - FGV/SP (2019). Pós-Graduado no Novo Código de Processo Civil pela Faculdade de Direito de Sorocaba - FADI/SP (2017). Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Sorocaba - FADI/SP (2013). Atuação nas áreas de Direito Civil e Empresarial, com ênfase em Recuperação de Crédito. Membro da Comissão de Direito Bancário da OAB/SP. Relator da 1ª Câmara da CAASP e Assessor Relator da 1ª Câmara Recursal da OAB/SP.

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*Gabriel José de Orleans e Bragança é sócio do Lobo de Rizzo Advogados.

*Johan Albino Ribeiro é diretor da Bradespar S/A, membro do comitê de Sustentabilidade da Vale.

*Leonardo Nobuo Pereira Egawa é advogado, pós-graduado em Direito Empresarial pela FGV-SP.

*Marcelo Barbosa Sacramone é juiz de direito em exercício na 2ª Vara de Falências e Recuperações da Capital.

*Roberta Beatriz do Nascimento é sócia do Roberta Nascimento Advogados Associados.

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